Cappelli: Ciro não pode errar a música do bloco, que não é frente antipetista

O jornalista Ricardo Cappelli explica que é errada qualquer sinalização de que a eventual formação de um bloco com PDT, PSB e PCdoB seja um movimento anti-PT. Ele também “belisca” Ciro Gomes: “Errou ao não declarar apoio a Haddad no segundo turno. Erra novamente ao dinamitar pontes com o PT.”

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Não pode errar a música do bloco

Ricardo Cappelli*

Ciro tem razão em boa parte das críticas que faz ao PT. Diferenciação e demarcação de campo é da política, faz parte do jogo. Erra, entretanto, ao fornecer munição aos que desejam a destruição do PT.

O Partido dos Trabalhadores é a maior agremiação política do Brasil. Uma força viva impressionante. Difícil imaginar outro que sobreviveria ao massacre a que está submetido.

Economia

Independentemente do custo de sua estratégia para o país, o resultado objetivo é que o PT saiu do pleito com 56 deputados federais E 4 governadores.

É errada qualquer sinalização de que a eventual formação de um bloco com PDT, PSB e PCdoB seja um movimento anti-PT. É um arranjo necessário para reorganização do campo progressista, inclusive para ajudar o PT.

Política não se faz com frases de efeito ou com a justeza de teses, em tese, mais corretas. É movida pela correlação de forças objetiva, matéria contra matéria.

O PT não é hegemonista apenas porque quer, mas, sobretudo, porque pode. Isoladamente é maior que qualquer outra força do campo progressista. Capaz até de eleger Bolsonaro presidente pela força de sua negação.

A formação de um bloco político-social com cerca de 70 deputados pode fazer bem ao campo progressista. PDT, PSB e PCdoB se complementam e têm trajetórias históricas importantes.

O PT deveria ser bem recebido no bloco. É pouco provável que se interesse. Como Zé Dirceu já disse, “o partido já é uma frente, não tem como ir para dentro de outra”.

A construção de uma alternativa na esquerda poderá equilibrar o jogo com o PT, fazê-lo refletir. Não faz sentido exigir do partido autocrítica em praça pública. Entretanto, com um aliado de mesmo tamanho para conversar as coisas podem fluir de forma diferente.

Ciro acerta ao não aceitar o papel de poste de Lula ou do Petismo. Errou ao não declarar apoio a Haddad no segundo turno. Erra novamente ao dinamitar pontes com o PT.

Quem tem responsabilidade com a formação de uma frente ampla capaz de defender o Brasil do neoliberalismo tardio, anacrônico e abutre precisa contar com todos que tenham compromisso com a nação. No momento de abrir portas, fechá-las é erro grave.

Liderança não se impõe. É processo, construção. É absolutamente artificial alguém acreditar que Lula, de Curitiba, num “canetaço”, nomeie o novo líder da oposição. É voluntarismo ingênuo acreditar que esta liderança se afirmará com auxílio da direita na negação do petismo.

Se Bolsonaro naufragar, Doria, um antipetista raiz, já está de boca aberta na fila esperando o núcleo duro dos votos do Capitão.

Não é correto imaginar que qualquer caminho para a esquerda brasileira tem que passar necessariamente pelo PT. Ao mesmo tempo é brigar com a realidade desconsiderar que os companheiros jogarão papel central, qualquer que seja o cenário.

A música do bloco precisa estar afinada, ser bem tocada, com todos os instrumentos em sintonia. Aceitar a pecha de antipetista é morder a isca dos que operam contra a sua formação.

Com muita calma e maturidade a orquestra vai avançar. A derrota foi retumbante. Falar de 2022 agora é acreditar em duendes. Serenar os ânimos e construir uma frente verdadeiramente ampla e democrática é imperativo.

*Ricardo Cappelli é jornalista e secretário de estado do Maranhão, cujo governo representa em Brasília. Foi presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes) na gestão 1997-1999.