A Guerra Fria entre Bolsonaro e instituições democráticas no Brasil

O jornalista Ricardo Cappelli compara a belicosidade do presidente Jair Bolsonaro com as demais instituições democráticas brasileiras à Guerra Fria. Segundo o articulista, nenhum dos atores envolvidos no conflito têm força suficiente para apertar o botão vermelho do míssil nuclear.

No artigo, Cappelli revela que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não irá aceitar o impeachment de Bolsonaro porque teme terminar como Eduardo Cunha (MDB-RJ) e Ibsen Pinheiro (MDB-RS), artífices dos impedimentos de Collor e Dilma, respectivamente.

“Rodrigo Maia já deixou claro que não pretende colocar um impeachment em sua biografia”, afirma o jornalista. “Não esquece os destinos de Ibsen e Cunha, algozes de Collor e Dilma.”

Ibsen acabou cassado em 1994 após ser acusado de receber dinheiro do escândalo dos Anões do Orçamento e Cunha continua preso, no âmbito da Lava Jato, por receber propinas.

Para Cappelli, o presidente da Câmara, “que não é bobo”, sabe que os pedidos de impedimento em sua mão são um valioso “seguro”.

Leia a íntegra do artigo:

Economia

Guerra Fria

Ricardo Cappelli*

A postura de Bolsonaro no último domingo foi uma manobra defensiva. Após derrotas sucessivas no judiciário, o capitão sentiu que precisava reagir.

O ministro Celso de Mello ignorou a possibilidade de Moro ser denunciado por calúnia, presente na petição do procurador-geral da República. Autorizou apenas a abertura de inquérito para apurar as denúncias contra o presidente.

O ministro Alexandre de Moraes determinou que os delegados do inquérito das fake news não fossem mudados. Em seguida, suspendeu a nomeação de Ramagem para a direção da Polícia Federal.

Foi a vez de Celso de Mello novamente entrar em campo e determinar que Moro fosse ouvido pela PF no prazo máximo de cinco dias. Uma manobra para que o depoimento acontecesse antes que Bolsonaro nomeasse o novo diretor-geral.

Na sequência, Barroso deferiu liminar impedindo a expulsão dos diplomatas venezuelanos.

O STF agiu porque é vitima constante de inaceitáveis difamações e agressões vindas do “núcleo ideológico” do governo.

Logo após o incêndio, os bombeiros entraram em campo. O ministro da Defesa, ex-assessor de Toffoli no STF, fez uma “tabelinha” com o presidente do Supremo.

O general soltou uma nota reafirmando o compromisso com a democracia. Militares fizeram circular que ninguém vai dar um golpe a favor do presidente, nem contra ele. Toffoli apagou de vez a fogueira criticando o ativismo judicial de Alexandre de Moraes.

Guerra Fria é assim. Como nenhum dos lados possui força suficiente para lançar o míssil nuclear – nem consegue prever com segurança qual seria o desfecho -, as provocações vão escalando, mas ninguém aperta o botão vermelho.

Rodrigo Maia já deixou claro que não pretende colocar um impeachment em sua biografia. Não esquece os destinos de Ibsen e Cunha, algozes de Collor e Dilma. Também não é bobo, sabe que os pedidos de impedimento em sua mão são um valioso “seguro”.

Com o refugo do presidente da Câmara, sobra como “noiva” de um eventual impeachment o PGR. Por que ele denunciaria o presidente? Circula que Augusto Aras deseja a vaga no STF. Surgirão duas. A indicação é de Bolsonaro. Ou de Mourão. Vale o risco?

O fenômeno de derretimento das democracias liberais parece ser global. O curioso é que por aqui governo, oposição e instituições participam deste “esforço”. Bolsonaro milita por isso, é o sócio majoritário, mas todos possuem algumas “ações”.

A democracia é uma abstração inventada pela espécie capaz de acreditar e cooperar em torno de coisas que não existem. Quando a regra muda de acordo com as conveniências, ou ela se mostra incapaz de resolver os problemas concretos da vida das pessoas, o pacto social que sustenta a abstração pode estar em risco.

No Oriente, onde a covid-19 foi controlada com maestria, outras formas de governo “vão muito bem, obrigado”. A principal potência do século XX triunfou possuindo apenas dois partidos políticos. Existe apenas um na gigante emergente do século XXI. Sinal dos tempos?

*Ricardo Cappelli é jornalista e secretário de estado do Maranhão, cujo governo representa em Brasília. Foi presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes) na gestão 1997-1999.

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Ministro da Defesa diz que agressão à imprensa é ‘inaceitável’

O ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, afirmou nesta segunda-feira (4), por meio que nota, que agressão a profissionais de imprensa é “inaceitável”. Ele também defendeu a liberdade de expressão e destacou que as Forças Armadas prezam pela independência e a harmonia entre os Poderes da República.

“As Forças Armadas cumprem a sua missão Constitucional. Marinha, Exército e Força Aérea são organismos de Estado, que consideram a independência e a harmonia entre os Poderes imprescindíveis para a governabilidade do País. A liberdade de expressão é requisito fundamental de um País democrático. No entanto, qualquer agressão a profissionais de imprensa é inaceitável”, diz um trecho da nota.

Ontem (3), durante ato de apoio ao presidente Jair Bolsonaro, em frente ao Palácio do Planalto, na Praça dos Três Poderes, jornalistas de diferentes veículos de comunicação, que cobriam a atividade, foram agredidos fisicamente por manifestantes. Entre os profissionais que sofreram agressões está o fotógrafo Dida Sampaio, do jornal O Estado de S. Paulo, que foi alvo de socos e pontapés e precisou ser hospitalizado.

Mais cedo, Bolsonaro, que participou da manifestação de domingo, disse que não viu as agressões e responsabilizou “possíveis infiltrados” pelos ataques.

Na nota, o ministro da Defesa ainda defendeu que o país se concentre no combate à pandemia do novo coronavírus e que os militares devem respeitar a “lei, a ordem, a democracia e a liberdade”.

“O Brasil precisa avançar. Enfrentamos uma Pandemia de consequências sanitárias e sociais ainda imprevisíveis, que requer esforço e entendimento de todos. As Forças Armadas estarão sempre ao lado da lei, da ordem, da democracia e da liberdade. Este é o nosso compromisso.”