Em artigo publicado no jornal Folha de São Paulo, nesta sexta-feira (17), os ex-ministros Alexandre Padilha, Arthur Chioro, Barjas Negri, Humberto Costa, José Gomes Temporão, José Saraiva Felipe e Luiz Henrique Mandetta denunciam a omissão do governo Bolsonaro diante da escala da pandemia do novo coronavírus, que provocou mais de 75 mil mortes no país.
Os ex-ministros apontam também o fracasso da gestão militarizada do general Eduardo Pazuello na Saúde. “A gestão militarizada do MS não trouxe nenhum ganho em eficiência logística e sequer tem sido capaz de adquirir os testes necessários ou de executar os recursos orçamentários disponibilizados, já que apenas 30% foram gastos até agora. O fato é que o governo federal abriu mão de seu papel constitucional de coordenação e condução do esforço nacional de combate à COVID 19 com evidentes prejuízos à capacidade do país em reduzir os impactos da doença”, diz o texto.
No artigo, os ex-ministros demandam do governo do presidente Bolsonaro medidas e ações para conter a expansão do coronavírus e o abandono do discurso negacionista e irresponsável que delegou o comando do ministério para militares sem experiência de gestão na área da Saúde Pública.
Leia a íntegra do artigo:
60 dias de omissão na saúde
O Brasil sucumbe de modo trágico à pandemia do coronavírus e o luto cobre a nação brasileira. Ao ultrapassar as 75 mil mortes causadas pela COVID 19, número inferior apenas ao dos EUA, a doença avança pelo país deixando um rastro de dor e sofrimento. Mas poderia ter sido diferente se o governo federal tivesse guiado suas ações ouvindo a ciência, mobilizando a sociedade, construindo estratégias com estados e municípios e assumindo sua responsabilidade de liderar e coordenar o esforço nacional de enfrentamento da pandemia.
O Presidente da República, após demitir dois ministros por discordarem de sua condução negacionista e irresponsável, entregou o Ministério da Saúde (MS) a um interino militar que nomeou dezenas de outros militares para cargos estratégicos no MS, em atitude ofensiva à saúde pública brasileira, que conta com técnicos e gestores experientes, dedicados e capacitados. O MS tornou-se uma instituição desacreditada e vista com reservas pela opinião pública, seja ao distorcer estatísticas oficiais, seja por aprovar protocolo que não se baseia em evidências científicas para o manejo da doença. A gestão militarizada do MS não trouxe nenhum ganho em eficiência logística e sequer tem sido capaz de adquirir os testes necessários ou de executar os recursos orçamentários disponibilizados, já que apenas 30% foram gastos até agora. O fato é que o governo federal abriu mão de seu papel constitucional de coordenação e condução do esforço nacional de combate à COVID 19 com evidentes prejuízos à capacidade do país em reduzir os impactos da doença.
O SUS tem sido fundamental para evitar uma situação de barbárie e caos social. Como explicar a resiliência do SUS apesar do desfinanciamento e seus problemas estruturais? Na prática, a partir da decisão do STF sobre a autonomia dos entes da federação no enfrentamento da epidemia, estruturou-se no país uma “autoridade sanitária alternativa” embora não formalizada enquanto tal, composta por governadores, prefeitos, sanitaristas e outros especialistas, entidades das áreas da saúde pública, da ciência, da medicina, partidos políticos, Congresso Nacional, Poder Judiciário e grande mídia; que vem se dedicando com grandes limitações ao enfrentamento da situação sanitária.
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Não se trata apenas, de uma atuação equivocada ou incompetente do presidente e do governo federal. As decisões tomadas nos campos sanitário, econômico e social expressam uma lógica perversa que rege todo o governo e que subjuga as necessidades da população ao princípio da austeridade fiscal, indiferente aos danos que isso possa causar na vida das pessoas.
Que o governo federal assuma suas responsabilidades intransferíveis! Que o Ministério da Saúde seja devolvido à saúde pública! Que se ponha fim à omissão no enfrentamento da pandemia! Que possamos finalmente unir esforços e enfrentar de forma obstinada a pandemia de COVID-19 e seus graves efeitos sociais e econômicos, sobre a nação.
Alexandre Padilha
Arthur Chioro
Barjas Negri
Humberto Costa
José Gomes Temporão
José Saraiva Felipe
Luiz Henrique Mandetta
*Artigo publicado originalmente na Folha de São Paulo (17/07/2020)
Jornalista e Advogado. Desde 2009 é autor do Blog do Esmael.