Daqui a pouco, às 10 horas, o agora ex-deputado ficha suja Deltan Dallagnol desembarca no aeroporto internacional Afonso Pena, em São José dos Pinhais (PR), com a narrativa de que é vítima do jogo bruto dos poderosos e blá, blá, blá. No entanto, ele terá a oportunidade de explicar ao menos 12 supostas irregularidades comentidas por eles. Algumas comprovadas pelo Supremo Tribunal Federal e outras objetivos de sua cassação pelo Tribunal Superior Eleitoral esta semana. Abaixo, assista o vídeo.
A trajetória controversa de Dallagnol é repleta de polêmicas e questionamentos que não podem ser ignorados. Afinal, é preciso analisar com cautela as ações e condutas de figuras públicas que exerceram um papel tão influente na política e no sistema judiciário brasileiro.
Entre as irregularidades que Dallagnol terá que explicar está a aquisição de dois apartamentos de luxo no edifício Plymouth Hills, em Curitiba. O ex-procurador adquiriu esses imóveis com valores abaixo do preço de avaliação, o que levanta suspeitas sobre possíveis benefícios indevidos. Além disso, Dallagnol comprou quatro lojas da Hering em shoppings de Curitiba, todas em nome de familiares, incluindo sua filha de apenas 2 anos de idade na sociedade das empresas. Essas transações levantam questionamentos sobre possíveis práticas de lavagem de dinheiro.
Outro ponto de destaque é a questão envolvendo uma indenização milionária do Incra. O órgão busca reverter na Justiça a desapropriação de 17 fazendas que pertenciam à família de Dallagnol, alegando um sobrepreço considerável. Essa situação levanta dúvidas sobre possíveis influências e privilégios obtidos pelo ex-procurador durante sua atuação na Lava Jato.
Uma das ações mais controversas de Dallagnol foi a tentativa de desviar R$ 2,5 bilhões de ressarcimentos à Petrobras para a criação de um fundo privado gerenciado por ele. Essa manobra, que visava supostamente combater a corrupção, foi barrada pelo Supremo Tribunal Federal. Essa atitude questionável revela uma possível busca por poder e benefícios pessoais em detrimento do interesse público.
Além disso, Dallagnol autorizou o pagamento de diárias e passagens consideradas irregulares pelo Tribunal de Contas da União, o que resultou em sua condenação a devolver R$ 2,8 milhões aos cofres públicos. Essa conduta suscita questionamentos sobre sua ética e transparência no uso dos recursos públicos.
Outro aspecto que merece destaque são as palestras patrocinadas por Dallagnol enquanto exercia o cargo de procurador da Lava Jato. Utilizando sua posição de destaque, ele obteve lucros consideráveis com essas palestras, o que levanta dúvidas sobre possíveis conflitos de interesse e uso indevido de sua influência no sistema judicial para benefício pessoal.
Além disso, Dallagnol é acusado de violar o princípio da imparcialidade ao trocar mensagens com o então juiz Sérgio Moro, discutindo estratégias e alinhando ações durante as investigações da Lava Jato. Essas trocas de mensagens, reveladas pelo site The Intercept Brasil, na série de reportagens da Vaza Jato, colocam em xeque a imparcialidade do processo e levantam preocupações sobre a conduta ética do ex-procurador.
Outra irregularidade que Dallagnol terá que explicar é a utilização de recursos públicos para financiar uma campanha publicitária da Lava Jato. A campanha, intitulada “10 Medidas contra a Corrupção”, foi amplamente divulgada e contou com o apoio de diversos veículos de comunicação. No entanto, posteriormente foi constatado que parte dos recursos utilizados na campanha era proveniente de acordos de leniência celebrados com empresas investigadas, o que suscita questionamentos sobre a legalidade e transparência dessa utilização de recursos.
Por fim, Dallagnol terá que prestar esclarecimentos sobre o suposto uso de recursos da Fundação Petrobras, destinados a projetos sociais, para financiar um instituto de sua família. Essa ação levanta suspeitas de desvio de finalidade e mau uso de recursos públicos.
Em resumo, as 12 supostas irregularidades cometidas por Deltan Dallagnol, que ele terá que explicar, abrangem desde aquisição de imóveis com valores abaixo do preço de avaliação, transações suspeitas envolvendo empresas e familiares, tentativa de desvio de recursos, violação da imparcialidade, uso indevido de recursos públicos e conflitos de interesse. Essas questões colocam em xeque a conduta ética e a idoneidade do ex-procurador, e é fundamental que sejam investigadas e esclarecidas para garantir a transparência e a integridade no sistema judiciário brasileiro. Além de passar a limpo esse nebuloso período de caça às bruxas no país.
Assista os questionamentos feitos pelo deputado Glauber Braga (PSOL-RJ). Após o vídeo, continua o texto…
Explica aí, Deltan:
- Dois apartamentos de luxo
O ex-procurador adquiriu dois apartamentos de 400 metros quadrados cada um, no edifício Plymouth Hills, em Curitiba. O primeiro foi comprado por R$ 1,8 milhão, quando o preço de avaliação no prédio era de R$ 2,3 milhões. O outro foi comprado em leilão, em nome de sua mulher, por R$ 2 milhões. Casado em comunhão parcial de bens, o então procurador não poderia participar do leilão nem de forma indireta (Lei 13.105, de 16/03/2015).
Hoje ele mora nesse apartamento, no 10º andar, que originalmente pertenceu ao ex-secretário de Maringá Luis Antonio Paolicchi, assassinado em 2011. O primeiro apartamento, no 3º andar, ele vendeu em 2021 (três anos depois de comprar), por R$ 2,7 milhões, um lucro de 50% sobre os R$ 1,8 milhão que ele disse ter pago.
2. Lojas Hering
Dallagnol comprou quatro lojas Hering em shoppings de Curitiba, todas em nome de seus familiares. Até a filha que à época tinha 2 anos de idade foi colocada como sócia de uma das lojas. As outras foram registradas em nome de uma irmã e dos pais do ex-procurador. E toda a negociação foi conduzida pessoalmente por Dallagnol.
3. Indenização milionária do Incra
O Incra tenta reverter na Justiça a desapropriação de 17 fazendas da Gleba Japuranã, em Nova Bandeirantes, no Mato Grosso, que pertenciam à família de Deltan Dallagnol. Entre eles está Agenor Dallagnol, pai do ex-procurador, de quem o Incra cobra a devolução de R$ 8 milhões. O órgão estima que houve um sobrepreço de pelo menos R$ 147 milhões na desapropriação das 17 fazendas.
4. O fundo bilionário da Petrobras
No comando da Lava Jato, Dallagnol tentou desviar R$ 2,5 bilhões de ressarcimentos à Petrobras para formar um fundo privado, a ser gerenciado por ele, supostamente para combater a corrupção. Quando foi descoberta, a manobra acabou sendo barrada no STF e Dallagnol ficou sem o fundo bilionário.
5. As diárias irregulares
Como procurador, Dallagnol autorizou o pagamento de diárias e passagens para sua equipe, consideradas irregulares pelo Tribunal de Contas da União. Dallagnol foi condenado a devolver R$ 2,8 milhões aos cofres públicos. Entre os beneficiários das diárias estava seu pupilo Diogo Castor de Mattos, demitido do Ministério Público Federal após processo no CNMP. O próprio Dallagnol pediu demissão do MPF em novembro de 2021, numa manobra para escapar aos processos disciplinares abertos contra ele no CNMP.
6. As palestras patrocinadas
Como procurador da Lava Jato, Dallagnol usou sua posição para faturar com palestras contratadas por entidades e empresas privadas. Em 2018, segundo as conversas divulgadas pelo site The Intercept, o próprio Dallagnol informou a colegas que “as palestras e aulas já tabeladas neste ano estão dando (lucro) líquido 232k (R$ 232 mil)”. No total, as palestras renderam ao ex-procurador cerca R$ 1 milhão no período em que ele ficou na Lava Jato.
7. Minha Casa Minha Vida
Em agosto de 2013, Dallagnol comprou um apartamento do projeto Minha Casa Minha Vida por R$ 76 mil, no condomínio Le Village Pitangui, na cidade de Ponta Grossa. Em fevereiro de 2014, comprou outro apartamento, no mesmo condomínio, por R$ 80 mil. Evidentemente, o então procurador não tinha o menor interesse em morar nesses apartamentos, destinados a famílias de baixa renda. Usou um projeto social do governo federal para ganhar dinheiro, especulando com imóveis. Um deles teria sido vendido por R$ 134 mil, segundo noticiou a imprensa. O outro ainda continuaria de posse do ex-procurador. Ao entrar no Minha Casa Minha Vida, Dallagnol ainda prejudicou famílias que não conseguiram acesso ao programa.
8. Auxílio-moradia
Como procurador, Dallagnol recebia irregularmente R$ 4.377,73 por mês a título de Auxílio-moradia. E por que era irregular? Porque Dallagnol tinha imóvel próprio em Curitiba, não precisava receber “auxílio-moradia”. Mas ele nunca abriu mão desse benefício. Com o auxílio-moradia, ele ganhava mais que o teto de R$ 35 mil mensais de procurador, mas essa verba e outras pagas como indenização ficavam fora desse cálculo. Ou seja, na visão do ex-procurador, ética e moral são requisitos que ele cobra dos outros, mas quando se trata do seu próprio interesse, tudo é relativo.
9. Condenações
As estripulias de Dallagnol já lhe renderam duas condenações. Uma delas foi confirmada na semana passada pelo STF, no caso de pena de advertência do Conselho Nacional do Ministério Público, por politizar suas manifestações como procurador. A outra foi a do Tribunal de Contas da União, que condenou o ex-procurador a devolver aos cofres públicos R$ 2,8 milhões em diárias frias pagas à sua equipe, mas que encontra-se suspensa por recurso judicial.
10. Estagiário
Dallagnol também responde a ação movida pela Coligação Brasil da Esperança (PT-PCdoB-PV) na Justiça Eleitoral do Paraná, por usar um ex-estagiário do MPF para desviar recursos de seu partido, o Podemos, para sua pré-campanha. Notas fiscais que mostram o pagamento de valores que chegam a R$ 103 mil ao ex-estagiário foram descobertas pela acusação e juntadas ao processo. Matheus Almeida Rios Carmo, que foi estagiário do MPF e é advogado do ex-procurador da Lava Jato, recebeu o dinheiro durante o período de pré-campanha eleitoral, supostamente por serviços prestados ao Podemos em 2022. No entanto, os pagamentos seriam, na verdade, uma manobra para quitar serviços prestados a Dallagnol, o que configuraria “caixa 2” e campanha antecipada.
11. Extorsão contra Tacla Duran
O advogado Rodrigo Tacla Duran denunciou, em depoimento à Polícia Federal, no dia 27 de março de 2023, que foi alvo de extorsão, no valor de US$ 5 milhões, para não ser preso durante a Operação Lava Jato. A acusação, que está sendo apurada em processo no Supremo Tribunal Federal, envolve o ex-juiz Sergio Moro e o ex-procurador Deltan Dallagnol. Tacla Duran afirma ter depositado US$ 613 mil na conta de um escritório de advocacia ligado à mulher de Moro, Rosângela Moro, hoje deputada federal por São Paulo. Essa seria a primeira parcela do pedido de US$ 5 milhões. O objetivo dos pagamentos seria viabilizar uma delação de Tacla Duran, que teria o aval de Dallagnol. Duran afirmou ainda que, ao não prosseguir com os pagamentos, teria feito com que Moro decretasse a sua prisão. O intermediário do pedido de US$ 5 milhões teria sido o advogado Carlos Zucolotto Júnior, sócio de Rosângela Moro, seis meses antes de Duran ter seu pedido de prisão decretado, em 2016.
12. Procurador pela porta dos fundos
Deltan Dallagnol ingressou na carreira de procurador federal de forma irregular, burlando a lei, segundo reportagem do jornalista Reinaldo Azevedo. Formou-se advogado em 6 de fevereiro de 2002 e, contrariando a lei, fez concurso no mesmo ano para a Procuradoria Geral da República. Aprovado, foi empossado em 10 de fevereiro de 2003, apenas um ano depois de formado. A Lei Complementar 75/93 exigia que só poderiam prestar concurso para a PGR “bacharéis em Direito há pelo menos dois anos, de comprovada idoneidade moral”. Posteriormente, a Emenda Constitucional 45, de 2004, elevou esse prazo para três anos. Para burlar a lei, Deltan constituiu como advogado seu pai, procurador aposentado do Estado do Paraná. Para isso, contou com a “teoria do fato consumado”. Ou seja, quando a matéria foi julgada ele já havia tomado posse e exercia suas funções de procurador. Em 2014, o STF decidiu que a “teoria do fato consumado”, em matéria de concursos públicos, não poderia mais ser admitida.
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