Mianmar: após ser presa, Aung San Suu Kyi pede à população que não aceite golpe

A líder de fato do governo de Mianmar e prêmio Nobel da Paz Aung San Suu Kyi pediu nesta segunda-feira (1) à população do país que não aceite o golpe de Estado realizado durante a última noite. As forças armadas instauraram um regime ditatorial, disse a líder, em um comunicado divulgado pela manhã, por seu partido.

O presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, condenou o golpe, assim como o governo britânico, que considerou a prisão ilegal. A França pediu que o voto da população “seja respeitado”. A China recomendou que Mianmar “resolva seus diferendos” legalmente.

Ainda há poucas imagens sobre o que aconteceu durante a noite em Mianmar, relatam os correspondente da RFI. A partir das 3h, a rede de telecomunicações passou a funcionar com 75 % de sua capacidade. Pouco depois, um apagão atingiu o país. A rede de telefonia celular também foi parcialmente interrompida, indicando que o levante militar estava começando.

A presença de militares foi constatada nas ruas de Naypydaw e Rangoun. Segundo o porta-voz do partido da líder civil, ela pode ter sido presa em Naypydaw. Além de Aung San Suu Kyi, também foram detidos o governador de Rangoun, artistas, líderes da sociedade civil e inúmeros representantes de minorias éticas. Entre eles, o cineasta Min Htin Ko Ko Gyi, detido em seu domicílio às 8h30, e conhecido pelas suas críticas às forças armadas.

A TV nacional de Mianmar encerrou sua programação às 8h no horário local, antes da transmissão de um comunicado informando que a Tatmadaw, o nome das forças armadas birmanesas, haviam tomado o poder. Os militares defendem a ação e estimam que se trata de um golpe de Estado constitucional.

Segundo as Forças Armadas, a decisão é necessária para preservar a estabilidade do Estado. Eles acusam a comissão eleitoral de não ter reagido às “imensas irregularidades” que, segundo eles, ocorreram durante as eleições legislativas de novembro, vencidas pelo partido de Aung San Suu Kyi.

Economia

As prisões e a instauração do estado de emergência ocorreram algumas horas antes de o Parlamento iniciar sua primeira sessão, após as eleições de novembro. Os militares denunciam há várias semanas fraudes no pleito de novembro, vencido pela LND. Segundo o major Zaw Min Tun, porta-voz dos militares, as eleições não foram justas e livres, e o pretexto usado pelo governo foi a pandemia. Os militares afirmam que há milhões de casos de fraudes, com eleitores centenários e menores de idade registrados para votar.

Tensão entre civil e militares
Nos últimos dias, a tensão cresceu entre os militares e o governo civil, segundo a ex-correspondente da RFI em Rangoun Sarah Bakaloglou. Os militares já tinham avisado sobre um possível golpe de Estado durante uma coletiva de imprensa.

O chefe das forças armadas, Min Aung Hlaing, o homem mais poderoso do país, disse recentemente que a Constituição podia ser revogada em certas circunstâncias. Veículos blindados também começaram a circular em Rangoun, com a justificativa de ser uma operação de rotina.

Washington ameça reagir
Aung San Suu Kyi, prêmio Nobel da Paz em 1991, é criticado pela gestão da crise dos muçulmanos rohingyas no país. As tensões entre governo civil e os militares sempre existiram, desde que a Liga Nacional pela democracia chegou ao poder. Aung San Suu Kyi lutava para mudar a Constituição, que confere poderes às Forças Armadas e três ministérios importantes (Interior, Defesa e das Fronteiras).

Os militares também têm garantidas 25% das cadeiras no Parlamento. A votação de novembro foi a primeira eleição geral desde 2011, ano da dissolução da junta que reinou durante meio século no país.

A Austrália e os Estados Unidos pediram que o exército mianmarense libere todos os dirigentes presos. O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres condenou a prisão da prêmio Nobel da Paz.

Por RFI