CNJ investigará Moro por violar transparência e prudência ao destinar R$ 2,1 bi à Petrobras

  • Conselho Nacional de Justiça “seguirá o dinheiro” em gestão caótica e violação a deveres da magistratura, segundo ministro
  • Para o magistrado, Moro pode ter tentado burlar a lei ao pedir exoneração em meio aos processos

O Corregedor Nacional de Justiça, Luis Felipe Salomão, determinou a instauração de uma reclamação disciplinar contra o ex-juiz e senador Sergio Moro (União-PR) e a juíza federal Gabriela Hardt, ex-titulares da Operação Lava Jato, para apurar “graves” indícios de violações praticadas no âmbito da força-tarefa de Curitiba.

É a primeira vez que a conduta de Moro é investigada com maior profundidade.

Caso punido, ele pode virar ficha suja e se tornar inelegível.

Eventuais crimes serão investigados pelo grupo da Polícia Federal (PF) que o corregedor está criando com o ministro Flávio Dino, do Ministério da Justiça.

A decisão de Salomão se baseia em um relatório preliminar da correição realizada pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) na 13ª Vara Federal do Paraná, em Curitiba, e na 8ª Turma do TRF4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), em Porto Alegre.

Essas cortes decidiam os casos da operação em primeira e em segunda instância, respectivamente.

Economia

De acordo com Salomão, Moro e Hardt podem ter promovido, entre 2015 e 2019, o repasse de R$ 2,1 bilhões à Petrobras sem critérios objetivos.

O montante teria sido transferido antes mesmo do trânsito em julgado de parte das ações penais, em um processo instaurado de ofício que não incluiu a participação de réus e investigados.

Na decisão, Salomão cita um trecho da correição realizada que afirma o seguinte:

“Em período compreendido entre o ano de 2015 e o ano de 2019, na cidade de Curitiba, Paraná, o então juiz federal Sergio Fernando Moro e a juíza federal substituta Gabriela Hardt, da 13ª Vara Federal de Curitiba, em atendimento aos interesses do então procurador da república Deltan Dallagnol, de procuradores da república da denominada força-tarefa da Lava Jato e de representantes da Petrobras, violaram reiteradamente os deveres de transparência, de prudência, de imparcialidade e de diligência do cargo ao promoveram o repasse de R$ 2.132.709.160,96″ à estatal, “atribuindo a essa companhia a posição de vítima, conscientes de que a Petrobras estava sob investigação por autoridades americanas desde novembro de 2014, por conduta ilícita da empresa nos Estados Unidos da América”.

“O alegado combate à corrupção não pode servir de biombo para se praticar, no processo e na atividade judicante, as mesmas condutas que se busca reprimir”, afirma o magistrado.

Salomão segue:

“Durante a operação intitulada Lava Jato, foi adotado pelo então juiz federal Sergio Fernando Moro, juntamente com integrantes da força-tarefa que se formou para executar aquela operação, critério de destinação dos valores decorrentes dos acordos de colaboração e de leniência absolutamente distante do critério legal de decretação de perda”, afirma o corregedor Nacional de Justiça.

“A anuência do Juízo ao ímpeto de efetuar a execução imediata dos termos estabelecidos nos acordos firmados pela força-tarefa terminava por consolidar verdadeira dispensa do devido processo legal”, diz ainda.

Em sua decisão, Salomão destaca que a força-tarefa elegeu a Petrobras como a “vítima para todos os fins”, apesar de a empresa também ser alvo de investigação por fraudes cometidas em sua gestão.

Os repasses à estatal ainda teriam ocorrido num cenário de “vácuo informativo”, em que não foi apurado os prejuízos efetivamente sofridos pela petrolífera.

O corregedor afirma que, embora Moro não seja mais um juiz, a jurisprudência do CNJ busca impedir que magistrados deixem a carreira para se livrar de eventuais punições administrativa e disciplinar.

Diz, ainda, que o senador respondia a cerca de 20 procedimentos administrativos quando deixou a magistratura.

Para o magistrado, Moro pode ter tentado burlar a lei ao pedir exoneração em meio aos processos.

“Os atos censuráveis sugerem, ademais, efetiva preparação ao ingresso na vida política, mediante a prática de condutas infracionais como meio de autopromoção, em confronto evidente aos deveres da magistratura e à imagem do Poder Judiciário”, afirma Salomão.

O corregedor pontua que o padrão de atuação da 13ª Vara Federal de Curitiba resultou em infrações “proibitivas” para a categoria.

Salomão cita a Constituição, que afirma aos juízes “é vedado dedicar-se à atividade político-partidária”, e uma resolução do CNJ que versa sobre o mesmo tema.

“A integridade de conduta do magistrado e distanciamento de suas paixões e projetos pessoais contribui para uma fundada confiança dos cidadãos na judicatura, justificando-se, portanto, a imposição de restrições e exigências pessoais distintas das acometidas aos cidadãos em geral”, afirma o corregedor.

“É a vigência do Estado Democrático de Direito que faz nascer para o cidadão a confiança no Poder Judiciário. Na contramão disso, a conduta individual do magistrado com conteúdo político-partidário arruína a confiança da sociedade em relação à credibilidade, à legitimidade e à respeitabilidade da atuação da Justiça, atingindo o próprio Estado de Direito que a Constituição objetiva resguardar.”

Além de Sergio Moro e Gabriela Hardt, o corregedor do CNJ também abriu reclamação disciplinar contra os desembargadores federais do TRF4 Loraci Flores de Lima, João Pedro Gebran Neto e Marcelo Malucelli.

Segundo o ministro Luis Felipe Salomão, as condutas dos três desembargadores serão investigadas, de forma individualizada, diante do recurso apresentado pela Petrobras contra decisão da 13ª Vera Federal de Curitiba, que previa a transferência de mais de R$ 43 milhões ao FUNPEN e à Conta Única do Tesouro Nacional.

O processo está pendente de julgamento há mais de um ano e cinco meses, tendo passado pela relatoria dos três magistrados sem análise definitiva.

O recurso foi distribuído ao desembargador Gebran Neto em abril de 2022, onde ficou paralisado por 152 dias, até ser redistribuído ao desembargador Marcelo Mallucelli.

Ali, o recurso ficou sem movimentação por 227 dias, até o magistrado se declarar suspeito.

Então, o processo foi mais uma vez redistribuído, agora à relatoria do desembargador Loraci Flores de Lima, onde continua sem impulso oficial desde abril deste ano.

“Há necessidade de se perquirir, na esfera administrativa, se a paralisação na condução do processo indicado, que possui relevante conexão com todo o sistema de destinação de valores e bens da operação denominada Lava-Jato, pode revelar atuação a macular o previsto na Constituição Federal, na LOMAN e no regramento traçado por este Conselho, em referência aos magistrados vinculados”, destaca o corregedor nacional em sua decisão.

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