A esquerda tem que assumir o “Fora Bolsonaro!”

Professor Emir Sader.
Por Emir Sader – Os panelaços têm confirmado que se generaliza pelo país o sentimento de rejeição a Bolsonaro, que setores majoritários da população não o querem mais, não o aguentam mais. “Chega”, “não suporto mais”, “vai embora”, “já deu pra você” – todos sentimentos generalizados e reiterados.

Os panelaços mostram que algo mudou, que se expande a rejeição ao governo. As pesquisas demonstram, há vários meses, que o apoio a Bolsonaro diminuiu significativamente, que é menor que a rejeição a ele. Mas não se encontrava formas mais ativas desse descontentamento. Os generalizados e combativos panelaços mostram que amplos setores passam da rejeição passiva à rejeição ativa. Nao houvesse a impossibilidade de manifestações de massa, certamente estaríamos vivendo as maiores e mais combativas demonstrações de rejeição ao governo.

LEIA TAMBÉM:
A única saída é o impeachment

Intelectuais, advogados, artistas e deputados protocolam pedido de impeachment de Bolsonaro

Frota protocola pedido de impeachment de Bolsonaro

Por outro lado, os panelaços, marcantes em bairros de classe média e até de classe média alta, demonstram que esses setores, depois de um longo processo de transformação de suas posições, aderem às demonstrações de rejeição do governo, também sentem que não o suportam mais, querem mudanças.

Economia

Impeachment, acusações de crimes de responsabilidade, pedidos de interdição psiquiátrica – todas são formas possíveis de expressar a rejeição, todos remetem a uma consigna geral: Fora Bolsonaro! Não se deve abandonar nenhuma via, toda via para que o país se livre dele é possível.

Argumenta-se que não é porque não se gosta deste governo, que devemos apelar para o impeachment. Mas não é assim. A esquerda se opôs ao governo do FHC, se deu conta que o Judiciário permitia o governo cometer ilegalidades óbvias na implementação do seu programa neoliberal. Se sabia dos danos que causava ao país. Mas nunca se apelou ao impeachment, se procurou convencer à maioria da população dos danos que aquela política fazia ao país e a todos, até ganharmos as eleições.

Agora não se trata só do desmantelamento da democracia , do Estado, dos direitos dos trabalhadores. Se trata do desmantelamento do Brasil, de todo tipo de legalidade e de normas de convivência, da desmoralização do governo, do Congresso, do Judiciário, da provocação de uma situação de caos sanitário, de comunidade de gente com diferentes posições, da destruição do que se construiu ao longo de décadas. Não há governo, se renuncia a dar condução ao país numa situação de uma gravidade enorme, em que a grande maioria da população se sente desvalida diante dos efeitos de um vírus que os atinge sem que tenham defesa.

Tudo isso violando a Constituição, cometendo quantidade de crimes de responsabilidade, de corrupção, de violação dos direitos dos outros, de falta de pudor no comportamento no cargo, com apelo e incentivo à violência policial contra a população, com a desmoralização da imagem do Brasil no mundo, com incapacidade total de tirar o país da crise e do desemprego.

Tudo isso, repito, violando reiteradamente a Constituição, sem que o Judiciário tome nenhuma medida para frear tudo isso. Só nos resta contar com a força demonstrada pela população na rejeição a ele. A esquerda tem que assumir a responsabilidade de dar condução política ao movimento que quer o “Fora Bolsonaro”. Assumir esse movimento com força, ver no seu transcurso qual a melhor via para que o país se veja livre dele. Vai ter apoio de amplos setores do país, majoritários hoje, assim como de grandes setores da mídia. A esquerda tem que assumir a responsabilidade de responder a esse anseio nacional – livrar o Brasil dele.

A esquerda precisa não ter medo de nenhuma via, nem do impeachment, quando estiverem dadas as condições. Que ele vai tentar se fazer de vítima diante do impeachment, certo. Mas tem se feito de vítima diante de qualquer crítica, isso não pode ser empecilho.

A esquerda não pode deixar esse anseio nacional se esvaziar, por não encontrar forma de se realizar. Depois ela será julgada pela história, por sua incapacidade de realizar esse objetivo, cada vez mais maduro: Fora Bolsonaro!

Emir Sader é filósofo, professor de sociologia e cientista político.

Artigo publicado originalmente no site Brasil 247.