Venezuela taxa produtos do Brasil e tensão com Lula reacende: Maduro, o novo herói do bolsonarismo?

A Venezuela começou a aplicar tarifas entre 15% e 77% sobre produtos brasileiros, mesmo em operações que deveriam ser isentas pelo Acordo de Complementação Econômica nº 69 (ACE 69). A decisão pegou empresários de surpresa, paralisou exportações e provocou reações imediatas no Itamaraty e no governo de Roraima, principal afetado pela medida.

Ainda sem uma explicação formal do governo de Nicolás Maduro, o episódio acirra a tensão diplomática entre Caracas e Brasília, e desperta uma curiosa provocação: será que os bolsonaristas, fãs da taxação de Trump, agora aplaudirão a retaliação econômica de Maduro contra o Brasil?

Um retrovisor chamado 2024

A crise atual não surgiu no vácuo. Em agosto de 2024, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, com todas as letras, que não reconheceria a reeleição de Nicolás Maduro. Segundo o petista, tanto o governo quanto a oposição venezuelana falharam em apresentar provas concretas da vitória eleitoral, dada a recusa das autoridades em divulgar as atas das seções eleitorais.

“Eu não aceito nem a vitória dele, nem a da oposição. Nós estamos exigindo a prova”, declarou Lula. Ele também alertou que Maduro teria de “arcar com as consequências do gesto dele”.

Na prática, o Brasil adotou um tom duro e isolado. Enquanto os Estados Unidos e a União Europeia mantinham sanções, o governo brasileiro, mesmo sem romper totalmente, passou a pressionar pela transparência do pleito, o que irritou Caracas. A Suprema Corte venezuelana, controlada por Maduro, respondeu com repressão política e bloqueio da divulgação dos resultados eleitorais.

Taxação sem aviso: coincidência?

A partir de 17 de julho de 2025, empresas brasileiras com negócios na Venezuela começaram a relatar cobranças de tarifas mesmo com a documentação em ordem. O certificado de origem, que garante isenção para centenas de produtos, deixou de ser aceito no sistema aduaneiro local. O motivo? Ninguém sabe ao certo, mas a relação entre os fatos é evidente.

A retaliação tarifária ocorre justamente num momento em que a Venezuela reativa laços comerciais com os Estados Unidos, especialmente no setor petrolífero. Membro da Opep, o país caribenho voltou a exportar petróleo para os EUA, em acordo firmado ainda na gestão de Joe Biden após flexibilizações pontuais nas sanções. Nesse cenário, o Brasil, que manteve distância crítica da eleição, pode ter se tornado um ator descartável para os interesses estratégicos de Maduro.

Roraima sente primeiro o baque

O Estado de Roraima foi o primeiro a sentir o impacto da medida. Em 2024, a Venezuela respondeu por mais de 70% das exportações do estado, com destaque para alimentos como óleo de soja, trigo, margarina e compostos lácteos. Com a suspensão de pedidos por parte dos importadores venezuelanos, empresários locais temem demissões, queda na arrecadação e esvaziamento da cadeia logística da região.

O governador Antonio Denarium (PP) acionou o Ministério das Relações Exteriores e o MDIC, cobrando providências imediatas. A Federação das Indústrias do Estado de Roraima (Fier) também enviou ofícios à Embaixada do Brasil em Caracas e à Câmara de Comércio Venezuelana.

Maduro vira o novo Trump?

A ironia política é evidente. Os mesmos setores bolsonaristas que exaltaram a guerra comercial de Donald Trump agora se deparam com um cenário semelhante: um líder do campo anti-imperialista impõe tarifas para defender seus interesses nacionais, e o alvo, desta vez, é o Brasil.

Vão relativizar o gesto e adotar Nicolás Maduro como novo ícone do protecionismo soberanista? Ou denunciarão a medida como ataque à soberania nacional? A contradição, por ora, permanece escancarada.

Governo Lula recorre à diplomacia

Enquanto isso, o governo federal ainda aposta na diplomacia. Em nota oficial, o Itamaraty informou que a embaixada em Caracas está em contato com autoridades venezuelanas “para esclarecer a natureza da situação e normalizar o fluxo comercial”. O MDIC, por sua vez, afirmou que recebeu os relatos de empresários e monitora o impacto setorial da paralisação.

No entanto, o silêncio de Maduro e a opacidade institucional do regime bolivariano alimentam a desconfiança. Em meio à indefinição, a medida tarifária já começa a reconfigurar o comércio na fronteira Norte, com possibilidade de redirecionamento de cargas e colapso de contratos firmados.

Um conflito com múltiplas camadas

A tensão entre Brasil e Venezuela é, ao mesmo tempo, comercial, diplomática e política. O país de Maduro testa os limites do pragmatismo de Lula, reage à perda de reconhecimento internacional e reposiciona suas alianças com os olhos voltados para o petróleo, não para a solidariedade ideológica.

Enquanto isso, empresários e trabalhadores brasileiros pagam a conta.

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