Rede Globo deve pedir perdão ao povo brasileiro

O escritor Milton Alves questiona a Globo: Será que vai demorar quarenta anos para reconhecer o novo erro?

Para o ativista social, ao analisar o artigo de Ascânio Seleme, no Globo, disse que a Rede Globo foi a patrocinadora de violenta campanha de ódio contra o PT e Dilma Rousseff –uma governante eleita de forma legítima.

“A Globo deve mais um pedido de perdão ao povo brasileiro. Será que vai demorar quarenta anos para reconhecer o novo erro?”, cobra Milton Alves. “Tempo que levou para fazer a autocrítica pelo apoio dado ao golpe militar de 1964…”, completa.

Leia a íntegra do artigo de Milton Alves:

Rede Globo deve pedir perdão ao povo brasileiro

Por Milton Alves*

O artigo “É hora de perdoar o PT” do articulista Ascânio Seleme no jornal O Globo, neste sábado (11), apresenta argumentos em defesa da necessidade de um “pedido de perdão” ao Partido dos Trabalhadores. Segundo Seleme, o PT já foi punido com o impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 2016, e castigado com a prisão de Lula e de outros destacados líderes da legenda.

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O jornalista reconhece a força e relevância do partido quando diz: “Esse agrupamento político, talvez o mais forte e sustentável da história partidária brasileira, tem que ser readmitido no debate nacional. Passou da hora de os petistas serem reintegrados. Ninguém tem dúvida de que os malfeitos cometidos já foram amplamente punidos. O partido teve um ex-presidente e seu maior líder preso e uma presidente impedida de continuar governando”.

Porém o articulista continua sustentando a narrativa da participação do PT no esquema que ele chama de “roubalheiras”, com “desvios de dinheiro público nas gestões de Lula e Dilma”. Ascânio ainda desenvolve um argumento de cínica benevolência quando afirma que o petismo não é o malufismo. Quanta consideração do Sr. Ascânio ao PT!

Ascânio mais adiante também afirma “que o ódio dirigido ao PT não faz mais sentido e precisa ser reconsiderado se o país quiser mesmo seguir o seu destino de nação soberana, democrática e tolerante”.

O que articulista não diz que foi exatamente a Rede Globo a patrocinadora e condutora de uma violenta campanha de ódio contra um partido e uma governante eleita de forma legítima, após a derrota do então candidato preferido da família Marinho nas eleições presidenciais de 2014. A Rede Globo atuou como uma coluna avançada na ofensiva golpista contra presidenta Dilma, estimulando os movimentos de rua e o golpe parlamentar – com um impeachment sem crime de responsabilidade.

A campanha da Globo pela destruição do PT foi mais além após a queda da presidenta Dilma. O alvo do grupo de comunicação da família Marinho passou a ser o ex-presidente Lula, que foi vítima de uma orquestrada e sem precedente ação de lawfare, o que culminou com a sua prisão em 2018 pela fraudulenta e criminosa operação Lava Jato.

Com Lula preso, o PT criminalizado pelo ex-juiz Sérgio Moro, os petistas demonizados, a Globo facilitou o caminho para a vitória de Jair Bolsonaro, inaugurando um período político de retrocesso democrático, de desmonte do estado nacional e de desastre econômico e sanitário no país.

É impossível avaliar o atual cenário político sem apontar as responsabilidades da Rede Globo com este quadro trágico em que o Brasil mergulhou. Globo, Lava Jato e o governo Bolsonaro integram um mesmo e único processo de contenção e esmagamento do projeto democrático e de inclusão social representado pelos governos petistas. Foi contra isso que o andar de cima se levantou com todo apoio da Rede Globo.

A Globo deve mais um pedido de perdão ao povo brasileiro. Será que vai demorar quarenta anos para reconhecer o novo erro? Tempo que levou para fazer a autocrítica pelo apoio dado ao golpe militar de 1964…

*Milton Alves é ativista político e social. Autor do livro ‘A Política Além da Notícia e a Guerra Declarada Contra Lula e o PT’ (Kotter Editorial).

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Grupo de Puebla propõe renda mínima universal para cidadãos da América Latina

Líderes progressistas da América Latina defendem uma renda mínima universal para todos os cidadãos como forma de combater a pobreza que atingirá a 230 milhões de pessoas na região. Com a crise gerada pela pandemia do coronavírus, calcula-se que 44 milhões de pessoas perderão seus empregos e 2,7 milhões de empresas latino-americanas vão quebrar.

Da reunião virtual do Grupo de Puebla na sexta-feira (10) surgiu a decisão de se fazerem representar, através dos governos de Argentina, México e Espanha, no G20, reunião das maiores economias do mundo, prevista para ser realizada em novembro desde ano. Serão dois os assuntos principais: a redução da dívida externa dos países de renda média e novas fontes de financiamento, através de organismos multilaterais de crédito e de novos impostos às empresas beneficiadas pela pandemia.

Argentina e México fazem parte do G20. A Espanha é uma convidada permanente. Os três países estão hoje alinhados com o Grupo de Puebla, cuja reunião virtual, ao longo de sexta-feira, celebrou o seu primeiro ano de vida sob o lema “Agenda Progressista para Superar a Crise da Pandemia”.

Alicia Bárcena, moderadora da reunião virtual e secretária-executiva da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal), órgão ligado às Nações Unidas, acrescentou que, a partir da ONU, também se impulsiona a inclusão desses países em iniciativas para aliviar o pagamento das dívidas e para novos financiamentos.

O ex-presidente colombiano, Ernesto Samper, calculou que a dívida dos países latino-americanos possa ser reduzida, de forma amistosa, entre US$ 300 e US$ 500 bilhões. Isso permitiria, segundo Samper, obter os 2 ou 3 pontos do Produto Interno Bruto (PIB) que cada país precisará para financiar uma bandeira com a qual todos concordaram: uma renda básica universal como proteção social aos efeitos da pandemia, mas que seja adicional e não substitutiva dos atuais programas sociais.

“Quem vai pagar a fatura da pandemia?”, perguntou-se Samper para responder: “Não podem ser as vítimas, pobres extremos e pequenas empresas”.

Tombo da América Latina durante a pandemia
Alicia Bárcena, da Cepal, também pôs números ao impacto da pandemia na América Latina que, afirmou, “evidenciou graves brechas estruturais na região”. Ela alertou o Grupo que “se não fizermos nada, teremos uma sociedade mais desigual, mais pobre, mais desnutrida e furiosa”. “Haverá uma contração (do PIB) de 9% na região, uma queda de 20% no comércio e 2,7 milhões de micro e pequenas empresas fechadas”, apontou.

“Mas o mais grave é o aumento da pobreza a 230 milhões de pessoas, das quais 95 milhões estarão na pobreza extrema. O desemprego chegará a quase 44 milhões. Isso é gravíssimo numa sociedade com tanta informalidade como a que existe na América Latina”, indicou. A população na região é de 569 milhões.

O economista colombiano José Antonio Ocampo expôs um leque de propostas, com as quais todos concordaram, para aumentar a renda dos países para que enfrentem essa renda mínima adicional.

As propostas incluem a tributação de empresas digitais; das transações financeiras digitais; imposto adicional às empresas beneficiadas pela pandemia; empresas que não pagam impostos num país, mas atuam em outros; uma taxa mínima universal de 25% sobre as utilidades das empresas para evitar uma disputa de países; um registro mundial de ativos de pessoas físicas que impeça a evasão do imposto à riqueza.

“Socialismo ou capitalismo amigável?”
Sem Lula, o Brasil foi representado pela ex-presidente Dilma Rousseff e pelos ex-ministros Aloízio Mercadante e Celso Amorim. O primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, mandou uma carta para dizer que segue o Grupo.

O ex-senador e ex-chefe da Casa Civil de Lula e de Dilma Roussef, Aloízio Mercadante, propôs transformar todas essas iniciativas do Grupo em projetos para se tornarem leis nos Congressos da região.

O ex-chanceler Celso Amorim também cobrou identidade política: “O que queremos? Queremos uma sociedade que caminhe ao socialismo ou queremos uma sociedade que seja pelo ‘capitalismo amigável’? Sinceramente, eu não creio no ‘capitalismo amigável’. A desigualdade é um fenômeno político, econômico e social que o capitalismo cria e recria, produz e reproduz”, concluiu.

Participação portuguesa e união latino-americana
Celso Amorim questionou que o Grupo de Puebla fale sobre questões iberoamericanas, mas não inclua Portugal e pediu incluir ainda os países do Caribe “antes que sejam absorvidos pelos grandes países desenvolvidos do Norte”.

Alicia Bárcena concordou e prometeu convidar o secretário-geral da ONU, António Guterres. “Talvez seja ele o português que possamos convidar. Seria fantástico! Eu farei isso sem falta. Temos de trazê-lo”, avançou.

Já o espanhol José Luis Rodríguez Zapatero pediu a união dos países latino-americanos, pondo como exemplo a União Europeia. “O que vai permitir à União Europeia sobreviver a esta crise será a sua integração. A América Latina precisa urgentemente integrar-se”, pediu.

“No momento que mais precisamos é justamente o momento que estamos mais desintegrados”, lamentou Ernesto Samper, em referência aos governos de direita da região.

O Grupo de Puebla nasceu há um ano na cidade homônima mexicana como um espaço de ideias e ações para conter o avanço das forças liberais que ganharam quase todas as eleições desde 2015, pondo fim, na região, a um ciclo de 12 anos de governos de esquerda, populistas para unos; progressistas para outros.

Do grupo fazem parte um presidente (Alberto Fernández, Argentina), dez ex-presidentes e chefes de Governo como Lula e Dilma Rousseff (Brasil), Evo Morales (Bolívia), José Mujica (Uruguai), Rafael Correa (Equador), Ernesto Samper (Colômbia) e Jose Luis Rodríguez Zapatero (Espanha) além de chanceleres (Argentina e Espanha), ex-chanceleres e ex-legisladores num total de 40 membros de 17 países.

Por Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires.