A Democracia ameaçada

O deputado Luiz Claudio Romanelli (PSB) afirma que, após o atentado a Jair Bolsonaro (PSL), há verdadeiramente o risco de incendiar o país e da derrocada da democracia.

A Democracia ameaçada

Luiz Claudio Romanelli*

“O problema dos golpistas não é Lula, ele está preso. O problema são os eleitores, estão soltos” Neide Bombonatti

A Semana da Pátria começou com uma tragédia e acabou com outra. No domingo (2), o museu mais antigo do país foi destruído por um incêndio. 200 anos da história do Brasil viraram cinzas. De tudo que li sobre a tragédia, o texto que mais me impressionou foi o de Juan Arias, do El Pais Brasil, escrito no dia 3. Se lido hoje, revela que o autor teve um pressagio do que ocorreria apenas alguns dias depois.

“As chamas são o triste símbolo de um país que abandona a espinha dorsal da ciência, a da cultura e da arte para privilegiar uma política mesquinha de pequenos interesses pessoais dos que deveriam ser os guardiões da maior riqueza de um país, que é a memória da sua cultura. As imagens dessas labaredas queimando o coração cultural e histórico do Brasil poderiam ser um triste presságio, às vésperas de uma eleição presidencial que se prenuncia incendiária e incerta para este país. Quem estranha os surtos autoritários e direitistas que estamos observando deveria analisar o Museu Nacional em chamas, pela incúria de quem deveria ter cuidado de preservar sua riqueza histórica. Poderia assim entender melhor o voto de raiva de milhões de brasileiros desiludidos com um sistema democrático que agoniza a partir da morte de seus valores culturais”, disse o escritor e jornalista espanhol.

Apenas três dias depois, num ato de campanha em Juiz de Fora, o candidato do PSL Jair Bolsonaro foi esfaqueado, deixando o país perplexo e atônito. O ataque ao candidato evidencia, como disse Arias, o caráter incendiário e incerto dessa eleição e confirma que o ódio e a intolerância estão mesmo impregnados no país.

Economia

Passado o impacto inicial e o necessário repúdio ao ataque ao candidato, cabe uma reflexão sobre o novo cenário eleitoral. A campanha dos candidatos a presidente terá, necessariamente, que ser revista, para não acirrar ainda mais o discurso da raiva e do ódio.

Passei os últimos dias visitando os municípios que represento na Assembleia. Na estrada, na viagem entre uma cidade e outra, aproveitei para ler as opiniões dos principais jornalistas e analistas políticos do país sobre qual será o impacto do atentado contra Bolsonaro no processo eleitoral. Tenho opinião convergente com alguns deles.

Clovis Rossi, o sempre lúcido articulista da Folha de São Paulo, fez o alerta de que “do jeito que vão as coisas, o Brasil vai acabar se afogando em um mar de bílis”, tornando quase impossível o diálogo e a conciliação.

“O que assusta, nesse ambiente, é que se abandona a evidência de que a política não pode ser feita com o fígado, o que é de uma obviedade imensa, mas perdida no caminho. Não há outro meio para pelo menos começar a sair do buraco em que o país caiu a não ser a negociação e o diálogo”, analisa.

Tereza Cruvinel, do Jornal do Brasil, cobra um rápido esclarecimento sobre o ocorrido, para conter as especulações que tomaram conta das redes sociais e somente disseminam mais ódio. “Atentados desta natureza, não importa a cor ideológica da vítima, atingem o processo eleitoral e a própria democracia. Eleitoralmente, é cedo para prever seu efeito. Poderá fortalecer e ampliar a onda de seguidores de Bolsonaro como favorecer também a moderação, fazendo prevalecer o entendimento de que os problemas não podem ser enfrentados nem à bala nem à faca”.

Para a jornalista, o episódio não pode permitir maior envenenamento da campanha. “O Brasil precisa muito destas eleições para sair do atoleiro institucional trazido pelo impeachment, que agravou também a situação econômica, que já era ruim com Dilma. Para que a travessia seja exitosa, elas precisam ser livres, pacíficas e limpas”.

Daqui pra frente, nessa campanha eleitoral, como se diz no interior, vai ser necessário mudar o rumo dessa prosa, porque há verdadeiramente o risco de incendiar o país e da derrocada da Democracia.

A facada em Bolsonaro, como escreveu Hélio Gurovitz, “alerta para o risco de que a violência das palavras se transforme, na disputa polarizada que testemunhamos no dia a dia, em violência de fato. A campanha e a eleição precisam seguir adiante em clima de liberdade e tranquilidade”, diz ele.

Que a campanha transcorra sem radicalismos, e que ao discurso da bala (e da faca) se sobreponha o discurso do combate à violência. Porque violência, está provado, não se combate com mais violência.

Boa Semana! Paz e Bem!

*Luiz Cláudio Romanelli, advogado e especialista em gestão urbana, ex-secretário da Habitação, ex-presidente da Cohapar, e ex-secretário do Trabalho, é deputado pelo PSB. Escreve sobre Poder e Governo.