“Lula-lá” é apontado como jingle político mais perfeito

Candidatos tentam fugir de fórmula surrada nos jingles

da Folha de S. Paulo

Não que eles estejam revolucionando a música popular brasileira. Mas basta ligar o rádio durante o horário da propaganda política para notar que, neste ano, alguns dos candidatos à  Prefeitura de São Paulo saíram à  procura de caminhos estéticos diferentes para o já tão desgastado formato dos jingles.

O bom jingle, dizem os publicitários, deve ser simples, objetivo e facilmente decorável. E precisa traduzir de maneira concisa a proposta política do candidato.

“De tão direto, o conteúdo do jingle tem que ser quase burro”, diz o publicitário e produtor musical PC Bernardes, presidente da agência África Rio e responsável, em eleições passadas, por campanhas de FHC e José Serra, entre outros.

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“Não pode ser um pastel de vento completo, mas não precisa ser lindo: ninguém vota porque gostou do jingle.”

Os clássicos do gênero -como o “varre, varre, vassourinha”, de Jânio Quadros, ou o “bote fé no velhinho, que o velhinho é demais”, de Ulysses Guimarães- seguiam à  risca essas regras.

Mas o que dizer dos jingles atuais de Celso Russomanno (PRB), José Serra (PSDB), Fernando Haddad (PT) e Gabriel Chalita (PMDB)?

Serra foi buscar em um hit da novela das nove, “Avenida Brasil”, o tema para sua campanha. Adaptou a letra de “Eu Quero Tchu, Eu Quero Tchá”, sucesso da dupla João Lucas & Marcelo que embala as cenas do popular bairro do Divino na trama global.

Luiz González, responsável pela campanha de Serra, diz que o candidato não foi consultado para a escolha.

“O Serra foi esperto em usar a música. Agregou muita gente nossa para votar nele”, afirma João Lucas, cantor da versão original.

“Rapaz, o que tem de vereador usando a música por esse Brasil! Em algumas cidades, tem até candidatos de partidos opostos usando ela.”

O jingle de Chalita buscou referências na integração entre campo e cidade, evocando o rock rural ao estilo da dupla Sá & Guarabyra.

“Rock rural genérico”, rebate Sá. “Peca pelo excesso de informação e pela fórmula ‘country’ meio batida. Ele demora a chegar no refrão. No geral, não gostei.”

Haddad é o dono do jingle mais ousado. Tem letra longa e até naipe de cordas.

Autor do tema, o pernambucano João Andrade conta que usou três músicas como referências principais. A batida do violão veio de “Eduardo e Mônica”, da Legião Urbana. O refrão, “para as pessoas baterem palmas junto”, saiu de “Give Peace a Chance”, de John Lennon. E os trechos discursivos foram pescados na obra de Tom Zé.

“Rapaz, esse João Andrade botou para quebrar”, diz Tom Zé. “O jingle é bem transado, a ideia de enumerar os bairros é boa. Se parece com minha música? Pode ser que o compositor tenha se inspirado naquele concreto de ‘São São Paulo Meu Amor’.”

Dos quatro candidatos, o único que manteve a fórmula antiga foi Russomanno.

Ricardo Bérgamo, marketeiro do candidato do PRB e autor da letra, diz que a construção de um jingle tem que repisar o que o candidato quer comunicar. “Fiz um que marcasse bem o número dez, para colar e não ter como esquecer na hora do voto.”

Segundo o cantor Nando Reis, que, a pedido da Folha, ouviu os jingles, a artificialidade está oficializada nas campanhas.

“Os candidatos sabem que dependem da propaganda e não têm escrúpulos de usar qualquer truque para ter um gancho”, diz. “A autenticidade e a representação da personalidade do candidato, que deveriam ser o gancho forte da campanha, passam a ser chocantemente falsos.”

Todos os marqueteiros ouvidos pela reportagem apontam o “Lula-lá” como o jingle político perfeito. Guilherme Arantes, outro “hitmaker” indiscutível, discorda.

“O melhor jingle da história foi uma canção linda, singela, verdadeira, bem escolhida pelo próprio Juscelino”, diz, recordando “Peixe Vivo”, de Craveiro e Cravinho, que era a canção favorita de JK e foi usada como tema de campanha. “Quando é que teremos algo parecido?”

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