O canadense “não está à venda”, mas Trump diz: “Nunca diga nunca”
Na manhã desta terça-feira, 6 de maio de 2025, o mundo assistiu, boquiaberto, a mais um espetáculo da diplomacia performática de Donald Trump. Em seu retorno à Casa Branca, o presidente americano decidiu começar com o pé direito — ou seria com a mão no alheio?
Durante sua primeira reunião com o recém-eleito primeiro-ministro do Canadá, Mark Carney, no Salão Oval, Trump sugeriu que o país vizinho poderia, quem sabe, se tornar o 51º estado americano. Carney respondeu com elegância:
“O Canadá não está à venda. Nunca estará.”
Trump, no entanto, não deixou barato:
“Nunca diga nunca. Já consegui muitas coisas improváveis. Tudo pode acontecer, se for amigável.”
O episódio pitoresco, que poderia passar por roteiro de série de humor político, revela a face simbólica e agressiva do novo mandato do republicano. A tentativa de anexação — verbal, claro — reacende temores sobre a imprevisibilidade trumpista.
A frase “nunca estará à venda” ecoa como resposta institucional de um país soberano a um presidente que parece confundir geopolítica com mercado imobiliário. Trump chegou a comparar o Canadá com o Palácio de Buckingham, sugerindo que há “lugares que nunca estão à venda, mas com tempo, tudo muda”.
Carney, ex-presidente do Banco da Inglaterra e figura respeitada nos círculos econômicos globais, usou o humor britânico para contornar a provocação, mas não deixou de frisar: o futuro das relações bilaterais está na parceria — e não na dominação.
Não é de somenos o boicote a produtos americanos, a exemplo de sucos de laranja, em retaliação à tentativa de anexação e transformar o Cananá no 51º estado dos Estados Unidos. Aliás, a eleição do próprio Carney é resultado desta violência de Trump.
Ao mesmo tempo em que flertava com a anexação do Canadá, Trump travava a diplomacia comercial com a China. O secretário do Tesouro, Scott Bessent, confirmou que as negociações com Pequim sequer começaram, apesar das tarifas de 145% sobre produtos chineses.
A primeira vítima do protecionismo? As crianças americanas.
A Mattel, fabricante da Barbie, anunciou aumento nos preços e suspensão das projeções financeiras para 2025, citando as tarifas de Trump. Outras empresas, como General Motors e UPS, seguiram o mesmo caminho.
“Talvez as crianças tenham duas bonecas em vez de 30”, ironizou Trump, em tom que não caiu bem nem no mercado nem entre os pais.
Com mais de 80% dos brinquedos vendidos nos EUA produzidos na China, a perspectiva de escassez e inflação antes do Natal já é discutida seriamente por associações de fabricantes.
No Congresso, Scott Bessent tentou defender as tarifas como forma de “equilibrar o comércio” e “trazer de volta empregos bem remunerados para a indústria americana”. Mas os próprios dados contradizem a retórica: o investimento em manufatura nos EUA caiu desde julho de 2024 e não há previsão de retomada.
A estratégia é clara: Trump busca retomar sua marca registrada — o “America First” [América Primeiro, em português] —, mas em um contexto ainda mais polarizado e com menos aliados dispostos a jogar o mesmo jogo.
Nem o USMCA, acordo firmado com México e Canadá na gestão anterior, escapou das críticas. Trump chamou-o de “passo de transição”, sugerindo que pode ser enterrado a qualquer momento.
Com China e Canadá na mira, Trump sinaliza que seu segundo mandato não terá filtros diplomáticos. O tom beligerante se mistura a tentativas de aliança, sempre com uma pitada de imprevisibilidade.
O que começou como uma reunião cordial, virou manchete mundial e alimenta teorias conspiratórias sobre intenções expansionistas dos EUA. Enquanto isso, os mercados tremem, as tarifas sobem e os brinquedos ficam mais caros.
Se o Canadá não está à venda, o que exatamente está no cardápio de Donald Trump?
O trumpismo ressurge mais confiante, agressivo e desconectado da realidade multilateral. O episódio com Mark Carney escancara que o mundo precisará, mais uma vez, aprender a lidar com um presidente que transforma qualquer diálogo em performance — e qualquer vizinho em oportunidade de negócio.
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Jornalista e Advogado. Especialista em política nacional e bastidores do poder. Desde 2009 é autor do Blog do Esmael.