Gleisi vê “bis in idem” na instalação da CPMI do INSS

A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, não foi ao funeral do ex-presidente uruguaio Pepe Mujica para tratar de uma crise em ebulição no Congresso: a instalação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS. Em reunião com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), Gleisi ouviu que não há como impedir a abertura da comissão — no máximo, postergá-la.

A próxima sessão conjunta do Congresso está prevista para 27 de maio. E é nela que o requerimento deve ser lido, o que formalizaria a criação da CPMI. Embora Alcolumbre tenha sinalizado a aliados, nos últimos dias, que poderia evitar a leitura, ele agora admite que a única manobra possível seria o adiamento.

Nos bastidores do Planalto, há a leitura de que a CPMI reproduz algo já investigado pela Polícia Federal, com suporte da Advocacia-Geral da União (AGU) e da Controladoria-Geral da União (CGU). Por isso, Gleisi levantou o alerta de que a comissão poderia configurar um caso clássico de “bis in idem” — ou seja, a repetição de investigações sobre os mesmos fatos e com os mesmos alvos, mas com um fim político e midiático.

O governo teme que a CPMI acabe comprometendo as apurações em curso ao vazar documentos sigilosos ou distorcer informações já produzidas por autoridades competentes. A leitura no núcleo duro petista é de que a comissão seria usada para produzir manchetes e ruído político — e não necessariamente justiça.

A tese do “bis in idem” foi reforçada com a ida do ministro da Previdência, Wolney Queiroz, ao Senado nesta quinta-feira (16). Ele reiterou que não se opõe à comissão, mas lembrou que o governo já tomou todas as providências legais e institucionais para apurar as fraudes no INSS. Para Queiroz, a CPI pode até existir, desde que o foco não se perca em disputas eleitorais antecipadas.

Ainda assim, entre os próprios parlamentares da base há divisões.

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O líder do PT no Senado, Rogério Carvalho (SE), declarou durante a audiência com Wolney Queiroz que defenderá o apoio à criação da CPMI. Fabiano Contarato (PT-ES) foi além: chegou a revisar o requerimento de instalação, num movimento que pegou o Planalto de surpresa.

Para esses senadores, deixar de apoiar a CPMI pode soar como omissão ou temor por parte do governo. A leitura é pragmática: se a comissão for inevitável, que o governo assuma o comando — com presidência, vice e relatoria — e dite o ritmo das investigações.

A composição da CPMI respeita o tamanho das bancadas. Isso, na prática, garante maioria à base de Lula. Um senador petista confidenciou:

“A oposição está começando a ficar insegura. Essa CPMI tem muito mais a revelar sobre eles do que sobre nós.”

No centro do tabuleiro, Gleisi tenta evitar que o Congresso vire um palco de duelos vazios. Sua aposta é na racionalidade jurídica e na preservação das instituições. Mas a política, como se sabe, nem sempre respeita os limites do Direito.

A narrativa de “bis in idem” pode ter peso simbólico. Mas, se a CPMI vingar, o Planalto terá que decidir entre resistir ou assumir o protagonismo e transformar o palco em trincheira.

O que é “bis in idem” e como ele se aplica à CPMI do INSS

O princípio jurídico do bis in idem — expressão em latim que significa “duas vezes sobre o mesmo” — estabelece que ninguém pode ser processado ou punido mais de uma vez pelos mesmos fatos. Trata-se de uma garantia essencial do Estado de Direito, ligada à proibição de punições duplicadas, investigações paralelas e ao devido processo legal.

No campo penal, impede que um cidadão seja julgado duas vezes pelo mesmo crime. No campo administrativo, evita sanções repetidas sobre o mesmo ato. E no campo político, o conceito se aplica quando há tentativas de instaurar comissões ou apurações legislativas que apenas replicam investigações já em andamento por autoridades competentes.

É exatamente esse o argumento apresentado por Gleisi Hoffmann, ministra da Secretaria de Relações Institucionais, ao tratar da CPMI do INSS com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre.

Segundo Gleisi, a abertura da CPMI poderia configurar “bis in idem” político-jurídico, pois os fatos que motivaram o pedido da comissão — os descontos indevidos em aposentadorias e pensõesjá estão sendo apurados pela Polícia Federal, pela CGU e pela AGU, sob iniciativa do próprio governo federal. Ou seja, já existe um processo formal de investigação em curso, com amparo institucional e transparência.

Para o Planalto, a criação de uma CPMI para apurar os mesmos fatos não acrescentaria nada de novo ao processo investigativo, podendo inclusive atrapalhá-lo, ao permitir a exposição pública de dados sigilosos, politização de provas e a criação de narrativas paralelas — o verdadeiro risco de “bis in idem” com viés político.

Nesse contexto, o argumento do “bis in idem” atua como uma linha de defesa do governo: busca preservar a racionalidade institucional, proteger a eficácia das investigações oficiais e evitar que o Congresso transforme um tema técnico e jurídico em palanque político-eleitoral.

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