Presidente da CUT sobre Bolsonaro: “Temos que virar essa página”

Não, o novo presidente da CUT, o metalúrgico Sérgio Nobre, não fala em impeachment. Para o curto prazo, ele acredita que a primeira coisa a ser interrompida pela pressão popular é a política econômica do governo federal. Na opinião dele, o presidente é um “desqualificado” e seu ministro da Economia, Paulo Guedes, um “maluco”.

“Nós temos de centrar fogo em interromper essa política e virar essa página, para o Brasil poder voltar a crescer. Nossa ideia é então levar muita gente pra Brasília para um ato diante do Ministério da Fazenda e pedir a imediata suspensão dessa política econômica”, conta Nobre, convocando ato para o próximo dia 30, no Distrito Federal.

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Eleito no último dia 12 para um mandato de quatro anos frente à central, o metalúrgico começou a trabalhar aos 14 anos, como aprendiz, na montadora de origem sueca Scania, em São Bernardo. Na mesma cidade, onde mora, transferiu-se seis anos depois para a concorrente Mercedes-Benz, da qual é funcionário até hoje.

Economia

Na manhã seguinte à sua eleição, realizada em Praia Grande, durante o 13º Congresso Nacional da CUT, já estava desde cedo na sede da central, no bairro do Brás, para reuniões com delegação de sindicalistas dos Estados Unidos e com representantes de sindicatos cutistas. No intervalo, concedeu esta entrevista. No domingo, esteve na Avenida Paulista, em ato pela libertação do ex-presidente Lula.

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Há uma inquietação no ar. Muitas pessoas, entre elas aquelas que não participam diretamente de nenhum movimento, perguntam onde está a rebeldia popular. Muitas coisas ruins acontecendo e o povo parece tomado de uma apatia. O que você acha disso?
Sérgio Nobre: Eu não vejo assim. Este ano fizemos grandes mobilizações, uma greve geral muito importante. Algumas categorias muito representativas, como a dos professores, pararam o país. Então, a classe trabalhadora organizada está lutando. Agora, é claro que estamos vivendo um momento muito difícil. No setor industrial, o que se vê toda hora é o fechamento de fábricas. Todo dia vemos o anúncio de uma fábrica fechando, desemprego. No setor de comércio, nas grandes cidades, é impressionante o número de lojas, de bares que estão fechando. A crise vai se instalando. Em momento de recessão, a mobilização fica mais difícil. A gente vê, em todas as capitais, famílias inteiras vindo morar nas calçadas… É um cenário dramático. E tem um governo maluco, de um desqualificado que não aponta rumo para o país. É uma situação extremamente difícil. Mas, à medida que as pessoas vão percebendo que os rumos estão errados, a tendência é a mobilização crescer. Por isso que encerramos o Congresso da CUT e já marcamos uma grande mobilização para Brasília, com o objetivo de ocupar a capital contra a política econômica do Bolsonaro, que é destrutiva. As lutas estão acontecendo.

Fale um pouco sobre essa mobilização, qual a data e que formato vai ter?
Dia 30 de outubro. A orientação é que todos se dirijam a Brasília, em caravana. Vamos fazer um ato em defesa do patrimônio público e das empresas estatais. Um dos grandes problemas do Brasil é que não temos grandes empresas nacionais. Os Estados Unidos, por exemplo, têm empresas que são nacionais, a Alemanha tem. O que nós temos é a Petrobras, que é o instrumento de desenvolvimento nacional. E que o Bolsonaro quer privatizar, o que seria um enorme desastre. No governo do presidente Lula, a decisão da Petrobras de fazer plataformas no Brasil acendeu todo o setor naval, que estava destruído. E a Petrobras não é só isso. A empresa produz pesquisa, tecnologia. Uma empresa estratégica. E também o Banco do Brasil e a Caixa. O presidente Lula disse diversas vezes que só conseguiu governar o Brasil por causa da Petrobras, do Banco do Brasil e da Caixa. Você deve se lembrar que os bancos privados boicotaram o governo, não deixavam o crédito barato chegar à população, e foram os bancos públicos que garantiram a chegada de financiamento aos mais pobres, que passaram a consumir e fazer o país crescer. Então, ele (Bolsonaro) quer entregar a Amazônia. O Paulo Guedes é um maluco, diz que até o Palácio do Planalto ele quer vender. Então, você imagina. O povo brasileiro não pode permitir isso. Nós temos de centrar fogo em interromper essa política e virar essa página, para o Brasil poder voltar a crescer. Nossa ideia é então levar muita gente pra Brasília para um ato diante do Ministério da Fazenda e pedir a imediata suspensão dessa política econômica.

Há uma campanha de longuíssimo prazo por parte da mídia e outros setores para demonizar as empresas públicas, associando essas empresas a corrupção e ineficácia. Como fazer que a maioria das pessoas perceba que essa campanha não corresponde à realidade?
Acho que algo que é estratégico para nós é fazer uma campanha em defesa do setor público. Porque é mentira essa ideia de que as estatais são ineficientes. Quem quer comprar a Petrobras são outras empresas estatais estrangeiras. Estamos abrindo mão de nossa estatal para virar estatal estrangeira, o que é um absurdo. Temos de defender o SUS, que é uma conquista da classe trabalhadora brasileira. Olha, ontem mesmo eu encontrei um amigo de porta de fábrica, cujo filho de um ano foi diagnosticado com um problema auditivo. Ele vai ter de usar um aparelho em cada ouvido. Cada aparelho custa 40 mil reais. Esse trabalhador jamais teria condições de adquirir esse equipamento, mas ele vai ter porque o SUS vai pagar. Você chega numa unidade básica de saúde – que precisa melhorar, sem dúvida – mas consegue remédio, consegue ser atendido. A CUT tem uma campanha muito importante: “Se é público, é para todos”. Se for privado, é para alguns. A gente tem de fazer uma campanha para esclarecer a opinião pública da importância de termos serviço público, de termos hospitais, universidades públicas – que aliás, são as melhores. Os grandes hospitais, que são referência, são públicos, são do SUS. Precisamos desenvolver uma campanha de mídia para isso. País que não tem rede de proteção social pública, parte para a barbárie.

O governo continua tentando aprovar legislações que representam retrocesso. Conseguiu, na reforma da Previdência e antes, na reforma trabalhista. Agora, acena com essa tal reforma sindical. Qual a estratégia da CUT para barrar isso?
Esse é um enorme desafio. E não é apenas uma agenda brasileira, é mundial. Acabamos de receber a visita de uma delegação sindical dos Estados Unidos (na sexta-feira, dia 11), e nos contam que lá é a mesma coisa. As multinacionais, que não têm compromisso com país nenhum, eles vão onde ganham dinheiro, aqui no Brasil nunca quiseram criar vagas de trabalho de qualidade, com salários de alto valor, só querem investir se houver mão de obra barata, não pode ter proteção sindical. Eles querem destruir a organização sindical, e se inspiram no modelo mexicano. No México, fizeram uma reforma sindical que pulverizou a estrutura sobremaneira. Lá, empresários criam sindicatos com meia dúzia de pessoas de confiança e fecham acordo tirando direito dos trabalhadores, e hoje o salário no México é miserável. É isso que o Bolsonaro e o Paulo Guedes querem fazer no Brasil. Mas aqui é diferente: aqui existe a CUT, que tem mais de 36 anos de experiência e de luta, existem outras centrais sindicais importantes. E nós estamos unidos. O povo brasileiro sabe defender seus direitos e na luta nós vamos impedir que isso aconteça.

A central estadunidense AFL-CIO tem relatado que os sindicatos fizeram nos Estados Unidos uma campanha junto a seus filiados e mesmo junto aos não-associados para desmentir a ideia de que sindicato é desnecessário e que atrapalha. Conversaram pessoalmente, telefonaram. Hoje, eles experimentam crescimento nos índices de filiação. A CUT pensa em fazer algo parecido?
Isso é fundamental. Os empresários costumam dizer “para quê sindicato?”. Mas eles têm os seus sindicatos. Aqui no Brasil, a Fiesp é um sindicato de empresários. A Confederação Nacional da Indústria é um sindicato. E são sindicatos poderosíssimos que pressionam o governo por seus interesses. A classe trabalhadora também. Individualmente, a gente não consegue influenciar os rumos do país, a legislação. É importante pertencer a uma organização. Aliás, quando eu comecei a trabalhar, com 14 anos, o meu pai, que era metalúrgico, me disse: “Quer um conselho? Tem duas carteiras que você não pode abrir mão de jeito nenhum. Uma é a carteira de trabalho, porque sem ela você não tem proteção, você não tem direito. E a outra é a carteirinha do sindicato, porque se você não tem, você é um desorganizado, e um desorganizado, num tipo de sociedade dessa, dança”. É isso que temos que mostrar pro nosso povo. Que não há um único país onde exista direitos e desenvolvimento sem a existência de um grande sindicato, uma grande central. O sindicato é tão importante para a vida do trabalhador e da trabalhadora quanto a escola, a igreja.

As informações são da CUT.