Deputado e indigenistas refutam resposta da Ituipu sobre situação dos índios Guarani

O deputado Enio Verri (PT-PR) publicou um artigo no Blog do Esmael, no dia 19 de fevereiro, falando da situação dos índios Avá-Guarani que vem sofrendo processos de reintegração de posse movidos pela Hidrelétrica Itaipu, no Oeste do Paraná. A gigante estatal respondeu prontamente com um artigo que foi publicado no Blog no mesmo dia 19. Mas a resposta da Itaipu não satisfez o parlamentar, nem alguns especialista da área, que se uniram para para fazer um tréplica ao texto da empresa.

Vale lembrar que o presidente Bolsoanro já fez declarações depreciativas contra os índios e já se manifestou contrário às demarcações como forma de restabelecer o mínimo de dignidade e condições de vida para que esses povo possam voltar a viver em paz.

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Veja o artigo inicial do deputado Enio Verri e a resposta da Itaipu.

Abaixo a tréplica do deputado e dos especialistas na questão indígena:

Em defesa da verdade e das comunidades Guarani

Enio Verri*; Paulo Porto*; Clovis Brighenti*; Osmarina de Oliveira*

Economia

Na terça-feira (19), a Itaipu Binacional publicou uma nota oficial em resposta a um artigo do mandato do deputado federal Enio Verri (PT/PR), pelo qual o parlamentar cobrou da estatal a imediata suspensão das reintegrações de posse de áreas ocupadas da Binacional, por indígenas Guarani, no município de Santa Helena e voltasse à mesa de negociação. Em sua nota, a Itaipu, além de reforçar sua triste disposição de despejar as famílias Guarani, traz à tona diversos dados que, em defesa da verdade, necessitam ser refutados.

Inicialmente, a Itaipu afirma que o deslocamento das famílias Guarani, remanescentes das áreas inundadas pela barragem, foi “cercado de cuidados extraordinários para preservar todos os direitos dos assentados e buscando sempre o consenso, sob a orientação e supervisão da Funai e o acompanhamento de várias outras entidades, como o Conselho Indigenista Missionário (CIMI)”. Porém, a história prova que não foi isto que aconteceu.

Vale lembrar que, a mesma Itaipu está sendo citada no Relatório da Comissão da Verdade no Paraná, justamente por violar os direitos desses “assentados” Guarani. O deslocamento foi repleto de irregularidades, de laudos antropológicos não reconhecidos, não contou com o acompanhamento do CIMI e muito menos com a sua supervisão. Ao contrário, contou com sua denúncia e reprovação, como consta em todos documentos da época que se encontram à disposição de qualquer pesquisador.

A verdade é que, a urgência em desocupar as margens do rio Paraná, por conta do represamento do rio, fez com que a comunidade Guarani aceitasse o atual Ocoy, local para onde as famílias Guarani foram realocadas, em 1982, como medida paliativa. O local era provisório, tanto que, logo na sequência, as famílias passaram a reivindicar o ressarcimento das terras, inclusive ocupando o refúgio biológico Bela Vista, em 1994, como forma de pressão.

Em 1982, o Prof. Dr. Carlos Frederico Marés de Souza Filho, profundo conhecedor do direito indígena, fez um laudo demonstrando que toda a ação de titulação dos lotes na margem do rio, a desapropriação e a aquisição do Ocoy, eram nulos e, mesmo assim, foram concretizados.

Ainda em relação ao Ocoy, hoje é uma área com 250 hectares para aproximadamente 789 indígenas, o que dá uma infeliz média de 0,30 hectares por indígena. Esta distribuição territorial faz da área uma das reservas indígenas mais populosas do País, situação da qual a Itaipu não deveria se orgulhar, pois inviabiliza qualquer condição digna e razoável para a manutenção e o desenvolvimento da cultura do povo Guarani.

Em relação às áreas compradas anteriormente, como Tekoha Añetete e Tekoha Itamarã, é verdade que foram adquiridas, porém, somente após uma dura luta, de décadas, da comunidade Guarani com a direção da estatal, que incluiu denúncias no Ministério Público e ocupação de áreas.

Em relação à chamada dívida histórica territorial da Itaipu com o povo Guarani, existe um laudo técnico elaborado pelo antropólogo Rubens Tomás de Almeida, feito de encomenda pela própria estatal, o qual afirma que a Itaipu necessitaria adquirir mais dez mil hectares de área para as necessidades das atuais comunidades Guarani, remanescentes da barragem. Existem outros estudos, laudos e pesquisas independentes que apontam uma extensão muito maior em relação à chamada atual dívida territorial que a estatal mantém com o povo Guarani.

À margem das afirmações protocolares, segundo as quais, “a Itaipu aproveita a oportunidade para reafirmar o seu comprometimento com a responsabilidade social e ambiental, a sustentabilidade, os direitos humanos, a ética e a transparência, entre outros valores e condutas que estão, inclusive, expressas em sua missão, políticas e princípios”, a estatal reafirma sua disposição em despejar as comunidades Guarani de Santa Helena. As quatro comunidades Guarani ameaçadas pela estatal estão nessas áreas de proteção ambiental porque suas áreas originais estão irremediavelmente alagadas, isto é: não há para onde retornar.

Enfim, em defesa da verdade e das comunidades Guarani, reiteramos o pedido formulado pelo mandato do deputado federal Enio Verri, no sentido de que a direção da Itaipu reconheça a imensa dívida que tem com estas comunidades Guarani e trate a questão indígena não como caso de polícia, mas como uma reivindicação legítima dos verdadeiros donos desta terra. Espera-se da gigante da produção de energia que ela não se apequene em relação ao povo Guarani, afetado pela barragem. Seguimos entendendo que é fundamental tanto o reconhecimento da Itaipu de sua dívida para com os indígenas, bem como sua disposição para abrir um canal de diálogo e, se sentar à mesa de negociação para discutir o passivo histórico que a estatal tem com esse povo.

*Enio Verri – Professor de Economia (UEM/PR) e está deputado federal pelo PT/PR

*Paulo Porto – Indigenista/UNIOESTE

*Clovis Brighenti – Indigenista/UNILA

*Osmarina de Oliveira – CIMI Regional Sul