Ainda uma vez adeus, Petrobrás, Brasil! – Artigo de Pedro Augusto Pinho

Em artigo especial para o Blog do Esmael, Pedro Augusto Pinho expressa sua discordância com a falta de nacionalismo da classe política no Brasil. O articulista argumenta que a raiz dos problemas do Brasil são seus quatro séculos de escravidão, o que levou à falta de medidas para promover o desenvolvimento nacional e, em vez disso, à promoção dos interesses das finanças estrangeiras. Pinho propõe que a Petrobras poderia desempenhar um papel na luta contra a escravidão moderna, promovendo a produção de bioenergia e a descentralização da produção de energia, levando à industrialização das áreas rurais e à geração de emprego, renda e conhecimento. Ele ainda defende o foco nas questões nacionais e o fim de ideologias estrangeiras como o neoliberalismo econômico. Abaixo, leia a íntegra:

Ainda uma vez adeus, Petrobrás, Brasil!

Pedro Augusto Pinho*

Do político, homem público, José Ribamar Ferreira de Araújo Costa, conhecido como José Sarney (1930) só tenho discordâncias. Jamais soube do uso de seu poder político que não se dirigisse ao interesse pessoal, familiar, para estreito círculo de eleitores e partidários. Creio que nenhuma gota de nacionalismo corria em seu sangue. 

No entanto, vou também usar o título desta magnífica poesia de Gonçalves Dias, como ele o fez, na “Folha de S.Paulo”, em 23/09/2005, para queixa. Não do amor, que não se concretizou, no passado, nem dos colegas, “patres conscripti”, cujo interesse nacional, como a exclamação de Cícero, o orador romano, perdeu-se no tempo. Mas destes homens e mulheres de meu País, que jamais o quiseram soberano, poderoso entre as nações, e com sua imensa riqueza utilizada para o benefício de todo seu povo. 

O primeiro passo para a autonomia é o conhecimento. Que conhecimento teriam do Brasil aquelas pessoas acampadas na frente dos quarteis, muitas para receberem um prato de comida ou um trocado para bebida? Que poderia esperar a turba que entrou depredando móveis, objetos de arte, a história do Brasil, nos prédios que representam, para o bem e para o mal, o poder visível no Brasil? E não sei qual pior, os destruidores, ou aqueles que se aproveitaram da ignorância para justificar a ausência das medidas mais imediatas, que apenas dependiam de ato de governo, para reverter a situação de dependência energética e da falta de emprego, que vive o autossuficiente em energia Brasil. 

Um e outro dos escolhidos para participar do terceiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva ainda usa a palavra “desenvolvimento” como só existisse um, e para o povo brasileiro. 

Economia

O que têm feito todos os governos desde o general João Baptista Figueiredo até hoje? Promover a desnacionalização do País, mesmo quando se aumenta a riqueza produzida, de modo que este desenvolvimento econômico seja apropriado por finanças apátridas, vá enriquecer estrangeiros. 

Precisamos ir à raiz de nossos males, e o maior dele foram quatro séculos de escravidão legal, sucedidos pela informal. E por falta das medidas, preconizadas por José Bonifácio de Andrada e Silva, que não encontraram senão oposição raivosa no poder nacional, construído pela escravidão e pela sujeição aos interesses estrangeiros, fossem de Portugal, da Inglaterra, dos Estados Unidos da América (EUA) ou das finanças apátridas. 

A Petrobrás brasileira poderia, com sua capacidade tecnológica e administrativa, uma vez sob a direção nacionalista, ser um pilar sólido do combate à escravidão. Promovendo a reforma agrária na produção de bioenergia e no desenvolvimento da química do etanol, para substituir parte da petroquímica, com álcool metílico, isopropílico, etc. 

Assim, estaria descentralizando a produção de energia, promovendo a industrialização, geração de emprego, renda e saber pelo interior do Brasil, fora dos grandes centros urbanos, pelas áreas onde as riquezas do sol, da água e da terra seriam nacionalmente aproveitadas. 

A Petrobrás, condutora desta transformação, não estaria se afastando de seus objetivos como empresa de petróleo e de energia, mas dando mais uma contribuição à sociedade, à população brasileira, seus verdadeiros donos, no resgate da dívida nacional, como propôs, há dois séculos, o estadista José Bonifácio.  

O grande historiador capixaba Manolo Garcia Florentino (1958-2021), afiança que “entre os séculos XVI e XIX, 40% dos quase 10 milhões de africanos importados pelas Américas desembarcaram em portos brasileiros”, tornando o comércio de seres humanos o item de maior peso nas importações coloniais (Manolo Florentino, “Em Costas Negras”, UNESP, SP, 2014). 

Qual “mercado”, qual empresa conduzida pelas finanças apátridas, teria esta ação de desenvolvimento com cidadania?  

É preciso encarar as questões nacionais como são, não como nas máscaras, nas fantasias dos colonizadores, propagadas em simpósios internacionais, cercadas de luzes e da sua imprensa, como o circo, que verdadeiramente é. Chega de ideologias estrangeiras, como o neoliberalismo que infesta o Brasil desde a década de 1960. 

O anticomunismo, que já foi uma indústria no Brasil, permanece em mãos neoliberais, para que não se denuncie absurdos, como a Lei 14.185, de 2021, regulamentada pelo Banco Central, dependente apenas dos capitais apátridas, para promover a utilização gradual e ordenada dos depósitos voluntários para administração de excedentes de reservas bancárias e controle da taxa de juros de curto prazo. 

Ou seja, que os bancos onde muitos brasileiros têm sua conta de salário possam, legalmente, aplicar os saldos dos clientes, ao fim de cada dia, para gerar déficit na contabilidade do Estado e lucro para os bancos, mediante o que já se denominou “overnight”. 

Porém na farsa de independente, apenas dos interesses nacionais, a taxa de remuneração definida pelo Banco Central tem o objetivo de ajustar a taxa Selic efetiva. “Segundo o BC, os depósitos remunerados atuam de forma semelhante às operações compromissadas, como um instrumento adicional de política monetária”, notícia no “Poder 360”, em 03/02/2022. 

Perdão de não ter ousado viver contente e feliz

Poucas oportunidades teve o Brasil de se libertar. Sempre as forças colonizadoras conseguiram, iludindo o povo, com a intensificação da pedagogia colonial, colocar mais medo do que esperança, e reverter, ou nem mesmo deixar surgir, o governo nacionalista, conquistar a efetiva soberania brasileira. 

O jornal paulista “O Estado de S. Paulo”, que se caracterizou, no passado, pela defesa dos fazendeiros produtores de café, pela defesa das monoculturas, pela exportação, e, com isso, os interesses estrangeiros, e sempre se opondo ao “populismo”, assim entendido todo projeto de ascensão social, de bem estar para os desvalidos, no domingo, 05/02/2023, traz artigos e notícias para, no resumo, dizer: se os bancos não estiverem recebendo mais da metade do orçamento federal, o Brasil será destruído, não mais haverá condição de viver.  

É o primeiro mandamento do decálogo do Consenso de Washington, 1989, equivalente ao “amar a Deus sobre todas as coisas” dos católicos: “disciplina fiscal – o governo deve limitar seus gastos e reduzir as dívidas, evitando assim impostos inflacionados”. Ao que segue o “não tomar seu santo nome em vão”: “reordenamento dos gastos públicos, priorizando-os para áreas de maior retorno financeiro”. “Guardar domingos e festas de guarda” seria o terceiro mandamento das finanças apátridas (Consenso de Washington) “reforma fiscal e tributária para modificar os sistemas de arrecadação de impostos e, em consequência, diminuir os valores cobrados às empresas”. 

O sonho dos bilionários rentistas, especuladores improdutivos, sugando as riquezas nacionais para suas receitas, concentrando a renda e o patrimônio, em número mínimo de mãos. 

Celso Ming, comentarista de economia, em sua coluna, com título “Meta mais alta de inflação?”, usa de argumento falacioso de variações percentuais para afirmar que a meta de inflação vem caindo e, com base no órgão oficial dos Banqueiros e Financistas, Boletim Focus, chegará ao ponto mais baixo ao fim do governo Lula. Acredite quem quiser! 

Na página B3 do caderno “Economia & Negócios”, há clara demonstração da sujeição colonial: “Desvalorização do real eleva preço de ônibus”. Nem pensar na indústria brasileira, em processo de demolição, passar a fabricar ônibus, mais adequado, certamente, às condições das estradas e das temperaturas brasileiras do que os importados da China. A matéria traz o clima de terror à “explosão inflacionária”, principalmente para os mais pobres, como obtêm na entrevistada diarista. 

À página B4 há verdadeiro show dos ajustes fiscais e da aplicação dos tetos de gastos, que só não atingem dívidas financeiras. O artigo do sócio da MB Associados clamando pela rapidez no estrangulamento de salários e direitos trabalhista e previdenciários e redução da carga tributária: “Está chegando a hora”. 

O artigo “Atuação mais forte do BNDES pode afetar eficácia da Selic contra inflação”, que poderia ser visto com o sinal trocado: “O BNDES pode elevar a capacidade produtiva da indústria nacional, dando menor força às especulações cambiais”, ou “O desenvolvimento do parque industrial brasileiro é o caminho seguro para termos no País os controles de preço e de custo”. 

Na Coluna do Broadcast, página B6, o ataque é à energia, velha pendenga das finanças apátridas, que nos faz recordar a década 1970 e o “oil glut” de 1980. 

O foco é duplo: primeiro privatizar. Já nos tiraram a Eletrobrás, inviabilizaram a Nuclebrás, e o próximo passo será extirpar a Petrobrás. O outro objetivo é importar energia pelo uso de energias eólica, solar, com instalações e tecnologias importadas, e com vegetais que exijam fertilizantes não produzidos no Brasil. E nós, que somos autossuficientes em energia, com as produções de origem hídrica e fóssil, retrocederemos aos anos 1970, quando as importações de petróleo, pela elevada dívida externa, levaram ao fim o projeto nacionalista do Presidente Geisel.  

Tudo que está nesta coluna é propaganda, ameaça, ou os maus exemplos adotados pelos colonizadores. 

O polonês, nacionalizado francês, Ignacy Sachs, que por mais de uma década viveu no Brasil, publicou, em tradução de Eneida Cidade de Araújo, para as Edições Vértice (SP, 1986), “Espaços, tempos e Estratégias do Desenvolvimento”.  

Transcrevemos: “As opções ideológicas e a clivagem intervinham ao nível da escolha do modelo a seguir, uns propondo refazer o caminho percorrido pelos países industrializados a partir da Revolução Industrial, outros defendendo as virtudes universais do modelo soviético”. 

Nestas quatro décadas, que separam a conclusão de Sachs do que temos atualmente, há homogeneidade e ausência. A identidade está na hegemonia ocidental neoliberal e no comunismo ortodoxo, liberalismo e marxismo se encontram na universalidade. 

A ausência, de ontem e de hoje, é a questão nacional, que impulsionou os melhores momentos do desenvolvimento brasileiro, o período de 1930 a 1945, “Era Vargas”, e o período de 1969 a 1979, governos Médici e Geisel, da “ditadura militar”. 

Isto posto, não se admira que os quarteis sejam a escolha dos que desejam, com nenhuma ou pouquíssima compreensão da composição da sociedade brasileira, sua transformação. 

Mas a realidade é outra, nesta era da informação, da comunicação instantânea, da substituição do trabalho, mesmo intelectual, por máquinas. Há o mundo unipolar da submissão colonial, e o multipolar das individualidades culturais, das composições das populações, dos estágios e características civilizatórias. 

De idêntico existem a necessidade alimentar e a de energia. E, ainda assim, não serão iguais, mas adequadas ao meio onde se desenvolve a sociedade. 

Não há mercado, há nacionalidade, não há ameaças, há a especificidade do meio e da composição populacional, o que existe, impedindo o desenvolvimento integral do país, é sua elite com olhos, dinheiro e ideologias, fora dos limites geográficos da Nação. 

Para concluir, voltemos a Gonçalves Dias (1823-1864) e a sua poesia, em “Ainda uma vez Adeus”: 

“Tanta ilusão me afagava 

De noite, quando acordava,  

De dia em sonhos talvez!  

Tudo isso agora onde para? 

Onde a ilusão dos meus sonhos? 

Tantos projetos risonhos, 

Tudo esse engano desfez” (1854). 

*Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado, atual presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás – AEPET, neste artigo expõe seu pensamento, não necessariamente o da Diretoria da AEPET. 

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