Projeto de Lei quer punir “terroristas” e grevistas na Copa

por Andrea Dip, via Agência Pública

à‰ a ditadura transitória da FIFA! diz presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP, sobre projeto que corre no Senado. Foto: Daniel Kfouri.
Enquanto as atenções estão voltadas para o projeto de Lei Geral da Copa (2.330/11) que deve ser votado na Câmara na próxima terça-feira (28), os senadores Marcelo Crivella (PRB-RJ), Ana Amélia (PP-RS) e Walter Pinheiro (PTB-BA) correm com outro Projeto de Lei no Senado, conhecido pelos movimentos sociais como AI-5 da Copa! por, dentre outras coisas, proibir greves durante o período dos jogos e incluir o terrorismo! no rol de crimes com punições duras e penas altas para quem provocar terror ou pânico generalizado!.

O PL 728/2011, apresentado no Senado em dezembro de 2011, ainda aguarda voto do relator àlvaro Dias (PSDB-PR) na Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado. Se for aprovado, vai criar oito novos tipos penais que não constam do nosso Código Penal como terrorismo!, violação de sistema de informática! e revenda ilegal de ingressos!, determinando penas específicas para eles. Essa lei !“ transitória !“ valeria apenas durante os jogos da FIFA.

Na justificativa da proposta, os senadores alegam que a Lei Geral da Copa deixa de fora a tipificação de uma série de delitos, necessária para garantir a segurança durante os jogos!.

O projeto prevê ainda que quem cometer crimes contra a integridade da delegação, árbitros, voluntários ou autoridades públicas esportivas com o fim de intimidar ou influenciar o resultado da partida de futebol poderá pegar entre dois e cinco anos de prisão!.

Para quem violar, bloquear ou dificultar o acesso a páginas da internet, sistema de informática ou banco de dados utilizado pela organização dos eventos! a pena seria de um a quatro anos de prisão, além de multa. E para deixar a aplicação das penas ainda mais eficaz, o projeto prevê a instauração de um incidente de celeridade processual! (art. 15), um regime de urgência em que a comunicação do delito poderia se dar por mensagem eletrônica ou ligação telefônica e funcionaria também nos finais de semana e feriados.

Economia

O presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB de São Paulo Martim Sampaio considera o projeto um atentado contra o Estado Democrático de Direito!. à‰ um projeto de lei absurdo que quer sobrepor os interesses de mercado à  soberania popular. Uma lei para proteger a FIFA e não os cidadãos e que, além de tudo, abre precedentes para injustiças por suas definições vagas!, diz o advogado.

Para Thiago Hoshino, assessor jurídico da organização de direitos humanos Terra de Direitos e integrante do Comitê Popular da Copa de Curitiba, a questão é ainda mais complicada. Ele acredita que a junção de tantos assuntos em um mesmo projeto é uma tentativa de aprovar leis antigas que endurecem principalmente a legislação penal: à‰ um bloco perigoso que viola garantias básicas da Constituição. E há sempre o risco de estas leis transitórias se tornarem permanentes. A legislação da Copa é, na verdade, um grande laboratório de inovações jurídicas. Depois o que for proveitoso pode permanecer. à‰ mais fácil tornar uma lei transitória permanente do que criar e aprovar uma nova! explica.

Terrorismo

O que chama a atenção logo de cara no projeto de lei é a tipificação de terrorismo!, que até hoje não existe no nosso código penal. No PL, ele é definido como o ato de provocar terror ou pânico generalizado mediante ofensa à  integridade física ou privação da liberdade de pessoa, por motivo ideológico, religioso, político ou de preconceito racial, étnico ou xenófobo! com pena de no mínimo 15 e no máximo 30 anos de reclusão. Martim Sampaio diz que este é o artigo mais perigoso por não dar definições exatas sobre o termo: Da maneira como está na lei, qualquer manifestação, passeata, protesto, ato individual ou coletivo pode ser entendido como terrorismo. Isso é um cheque em branco na mão da FIFA e do Estado!.

Documentos revelados pelo WikiLeaks revelaram a pressão americana para que o Brasil criasse uma lei para o terrorismo!, principalmente para assegurar os megaeventos. No relatório de Lisa Kubiske, conselheira da Embaixada americana em Brasília, enviado para os EUA em 24 de dezembro de 2010, a diplomata mostra-se preocupada com as declarações de Vera Alvarez, chefe da Coordenação-Geral de Intercâmbio e Cooperação Esportiva do Itamaraty porque a brasileira admite que terroristas podem atacar o Brasil por conta das Olimpíadas, uma declaração pouco comum de um governo que acredita que não haja terrorismo no País!.

Os banqueiros também pressionam o Estado a criar uma lei antiterrorismo há algum tempo. Também em 2010, a falta de uma legislação específica sobre terrorismo foi o principal foco em um congresso sobre lavagem de dinheiro e financiamento de grupos extremistas organizado pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), em São Paulo. A questão poderia custar ao Brasil a exclusão do Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi), órgão multinacional que atua na prevenção desses crimes.

Greves

O projeto de lei também mira reduzir o direito à  greve, prevendo a ampliação dos serviços essenciais à  população durante a Copa !“ como a manutenção de portos e aeroportos, serviços de hotelaria e vigilância !“ e restringe a legalidade da greve de trabalhadores destes setores, incluindo os que trabalham nas obras da Copa, de três meses antes dos eventos até o fim dos jogos. Se aprovado, os sindicatos que decidirem fazer uma paralisação terão de avisar com 15 dias de antecedência e manter ao menos 70% dos trabalhadores em atividade. O governo ainda estará autorizado a contratar trabalhadores substitutos para manter o atendimento, o que é proibido pela lei 7.283/1989 em vigor no país, que estabelece 72 horas de antecedência para o aviso de greve e não determina um percentual mínimo de empregados em atividade durante as paralisações.

Eli Alves, presidente da Comissão de Direito Trabalhista da OAB-SP, lembra que o direito à  greve também é garantido na Constituição Federal e diz que a sensação que fica é a de que o Brasil está sendo alugado para a FIFA, flexibilizando suas próprias regras para fazer a Copa no país!. Martim Sampaio lembra que as greves foram proibidas durante a ditadura militar: A gente conquistou este direito com o fim da ditadura, muitas vidas foram perdidas neste processo. Não é possível que agora criemos uma ditadura transitória da FIFA!. E convoca: O único jeito de não deixar esta lei ser aprovada é por pressão popular. A gente tem bons exemplos de que isso funciona como a da lei da ficha limpa. à‰ preciso conquistar a democracia todos os dias!.

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