A paixão e ressurreição da verdade

O deputado Enio Verri (PT-PR), líder do PT na Câmara, afirma que o presidente Jair Bolsonaro é um “mentiroso” e que milhares de mortes virão com o coronavírus.

“Bolsonaro mente o tempo todo para impor o que lhe é determinado por quem o sustenta, o mercado financeiro”, escreve.

O articulista pede, urgente, a ressurreição da verdade.

Leia a íntegra do artigo de Enio Verri:

A paixão e ressurreição da verdade

Enio Verri*

Economia

O Brasil é um país eminentemente cristão, ideologia interpretada de diferentes pontos de vista, por várias religiões. Em todas, a verdade é basilar da conduta exigida de todo e qualquer humano, sob pena de incorrer em um crime, em outras eras, pago, não raro, com a vida. Da perspectiva do conjunto da realidade brasileira, o período da pandemia enfrentada pode ser comparado ao simbolismo da Semana Santa, como o calvário e a ressurreição da verdade, que foi massacrada distorcida e escondida, em 2018, para eleger o que ficará registrado como o pior governo da história do Brasil. A não ser para cerca de 30% da população, o que já demais para acreditar que tudo isso apoia Bolsonaro, o presidente é unanimidade internacional, uma referência de como não agir para combater a pandemia do coronavírus, proteger a população e a economia dos efeitos da doença.

Bolsonaro mente o tempo todo para impor o que lhe é determinado por quem o sustenta, o mercado financeiro. A mentira vem sendo construída desde antes das eleições, quando os bancos utilizaram ostensivamente suas caixas de ressonância, a imprensa comercial, para emplacar o Paulo Guedes, sumidade em economia mundialmente desconhecida e inexpressiva, a não ser pela ousadia como apostador de bolsa de valores, desses que quebram nações e deixam um rastro de sangue e miséria. Esse personagem foi sufocantemente apresentado como a salvação para a destruição que o Partido dos Trabalhadores deixou, de R$ 2 trilhões de reservas internacionais e um PIB de R$ 6 trilhões. A título de comparação, Fernando Henrique Cardoso deixou, em 2002, R$ 37 bilhões de reservas e um PIB de R$ 1,5 trilhão. Com as condições de estimular a economia, por meio da produção, as únicas palavras de Guedes são privatização e cortes de investimentos. Mais que péssimo administrador, é cruel. Haja vista a MP 905 e o PLP 149, entre outras barbaridades.

Já Bolsonaro foi vendido como competente e honesto. Não são o que dizem sua capacidade de criar crises, ao invés de solucionar, e as diversas mentiras, em vários campos, desde uma umbilical e não explicada relação de divisão de salários, em gabinete parlamentar, à quase totalidade de seus ministros que mentiram sobre suas qualificações acadêmicas e profissionais. Sob o atual governo, o Brasil regrediu sob todos os aspectos, desde o econômico ao cultural, passando pelo social, o ambiental, enfim, o civilizacional. Sem plano e nem projeto, sob mentiras de que o País não tem como sair da crise, o governo impôs a pauta ultraliberal, de redução do Estado.

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As únicas propostas do governo são para privatizar, suprimir direitos minimamente justos e demitir. O resultado dessa política, em 2019, foi um PIB de 1%, quando o governo poderia ter retomado obras paradas, aberto outras, fomentando a demanda necessária que a indústria precisa para produzir e, portanto, criar mais empregos. Mas não, confiantes na despolitização da sociedade, Bolsonaro e Guedes mentem que não há caixa para estimular a criação de postos de trabalho, mas isentam as empresas e dão R$ 1,2 trilhão aos bancos.

A maldade de Bolsonaro e Guedes é o fiel reflexo do sentimento que a casa-grande tem pela senzala. Para cobrir a isenção de impostos que dará aos empresários para que empreguem, o governo vai descontar 7,5% de quem recebe seguro desemprego. Ou seja, vai tirar de quem já está na miséria para cobrir as renúncias fiscais aos patrões. Isentar empresas de taxas e impostos não as fará produzir e vender mais, senão apenas aumentar o lucro. Já o que os bancos receberam, não foi para evitar possíveis prejuízos com empréstimos cedidos antes da pandemia, mas para garantir-lhes o lucro no negócio. Com os lucros já auferidos, os banqueiros, agora, como agiotas, estão diminuindo o prazo de pagamento dos empréstimos e aumentando os juros. Essa é a classe dominante brasileira, a mais perversa e ignorante do mundo.

Já essas verdades não são ostensivamente divulgadas pelos mesmos jornalistas que tapam o nariz para o cadáver político que serão obrigados a carregar, tanto para o resto de suas vidas profissionais, quanto para a história, mas, principalmente, até que o Guedes termine o serviço de destruir o Brasil, para o desenvolvimento de outros povos. Pelo contrário, Bolsonaro é o palhaço infame e sem graça para quem a imprensa comercial bate palma para sua dança macabra, com suas mentiras, seus ataques fanáticos contra ciência, minorias e os interesses do Brasil. Diferentemente dos governos de outros países, o do Brasil é contra o país e contra os brasileiros. Ele nega a gravidade da calamidade que ele mesmo decretou e não respeita, não é proativo no combate à proliferação do vírus e ataca a economia, com o prestimoso auxílio da imprensa comercial, que defende os projetos apresentados por Bolsonaro e Guedes, que visam tão somente destruir a soberania do País, com a venda de suas empresas estratégicas e seus recursos naturais.

Nesse sentido, a Semana Santa é uma passagem que nos faz refletir, também, sobre a verdade. Esse substantivo feminino não faz parte do dicionario do governo Bolsonaro, que não mente sozinho. Além da sua equipe de governo, ele tem uma imprensa que o tolera e não poderá, um dia, se arrepender do que está fazendo, uma vez que ela não pertence mais a si mesma. Ela tem um dono cuja verdade não é um imperativo sem verificação e é de fácil desconstrução. É preciso combater a verdade única da imprensa comercial, a todo custo, e estabelecer o acesso democrático ao maior número de fontes de informação e, portanto, mais próximo da verdade.

Infelizmente, a apavorante comprovação de que Bolsonaro é um mentiroso, virá à custa da morte de centenas de milhares de pessoas que poderia ter sido evitada, não fosse o governo de Bolsonaro. O trágico período pelo qual passaremos, será de fértil produção da usina de crises e de mentiras desse desgoverno. A sociedade poderá, se quiser, retomar e restaurar a verdade para que este País volte a ter dignidade e não seja peça de memes e charges do jornalismo internacional e palco do extermínio dos brasileiros pobres, para a satisfação da classe dominante. Ressuscitemos a verdade, é urgente.

*Enio Verri é economista e professor aposentado do Departamento de Economia da Universidade Estadual de Maringá (UEM) e está deputado federal e líder da bancada do Partido dos Trabalhadores na Câmara dos Deputados.