Manifestantes desafiam militares e protestam contra golpe de Estado em Mianmar

Mianmar foi palco nesta sexta-feira (5) do maior protesto contra o golpe de Estado militar que derrubou na segunda-feira (1°) o governo de Aung San Suu Kyi, que está em prisão domiciliar em Naypyidaw. Centenas de professores e estudantes desafiaram os militares e se reuniram em frente de uma universidade de Yangon, enquanto o Exército continua detendo líderes políticos e ativistas birmaneses.

Os manifestantes fizeram a saudação com três dedos da mão, um gesto de resistência utilizado por vários movimentos pró-democracia asiáticos, como na Tailândia. Eles também cantaram uma música antiga que se tornou popular durante a revolta de 1988, violentamente reprimida pelo exército birmanês, e pediram “longa vida à mãe Suu” Kyi. A líder, presa em casa, está em “boa saúde”, segundo um porta-voz de seu partido, a Liga Nacional para a Democracia.

“Enquanto os generais continuarem no poder, não voltaremos ao trabalho. Se todo mundo resisitr, o sistema não vai aguentar”, declarou Win Win Maw, professor do departamento de História.

Funcionários públicos de vários ministérios também cruzaram os braços temporariamente na capital Naypyidaw. Todos ostentavam uma fita vermelha, cor do partido Liga Nacional para a Democracia (LND), de San Suu Kyi.

Desde o golpe de Estado em Mianmar na última segunda-feira, um movimento de desobediência civil começou no país. Os birmaneses fazem panelaço e buzinaços todas as noites, às 20h. Algumas lojas fecharam as portas e, na quarta-feira (3), os profissionais de saúde convocaram uma greve por tempo indeterminado em várias cidades. Advogados e médicos participaram de uma primeira manifestação, e vários manifestantes foram presos em Mandalay.

Em Yangon, o movimento de desobediência civil se intensifica no setor da saúde. Uma cirurgiã, entrevistada pela RFI, que preferiu não ser identificada, disse que a greve atinge mais de cem hospitais.

Economia

“Mais de mil médicos, enfermeiras e profissionais da saúde que trabalham em mais de cem hospitais públicos começaram uma campanha de desobediência civil aos militares. Alguns pararam de trabalhar, outros vão continuar a atender os pacientes, mas não vão obedecer às ordens do governo militar. Esse é apenas o início da campanha de desobediência civil. Muitos estrangeiros estão querendo lançar um fundo de emergência para ajudar os profissionais que cruzaram os braços. Este não é um conflito entre a LND e o exército, é um conflito entre a vontade do povo e os militares”, declarou a médica birmanesa à jornalista Yelena Tomitch.

Dezenas de detenções
Apesar das reiteradas condenações internacionais, os generais, que interromperam brutalmente a frágil transição democrática no país, continuam a onda de repressão e detenções. Na madrugada desta sexta-feira, eles prenderam Win Htein, de 79 anos, um político veterano da LND, indicou o porta-voz do partido. Na quarta-feira, Htein, que passou vinte anos na prisão entre 1989 e 2010, quando a junta militar comandava o país, havia previsto que seria novamente detido, mas salientou que “não estava preocupado, pois está acostumado à luta pacífica”.

Min Htin Ko Ko Gyi, um cineasta que já cumpriu pena de prisão por ter criticado o exército, também foi detido hoje, segundo informações de um sobrinho.

Quatro dias depois da queda de Aung San Suu Kyi, que está em prisão domiciliar na capital e foi indiciada por ter violado uma regra comercial, mais de 150 líderes políticos e ativistas já foram detidos no país, de acordo com dados da Associação de Assistência a Prisioneiros Políticos, uma ONG baseada em Yangon.

Biden pede renúncia de golpistas
O presidente americano, Joe Biden, pediu aos generais birmaneses, que derrubaram o governo da Nobel da Paz, que “renunciassem ao poder” sem impor condições. Os Estados Unidos estudam sanções contra alguns militares de Mianmar.

Já as Nações Unidas adotaram um tom mais moderado com os golpistas. O Conselho de Segurança da ONU adotou uma declaração comum notificando a “profunda preocupação” do órgão com a situação em Mianmar e pedindo a libertação de todos os detidos. Mas o texto não condena o golpe de Estado, devido à oposição da China e da Rússia a essa condenação.

Pequim continua sendo o principal apoio de Mianmar nas Nações Unidas. Durante a crise do refugiados rohingyas, a minoria muçulmana massacrada e expulsa do país, a China impediu todas a iniciativas contra no Conselho de Segurança contra o exército birmanês e seu chefe, Min Aung Hlaing, que agora concentra a maior parte do poder em Mianmar.

Por RFI, com informações da AFP