Globo x Band: grupos de comunicação trocam acusações no Paraná

O site “Portal Paraná“, pertencente ao grupo Band no Paraná, abriu a caixa de ferramentas contra a RPCTV/Gazeta do Povo –conglomerado de comunicação que fala em nome da TV Globo no Paraná. Em um forte editorial na página eletrônica ligada à sua holding, o bilionário Joel Malucelli expôs as vísceras da afiliada global na terra das araucárias.

Na opinião do dono da Band, “o jornalismo desse grupo [Globo/Gazeta do Povo] tornou-se apelativo, recorrendo sistematicamente a manchetes escandalosas” e “mais de 400 ações de primeira e segunda instância em tramitação na Justiça do Trabalho” justificaria esse desespero.

O forte editorial se explica, em parte, pelo vazamento da suposta delação premiada feita por Malucelli no Ministério Público no âmbito da Operação Rádio Patrulha. “Está mais para o tradicional “malho” para sobrevivência”, diz o texto, sustentando que o grupo Globo/Gazeta do Povo está quebrado e que as empresas são uma “carruagem sem cocheiro”.

“Nesta carruagem sem cocheiro, o grupo empresarial tenta acomodar e administrar um imenso prejuízo, como é o caso da Gazeta do Povo, em que o passivo ultrapassou R$ 190 milhões depois de um erro na curva, em que o jornal impresso foi fechado para que a empresa se aventurasse, sem suficiente conhecimento, na mídia digital”, afirma o editorial do “Portal Paraná”, de Malucelli.

“Mas por trás dessa guerra de patrões, na qual os funcionários sempre são as maiores vítimas, há outros motivos”, escreveu em seu perfil do Facebook o jornalista e professor Valdir Cruz, com passagem em vários veículos de comunicação na capital paranaense, inclusive na TV Bandeirantes.

“A dúvida é: o que que levou dois dos principais empresários de comunicação do Paraná a trocarem bordoadas em público? Seriam interesses lícitos ou ilícitos? Seriam comerciais, políticos ou, ambos decadentes, tentando mostrar à sociedade a musculatura que sumiu depois que os dois lados deixaram de fazer diariamente o exercício do bom e fortificante jornalismo?”, questionou o atento jornalista.

Economia

Leia a íntegra do editorial do “Paraná Portal”, site do empresário Joel Malucelli:

O fim melancólico da Gazeta do Povo

Editorial – Paraná Portal

4 de agosto de 2021, 14:18

É conhecida a máxima de que a imprensa é o oxigênio da democracia, mas hoje notamos, cada vez mais, um certo desencanto com o jornalismo e até mesmo revolta, com gente agredindo e jogando pedras em repórteres nas ruas, em situações extremas.

Alguma coisa está errada. E o erro certamente está nas mãos daqueles que dirigem os veículos de comunicação, pois perderam o controle ou o compromisso com a qualidade informativa.

É preciso resgatar a objetividade do jornalismo. A imprensa tem o dever de apresentar fatos e dizer coisas que podem até não agradar os leitores, os políticos ou membros do sistema judiciário. Mas deve fazê-lo com responsabilidade.

O abandono desses valores, o descaso com padrões minimamente éticos e com a qualidade no tratamento da informação têm produzido a queda de impérios do jornalismo no país.

O Paraná observa, por semelhante, o declínio, em velocidade surpreendente, de um grupo de comunicação social que por dezenas de anos foi visto como porta-voz da sua sociedade: o jornal Gazeta do Povo e a Rede Paranaense de Comunicação (RPC), com televisões e emissoras de rádio espalhadas por todo o estado.

É um desfecho melancólico, porém previsível, numa sociedade cada vez menos ingênua, mais bem informada – por variadas fontes de notícia – e mais conectada. Uma decepção para a sociedade paranaense, que acompanha o visível desmoronamento de um império que levou um século para ser construído e nada deixa no lugar.

Na luta desesperada pela sobrevivência, acumulando enormes passivos financeiros e judiciais nos últimos anos, o jornalismo desse grupo tornou-se apelativo, recorrendo sistematicamente a manchetes escandalosas, a argumentos rasos e delirantes e à exposição de fatos recortados de tal forma que acabam por disseminar o discurso do ódio, a maledicência e a desconstrução de pessoas, empresas e famílias, sem lhes dar espaço adequado para resposta.

O rebaixamento do padrão moral, somado a um cenário de crise financeira e a uma biografia esfacelada, levam o grupo de comunicação à iminência de se tornar, ele próprio, notícia nas páginas policiais.

São, hoje, mais de 400 ações de primeira e segunda instância em tramitação na Justiça do Trabalho, segundo certidão recente, que mostram um caminho sem volta e que deve resultar em um desembolso estimado em dezenas de milhões de reais.

Empresas associadas no interior do Estado estão derretendo ou passando às mãos de sócios que apostaram no negócio e agora estão vendo seu dinheiro literalmente virar pó.

Ações como da TV Oeste Paraná (Globo Cascavel) estão bloqueadas. Na TV Cultura (Globo Maringá) há registro de bens arrolados pela Receita Federal para garantia do pagamento de débitos fiscais.

Nesta carruagem sem cocheiro, o grupo empresarial tenta acomodar e administrar um imenso prejuízo, como é o caso da Gazeta do Povo, em que o passivo ultrapassou R$ 190 milhões depois de um erro na curva, em que o jornal impresso foi fechado para que a empresa se aventurasse, sem suficiente conhecimento, na mídia digital.

Diante dessa sucessão de reveses e prejuízos, um dos sócios vendeu suas ações por apenas R$ 1 para deixar de arcar com as volumosas somas negativas mensais e anuais.

Tais prejuízos levaram à demissão de centenas de pessoas, muitas delas competentes, mas alheias à incompetência administrativa que as levou ao olho da rua.

Antes do atual estágio crítico, o grupo envolveu-se noutras aventuras igualmente arriscadas, como o jornal tabloide – Primeira Hora – que absorveu velhos jornalistas vindos de São Paulo para se aposentarem no Paraná.

O grupo também se aventurou com a televisão OTV e fechou as portas. Mais tarde, para concorrer com a Folha de Londrina, lançou o Jornal de Londrina e deu no que deu: o veículo acabou e contabilizou mais prejuízos.

Mais recentemente, um comunicado da direção da empresa aos proprietários de bancas de revistas de jornais da capital anunciava o fechamento da revista semanal Gazeta do Povo. Abriu outra que até agora ninguém entendeu qual a linha editorial. Está mais para o tradicional “malho” para sobrevivência.

A empresa também fechou parte do complexo de comunicação no Tarumã, em Curitiba, onde funcionava a redação da Gazeta do Povo e da revista, optando pelos trabalhos em home office, o que sinaliza para a demissão, em curto prazo de tempo, de mais jornalistas e mais prejuízos em equipamentos de informática.

Para tentar pelo menos uma saída honrosa, as quatro rádios do grupo estariam à venda, bem como todo o grupo RPCOM, que foi oferecido a dois empresários paranaenses por R$ 900 milhões.

Depois de minuciosas análises, os potenciais interessados chegaram à conclusão de que, no máximo, o grupo poderia valer R$ 400 milhões e refugaram da compra, que seria intermediada por um conhecido publicitário de Curitiba.

Se o grupo RPC Gazeta do Povo se nega a cumprir o básico de suas obrigações financeiras e legais, coloca-se em frontal oposição aos princípios que alardeia identificá-lo.

O jornalismo “de resultados”, pautado na exposição escandalosa de alguns ‘fatos’ supostamente investigados, tenta tirar água da pedra para manter a audiência. Mas o resultado é, claramente, pífio.

Nesta semana, por exemplo, estamparam reportagem na capa, com direito a show pirotécnico sem ouvir o “outro lado”, como reza a cartilha básica do jornalismo em qualquer lugar.

A notícia e a opinião, para a RPC e a Gazeta do Povo, têm sido avaliadas pela ótica de seus próprios negócios, o que é lamentável. Disso poderá constatar ser veraz qualquer investigação séria do Ministério Público.

Matérias utilizadas como ferramentas para a instabilidade, a hostilidade ou pura e simples vendeta prestam um desserviço aos nobres propósitos da imprensa e, no limite, à própria liberdade de expressão, pois a seletividade na exposição dos fatos, em prejuízo da verdade, constitui negação da própria razão de existir do jornalismo.

Empresários e políticos paranaenses que estiveram sentados à mesa com o saudoso Francisco da Cunha Pereira Filho, em discussões de temas voltados à defesa das camadas mais necessitadas e de investimentos no Estado, hoje são massacrados pelas tintas e palavras dúbias.

Enfim, testemunhamos hoje um momento histórico: o ocaso de um grupo de comunicação que perdeu a identidade, não passa de uma pálida sombra do que já foi.

O custo do descompromisso com a tradição e história é alto, o gosto é amargo, mas ao que parece a conta chegou. E o preço é alto.