A tentativa do governador Ratinho Júnior (PSD) de privatizar a Celepar, estatal responsável pela gestão dos dados estratégicos do Paraná, sofreu um novo revés. O Ministério Público do Paraná (MP-PR) apresentou nesta quarta-feira (24) uma representação à Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) pedindo que o órgão federal fiscalize o processo e avalie possíveis violações à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
O documento do MP-PR alerta que, caso a Celepar seja entregue à iniciativa privada, informações sigilosas de milhões de paranaenses — incluindo registros da saúde, da segurança pública, da educação e da área fiscal — poderão ser expostas a vazamentos e uso indevido.
A crise se agrava porque, em paralelo, a Justiça do Trabalho já havia suspendido o Programa de Demissão Voluntária (PDV) da companhia. Na liminar, a juíza Sandra Mara Flugel Assad, da 12ª Vara do Trabalho de Curitiba, apontou que o regulamento do programa obrigava empregados a renunciarem a direitos e ações judiciais em andamento como condição de adesão, o que poderia causar prejuízos imediatos e irreversíveis. Por isso, determinou a suspensão do PDV até julgamento definitivo do caso.
Para a oposição na Assembleia Legislativa, a iniciativa do Ministério Público confirma denúncias feitas há meses. O líder da bancada, deputado Arilson Chiorato (PT), afirmou:
“O Governo Ratinho Jr quer vender a Celepar a qualquer custo e não se preocupa com as consequências. Entregar isso para a iniciativa privada é ilegal e coloca em risco milhões de paranaenses. O alerta do Ministério Público mostra que nossa preocupação está certa e que essa privatização é um perigo real para o Estado e para a população.”
A representação, segundo os oposicionistas, reforça que a Celepar não pode ser tratada como uma empresa comum, já que concentra sistemas e bancos de dados que sustentam políticas públicas fundamentais.
O processo de privatização segue suspenso no Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR). Na semana passada, o conselheiro Fernando Guimarães pediu vistas e adiou a análise da liminar concedida pelo conselheiro substituto Lívio Sotero Costa. Nesta quarta-feira, o assunto não entrou em pauta e a cautelar que barra a venda continua em vigor.
Além de expor dados sensíveis, a venda da Celepar pode tornar o próprio Estado refém de uma empresa privada para manter serviços essenciais. Sem o controle público, sistemas de arrecadação de impostos, gestão hospitalar ou registros escolares podem ficar nas mãos de terceiros, comprometendo a soberania digital do Paraná.
Esse alerta também já foi feito no Senado, em audiência convocada pelo senador Sergio Moro (União-PR). Embora favorável a privatizações em geral, o ex-juiz reconheceu dúvidas jurídicas sobre a conformidade do processo com a LGPD e criticou a ausência da direção da Celepar, que ignorou convites para prestar esclarecimentos.
Para a oposição, a Celepar é patrimônio do Paraná. “Defender a Celepar é defender os direitos dos paranaenses e a segurança digital do Estado. O pedido do Ministério Público e a suspensão no Tribunal de Contas confirmam a necessidade dessa luta”, reforçou Arilson.
A ofensiva do MP-PR, somada à paralisação no TCE e à resistência política e sindical, mostra que a privatização da Celepar azedou. A pressão sobre o governo Ratinho Júnior aumenta, enquanto cresce a percepção de que entregar o coração digital do Paraná à iniciativa privada seria um risco não apenas econômico, mas também à democracia e à soberania.
Google e Celepar expõem fragilidade de Ratinho
O desgaste em torno da Celepar se soma ao contrato bilionário firmado pelo governo Ratinho Júnior com o Google Cloud, revelado pelo Blog do Esmael. Ainda em julho, servidores denunciaram que a estatal vinha sendo esvaziada para abrir espaço a gigantes privadas, em movimento iniciado na gestão de Guto Silva (PSD) no Planejamento.
A parceria com a big tech, que envolve desde biometria facial até algoritmos para avaliação escolar, levantou suspeitas de conflito de interesses por causa do vínculo de Silva com a deputada federal Luísa Canziani (PSD-PR), presidente da Comissão de Inteligência Artificial na Câmara.
O caso virou alvo da oposição na Assembleia e, no Senado, foi parar nas mãos de Sergio Moro, que aprovou requerimento para investigar o acordo. A aliança tácita entre PT e Moro nesse tema sinaliza que a questão da soberania digital do Paraná ultrapassou fronteiras ideológicas.
Nos bastidores, líderes lembram que a Celepar faturou R$ 760 milhões em dois anos, com lucro líquido de R$ 130 milhões, e questionam por que abrir mão de um ativo estratégico e rentável. Para adversários, o cruzamento entre o contrato do Google e a tentativa de privatização da Celepar expõe a fragilidade política de Ratinho e pode pesar diretamente em seu projeto de sucessão em 2026.
Jornalista e Advogado. Especialista em política nacional e bastidores do poder. Desde 2009 é autor do Blog do Esmael.
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