O Senado recuou e empurrou para 2026 a votação da nova lei do impeachment depois da reação imediata da oposição, das Forças Armadas e do Ministério Público, num movimento que expôs o risco de conflito aberto entre Legislativo e Supremo Tribunal Federal.
O senador Weverton Rocha (PDT-MA), relator da proposta na CCJ, pediu mais tempo para revisar o texto diante das pressões de instituições que seriam diretamente afetadas. O adiamento ocorre no mesmo ambiente político em que a chantagem de Flávio Bolsonaro (PL-RJ), ao lançar uma pré-candidatura presidencial para forçar a anistia do pai, escalou tensões entre os poderes e detonou a corrida da Câmara para aprovar a redução de penas dos golpistas.
Weverton reconheceu que recebeu sugestões de mudança do líder da oposição, senador Rogério Marinho (PL-RN), e de integrantes das Forças Armadas e do Ministério Público, indicando que o projeto avançava sem consenso mínimo. Ele também tentou afastar a percepção de que o Senado estaria legislando em reação direta à liminar do ministro Gilmar Mendes, que restringiu pedidos de impeachment contra ministros do STF à Procuradoria-Geral da República.
A medida de Gilmar, vista no Congresso como usurpação da prerrogativa do Senado, acendeu o pavio político. A cúpula do Legislativo, sob comando de Davi Alcolumbre (União-AP), pressionou o STF para suspender a decisão enquanto o projeto tramita. Um acordo de bastidores, articulado com Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e ministros da Corte, deve levar Gilmar a sustar os efeitos da liminar.
A prévia do relatório de Weverton buscava uma saída intermediária. Reduzia a blindagem dada pelo STF e autorizava pedidos de impeachment por partidos com representação no Congresso, pela OAB, por entidades de classe e por iniciativa popular com 1,56 milhão de assinaturas. Também criava prazo de 30 dias úteis para o presidente da Câmara decidir sobre pedidos de impeachment contra presidente da República e outras autoridades.
Esse trecho, embora não alcance ministros do Supremo, mexe na arquitetura institucional. A oposição teme que o texto seja usado para reduzir o alcance de futuros pedidos contra autoridades do Executivo e do Judiciário, enquanto governistas receiam que mudanças bruscas atendam à agenda da extrema direita, que planeja renovar dois terços do Senado para abrir caminho ao impeachment de ministros do STF.
O ruído institucional cresceu quando o Senado pediu ao STF a suspensão da liminar. A Advocacia do Senado argumentou que a decisão criava “zonas de dúvida interpretativa” e interferia no processo legislativo. A Corte reconheceu o risco de instabilidade, e ministros próximos a Gilmar sinalizaram disposição para congelar a própria decisão para evitar uma crise maior.
Bastidores confirmam que o calor político das últimas semanas, alimentado pela chantagem de Flávio Bolsonaro e pela votação relâmpago da anistia na Câmara, contaminou o debate sobre o impeachment. Senadores temiam que avançar no projeto sob essa temperatura fosse interpretado como tentativa de retaliação ao Judiciário ou como aceno estratégico à direita radical.
O adiamento funciona como válvula de escape. Permite ao Senado reorganizar o debate, realizar sessões temáticas e buscar apoio institucional antes de reiniciar a tramitação. Mas não resolve a disputa central: quem deve controlar o gatilho do impeachment e qual equilíbrio entre autonomia dos poderes e mecanismos de responsabilização democrática o país precisa construir.
No Congresso, a pergunta permanece aberta: o Senado recuou por prudência ou porque a crise política, inflada pela chantagem do zero um e pela pressão da direita, ultrapassou o limite seguro para votar qualquer mudança estrutural nas regras do impeachment?
A resposta, como sempre, continuará no campo da política real.
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Jornalista e Advogado. Especialista em política nacional e bastidores do poder. Desde 2009 é autor do Blog do Esmael.



