A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou ao Supremo Tribunal Federal (STF), nesta terça-feira (22), que ele não descumpriu as medidas cautelares impostas pelo ministro Alexandre de Moraes. Em manifestação formal, os advogados sustentam que Bolsonaro jamais acessou redes sociais, nem pediu que terceiros publicassem por ele, e solicitam que a Corte esclareça se a proibição se estende à concessão de entrevistas.
O esclarecimento foi exigido por Moraes após Bolsonaro, no dia anterior, exibir sua tornozeleira eletrônica a jornalistas na Câmara dos Deputados e discursar contra as medidas que lhe foram impostas. Trechos dessa fala foram publicados em perfis de aliados e até de opositores nas redes sociais, o que acendeu o alerta no gabinete do ministro do STF.
Defesa diz que proibição não inclui entrevistas
Na peça enviada à Suprema Corte, os advogados Celso Vilardi e Paulo Amador da Cunha Bueno afirmam que Bolsonaro “não postou, não acessou suas redes sociais e nem pediu para que terceiros o fizessem por si. E mais: que o ex-presidente determinou a interrupção de qualquer uso de suas redes, inclusive por auxiliares.
“Jamais cogitou que estava proibido de conceder entrevistas, que podem ser replicadas em redes sociais”, escreveram. A defesa alega que considerar transmissões ou transcrições como uso direto das redes sociais é uma ampliação indevida da decisão original.
Os advogados ressaltam que as declarações do ex-presidente fazem parte do fluxo natural de comunicação contemporânea, cuja replicação escapa de seu controle direto. Por isso, consideram “indevido e perigoso” qualquer tentativa de puni-lo por atos de terceiros.
Moraes vê tentativa de burlar decisão
No despacho de segunda-feira (21), Moraes deixou claro que a proibição de uso das redes sociais se estende a transmissões, retransmissões ou mesmo transcrições de entrevistas que acabem divulgadas nas plataformas digitais. O ministro viu na estratégia de Bolsonaro uma manobra para burlar as restrições: falar à imprensa sabendo que o conteúdo chegaria aos mesmos canais proibidos.
“O uso de entrevistas para divulgar suas declarações nas redes sociais é, obviamente, um meio de violar a decisão judicial”, escreveu Moraes. Ele alertou que, em caso de novo descumprimento, a prisão imediata de Bolsonaro será determinada.
“Covardia” e silêncio até novo despacho
A sequência que levou ao novo impasse começou poucas horas depois do despacho de Moraes. Bolsonaro esteve na Câmara para encontro com parlamentares de oposição, onde puxou a barra da calça, exibiu a tornozeleira e disparou: “Isso aqui é um símbolo da máxima humilhação”. Também chamou as medidas do STF de “covardia”.
A defesa, no entanto, argumenta que Bolsonaro ainda não havia sido formalmente intimado da nova decisão quando falou com a imprensa, o que, segundo os advogados, afastaria qualquer acusação de descumprimento.
Por precaução jurídica, a equipe legal orientou o ex-presidente a suspender todas as manifestações públicas até que o STF se pronuncie sobre os limites da decisão. A expectativa é que Moraes analise os embargos nas próximas horas. Ele poderá acolhê-los, rejeitá-los ou encaminhá-los para parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Pressão política e cálculo jurídico
Nos bastidores de Brasília, a defesa de Bolsonaro tenta evitar a prisão do ex-presidente, mas também não deseja ampliar o desgaste político com o Supremo. O silêncio orientado pela equipe jurídica é uma tentativa de controlar os danos e ganhar tempo.
Enquanto isso, parlamentares bolsonaristas já se mobilizam para protestar contra o que chamam de “censura disfarçada” imposta pelo STF. A nova tensão entre Bolsonaro e Moraes se dá num momento delicado, em que o ex-presidente tenta preservar capital político mesmo sob intensa vigilância judicial.
A resposta de Moraes será decisiva para os próximos passos dessa disputa que transcende o campo jurídico, atingindo em cheio a arena política e midiática do Brasil pré-eleitoral.
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Íntegra: defesa de Bolsonaro ao STF sobre uso de redes sociais
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR MINISTRO ALEXANDRE DE MORAES, D. RELATOR DA AÇÃO PENAL N. 2668/DF NO E. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
JAIR MESSIAS BOLSONARO, já qualificado nos autos em epígrafe, por seus advogados que esta subscrevem, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, apresentar os esclarecimentos determinados na r. decisão de eDoc. 1488, ao mesmo tempo que, com fundamento no artigo 93, IX, da Constituição Federal, artigos 619 e 620 do Código de Processo Penal, 1022 e 1025 do Código de Processo Civil e 337 do Regimento Interno desta Corte, apresentar Embargos de Declaração, em relação à r. decisão de eDoc. 1486 (datada de 21.07.25) que versa sobre a extensão da medida cautelar anteriormente imposta nos autos da Pet n. 14.129/DF, requerendo desde já seu conhecimento e provimento, conforme fundamentos a seguir expostos:
1. No último dia 18, Vossa Excelência impôs novas medidas cautelares ao Peticionário, conforme se vê do trecho final do dispositivo da r. decisão:
“Diante do exposto, nos termos do art. 319 do Código de Processo Penal e do artigo 21 do Regimento Interno do STF, DETERMINO A IMEDIATA IMPOSIÇÃO DAS SEGUINTES MEDIDAS CAUTELARES EM FACE DE JAIR MESSIAS BOLSONARO:
- PROIBIÇÃO DE AUSENTAR-SE DA COMARCA COM USO DE TORNOZELEIRA ELETRÔNICA E RECOLHIMENTO DOMICILIAR NO PERÍODO NOTURNO, À PARTIR DAS 19H00 ATÉ AS 6H00 DE SEGUNDA A SEXTA-FEIRAS E INTEGRAL NOS FINS DE SEMANA, FERIADOS E DIAS DE FOLGA.
- Proibição de aproximação e acesso a locais sedes das Embaixadas e Consulados de países estrangeiros.
- Proibição de manter contatos com Embaixadores ou quaisquer autoridades estrangeiras, bem como com os demais réus e investigados das Ações Penais 2.668/DF, AP 2.693/DF, AP 2.694/DF, AP 2.695/DF, Inq. 4.995/DF e Pet 12.100/DF, inclusive por intermédio de terceiros;
- Proibição de utilização de redes sociais, diretamente ou por intermédio de terceiros.”
2. A determinação é clara e precisa: o Embargante está proibido de utilizar suas redes sociais, não podendo fazê-lo por intermédio de terceiros.
Justamente por esse motivo, o Embargante cessou a utilização de suas redes e determinou que terceiros também suspendessem qualquer tipo de acesso.
3. Em nenhum momento e de nenhuma forma, ao que se entendeu, foi proibido que o Embargante concedesse entrevistas, o que, aliás, não condiz com a jurisprudência pátria.
4. No entanto, na data de ontem, Vossa Excelência proferiu nova decisão, assentando que:
“A medida cautelar de proibição de utilização de redes sociais, diretamente ou por intermédio de terceiros, imposta a JAIR MESSIAS BOLSONARO inclui, obviamente, as transmissões, retransmissões ou veiculação de áudios, vídeos ou transcrições de entrevistas em qualquer das plataformas das redes sociais de terceiros (…)” (eDoc. 1486)
Ora, tal decisão, com todo o respeito, vai muito além da proibição de utilização de redes sociais.
É notório que a replicação de declarações por terceiros em redes sociais constitui desdobramento incontrolável das dinâmicas contemporâneas de comunicação digital e, por isso, alheio à vontade ou ingerência do Embargante.
Assim, naturalmente uma entrevista pode ser retransmitida, veiculada ou transcrita nas redes sociais. E tais atos não contam com a participação direta ou indireta do entrevistado, que não pode ser punido por atos de terceiros.
Compreender de modo diverso implicaria risco real de cerceamento indevido de liberdade, em razão de ações alheias à sua vontade.
5. Portanto, cabe esclarecer que o Embargante não descumpriu o quanto determinado e jamais teve a intenção de fazê-lo, tanto que vem observando rigorosamente as regras de recolhimento impostas por este E. Tribunal.
Inclusive porque o Embargante não havia sido intimado da nova decisão, o que também afasta a imputação de eventual descumprimento.
O Embargante não postou, não acessou suas redes sociais e nem pediu para que terceiros o fizessem por si.
No entanto, insista-se, jamais cogitou que estava proibido de conceder entrevistas, que podem ser replicadas em redes sociais e, ao que consta, a Colenda Primeira Turma não parece ter referendado tal proibição.
Afinal, se a proibição envolve transmissão ou transcrição de entrevistas, o Embargante, na prática, está proibido de concedê-las posto que ninguém tem controle sobre a forma de sua divulgação, a não ser, e apenas inicialmente, o próprio jornalista.
6. Desta forma, ao tempo que refuta veementemente qualquer descumprimento, o ora Embargante, a fim de que não haja qualquer equívoco na compreensão da extensão pretendida pela medida cautelar imposta, por meio dos presentes Embargos, requer que a r. decisão de eDoc. 1486 seja esclarecida, a fim de precisar os exatos termos da proibição de utilização de mídias sociais, esclarecendo, ademais, se a proibição envolve a concessão de entrevistas.
7. De toda forma, em sinal de respeito absoluto à r. decisão da Suprema Corte, o Embargante não fará qualquer manifestação até que haja o esclarecimento apontado nos presentes Embargos.
8. Do exposto, e prestados os esclarecimentos demandados por Vossa Excelência, requer sejam conhecidos e acolhidos os presentes embargos de declaração, a fim de esclarecer a extensão da medida cautelar ora imposta ao Embargante, especialmente nos termos dos questionamentos supra, permitindo-se assim o pleno cumprimento da ordem judicial.
Termos em que,
Pede deferimento.De São Paulo para Brasília, em 22 de julho de 2025.
CELSO SANCHEZ VILARDI – OAB/SP 120.797
PAULO AMADOR DA CUNHA BUENO – OAB/SP 208.351
DANIEL BETTAMIO TESSER – OAB/SP 147.616
Jornalista e Advogado. Especialista em política nacional e bastidores do poder. Desde 2009 é autor do Blog do Esmael.
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