PEC 186 atraso e pobreza, por Enio Verri

Enio Verri*

A emergência da PEC 186, que será votada hoje, serve para atender determinação do mercado financeiro de reduzir o tamanho do Estado. A aprovação acarretará na supressão de direitos da classe trabalhadora e na venda do patrimônio nacional, conquistados com muito esforço. Desde 2016, as reformas da Previdência e as trabalhistas tiraram dos assalariados a perspectiva de aposentadoria e precarizaram profundamente as condições de trabalho. Já as empresas que Bolsonaro vai entregar, a preço de banana, são ferramentas sem as quais o Brasil não apenas vai retardar a superação das crises sanitária e econômica, mas abandonar a possibilidade de ser um país soberano e os brasileiros perderão, de vez, o princípio da autodetermina dos povos.

Para esse retrocesso legal e social e o desmantelamento das competências do Brasil, Bolsonaro oferece a cerca de 70 milhões de brasileiros, que estão sem uma renda mínima, há mais de 60 dias, um auxílio emergencial que vai variar entre R$ 175 e R$ 375, por quatro meses. Não chega a ser espantoso, mas a medida é mais uma declaração de ódio ao país. Não há razão para a PEC. Diferentemente do que diz o ministro da Economia do mercado financeiro e do desenvolvimento de outros países, Paulo Guedes, as contas não estão descontroladas. A a famigerada EC-95, imposta por Temer, já congelou a capacidade do país investir no seu desenvolvimento, por 20 anos.

Historicamente, o Estado é quem induz o desenvolvimento de um país. O Brasil tem grandes, modernas, competitivas e lucrativas ferramentas para esse propósito. Assim como a Alemanha, a China, a Coreia do Sul, o Brasil tem um grande banco de desenvolvimento, o BNDES. E os brasileiros ainda têm o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal. O primeiro oferece crédito ao microempresário ao mesmo que aumenta as divisas brasileiros com prestação de serviços no exterior. Já o BB é fundamental para o financiamento agropecuário, tanto do pequeno quanto do grande produtor. A Caixa, durante os governos do Partido dos Trabalhadores, esteve à frente do maior programa de transferência de riqueza da história do Brasil, o Minha Casa Minha Vida.

Quando Bolsonaro entregar esses bancos ao sistema financeiro privado, os empresários perceberão que será impossível investir no desenvolvimento da empresa, os produtores da agropecuária, desde a agricultura familiar ao agronegócio, não terão mais acesso a crédito subsidiado e o financiamento da casa própria num país com um déficit habitacional de 8 milhões de casas se tornará impossível aos pobres. Aliás, isso já vem acontecendo, Bolsonaro excluiu do programa as famílias com renda mensal de R$ 0,00 a R$ 1,800. Na história do Brasil, não se tem notícia de um banco privado que tenha investido num programa minimamente parecido.

O que faz o governo é empobrecer e atrasar o país de um modo geral. Ao congelar salários e impedir a progressão na carreira, por exemplo, reduzirá a massa salarial e a qualidade do serviço vai despencar, uma vez que cessaram os incentivos de ascensão profissional. Em consequência, diminuirá o consumo, pois os salários não serão reajustados, mas os preços dos produtos, sim. Os Chicago Boys do Ministério da Economia incluíram na PEC um dispositivo para justificar e legitimar a privatização das empresas. Chama-se gatilho, que será acionado a cada vez que as despesas obrigatórias alcançarem 95% das receitas. Ou seja, toda vez que atingir esse índice, e vai atingir, vende-se a Petrobras, a Eletrobras, os Correios, a Casa da Moeda, os bancos públicos.

Economia

Para cada R$ 1,00 investido no Bolsa Família, R$ 1,78 contribui para o PIB. Da mesma forma, a cada R$ 1,00 investido nas universidades, retornam para a sociedade mais de R$ 3,00. Ora, se o Brasil está impedido de investir nele mesmo, não poderá investir em educação e desenvolvimento tecnológico. Atraso e pobreza são as pautas impostas a Bolsonaro pela classe dominante mais atrasada do mundo, a brasileira. É contra um modelo de Estado atrasado, brejeiro e excludente que lutamos. Bolsonaro e Paulo Guedes têm apoio no Congresso Nacional, que é formado majoritariamente de parlamentares liberais, embora a maioria não saiba o que seja isso.

No Plenário da Câmara dos Deputados, discurso bonito e cheio de argumentos irrefutáveis não vencem. A esquerda não é maioria, não tem os votos necessários para barrar mais esse golpe. Somente a participação social, de todos os segmentos produtivos e de instituições progressistas e internacionalistas pode impedir a aprovação da PEC 186. Fazem-se necessárias organização e mobilização para pressionar, em conjunto, por meio dos acessos aos gabinetes dos deputados. Uníssona, a classe trabalhadora deve reafirmar a eles os danos da proposta ao Brasil e aos brasileiros e alertá-los dos prejuízos eleitorais vindouros. Sem pressão não há salvação.

*Enio Verri é economista e professor aposentado do Departamento de Economia da Universidade Estadual de Maringá (UEM) e está deputado federal pelo Partido dos Trabalhadores do Paraná.