Brasil, o Chile manda lembranças…

Nesta terça-feira (22), o Senado aprovou por 60 votos a 19, a reforma da Previdência, uma medida que enterra o direito à aposentadoria de milhões de brasileiros, principalmente a camada mais pobre de trabalhadores da cidade e do campo. A criminosa decisão acontece no momento em que o Chile é sacudido por uma devastadora convulsão social.

Por Milton Alves*

A convulsão social que sacode o Chile é o resultado direto da aplicação do modelo de política econômica neoliberal, que mostra sinais de esgotamento em todo o continente latino-americano.

O país enfrenta a maior e mais profunda crise social desde o fim da ditadura de Augusto Pinochet. A explosão social detonada pelo aumento da tarifa do metrô colocou em evidência a revolta, o ressentimento social e o desespero das massas chilenas com as décadas de arrocho neoliberal, de precarização dos serviços públicos, do criminoso modelo de fundo de pensões privadas e do encarecimento do custo de vida. Além da mercantilização sem precedentes dos direitos sociais, iniciado com o golpe militar contra o governo da Unidade Popular do presidente Salvador Allende, em setembro de 1973.

A resposta do governo criminoso e antissocial de Sebastián Piñera, um antigo apoiador da ditadura pinochetista, foi desatar uma brutal onda repressiva. Um “banho de sangue” que já deixou quinze mortos, cerca de cem feridos e a prisão de mais de duas mil pessoas. Além disso, Piñera promoveu um verdadeiro “autogolpe” com a decretação de um estado de emergência e a convocação do Exército e dos Carabineiros para reprimir de forma brutal a revolta popular.

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O modelo chileno, cantado em verso e prosa como o mais bem-sucedido na aplicação do modelo neoliberal, naufragou com alto custo social e jogou o país nas bordas de um regime de força. Piñera perdeu a legitimidade e não tem mais condições de seguir governando o Chile.

Diante da explosão social e do desespero da população, é preciso encontrar uma saída política, um novo pacto das forças políticas democráticas e populares para reformar a economia e as instituições de estado, ainda com amarras herdadas da ditadura. A primeira demanda é a revogação imediata do Estado de Emergência e devolver os militares a seus quartéis e bivaques, de onde nunca deveriam ter saído.

“Somente revogado o Estado de Emergência, haverá condições que permitam iniciar de maneira real, um diálogo social e político, com organizações representativas dos trabalhadores e movimentos sociais, que dê resposta às demandas que têm gerado este estado de indignação social”, advertiu a Central Unitária dos Trabalhadores (CUT) do Chile.

A greve geral convocada pela CUT e os movimentos sociais para esta quarta-feira (23) abre a possibilidade de canalizar a explosão social para uma saída positiva da crise, encontrando os meios e as formas para susbstituir o governo neoliberal de Piñera e, ao mesmo tempo, garantir um rol de exigências iniciais de demandas da população. A mobilização organizada dos trabalhadores é o caminho menos custoso socialmente e breca o “banho de sangue” da repressão militar e a ditadura de fato em curso.

Talvez a crise chilena aponte lições para os arautos do neoliberalismo e também para a esquerda no Brasil, demasiadamente institucionalizada e com pouca iniciativa junto ao povo. A paciente impaciência das gentes de baixo em algum momento irrompe arrastando tudo pela frente, não só os tiranetes de turno, leva junto também os conciliadores.

Brasil, o Chile manda lembranças…

*Milton Alves é ativista social e militante do PT de Curitiba. Autor do livro ‘A Política Além da Notícia e a Guerra Declarada contra Lula e o PT’.