URGENTE: Justiça considera inconstitucional calote de Beto Richa em servidores

O juiz Cesar Ghizoni, de Curitiba, considerou inconstitucional o calote do governador do Paraná Beto Richa (PSDB) nos servidores estatutários civis e militares do Executivo Estadual. A decisão é desta segunda-feira, dia 30.

A informação é do deputado estadual Requião Filho (PMDB) que obteve ontem à noite a informação da vitória judicial dos servidores em primeiríssima mão.

Na sentença, o magistrado afirmou que o governo do estado ofendeu “o direito adquirido dos servidores públicos estaduais, incidindo em manifesta inconstitucionalidade” ao revogar os reajustes previstos na Lei n° 18.493/2015, nas datas e formas ali previstas.

Beto Richa tinha acordado o reajuste com os servidores por meio de uma lei, aprovada na Assembleia Legislativa do Paraná, mas, meses depois voltou atrás e apresentou a n° 18.907/2016 revogando da data-base em janeiro de 2017 e 1° de maio de 2017.

A lei prevendo o reajuste aos servidores foi decorrente de um acordo que pôs fim à histórica greve de educadores de mais de 43 dias.

A esse respeito, o juiz Ghizoni também puxou a orelha dos deputados estaduais ao dizer que o Poder do Legislador não é absoluto. “Ele está limitado à observância do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (art. 5°, inciso XXXVI, da Constituição Federal)”, ensinou.

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O Fórum dos Servidores (FES) estima o calote acumulado de Beto Richa em 8,53%, sem as correções, qual seja, a dívida soma os 7,29% de 2016, que deveriam ser implantados em janeiro de 2017, adicionando, agora, a inflação até abril de 1,10%.

Leia a íntegra da decisão do juiz Cesar Ghizoni:

Vistos.

Relatório dispensado.

O mero ajuizamento de ADI perante o STF não tem o condão de acarretar o sobrestamento das ações individuais. Tal somente ocorre quando há expressa previsão legal (v.g. art. 313, IV do CPC/15) ou quando assim determinado pelas instâncias superiores, situações que não se divisam na espécie.

A Lei Estadual n° 18.493/2015 estabeleceu, dentre outros, “o dia 1° de janeiro de 2017 e o dia 1° de maio de 2017, para a revisão geral anual da referência salarial inicial das tabelas de vencimento básico ou de subsídio, com o consequente reflexo nos inter níveis e interclasses, respeitada salarial e a dinâmica inter cargos, às carreiras estatutárias civis e militares do Poder Executivo do Estado do Paraná, em atendimento ao disposto no inciso X do art. 27 da Constituição Estadual” (art. 3°, caput).

Nos parágrafos de mencionado art. 3° especificou-se o percentual a ser implantado para os reajustes (IPCA) e o adicional de 1% de data-base relativo à compensação dos meses não pagos do ano de 2015.

Essa Lei Estadual entrou em vigor em 24 de junho de 2015 – data de sua publicação (art. 10).

Posteriormente, sancionou-se a Lei Estadual n° 18.907/2016, que, em seu art. 33, disciplinou que “Não se aplica e não gera efeitos o disposto no art. 3° da Lei n° 18.493, de 24 de junho de 2015, enquanto não forem implantadas e pagas todas as promoções e progressões devidas aos servidores civis e militares e comprovada a disponibilidade orçamentária e financeira”.

Vê-se, assim, que a novel legislação estadual restou por suspender, indefinidamente, os reajustes contemplados pela Lei anterior, além de criar nova condicionante para sua efetivação – comprovação de disponibilidade orçamentária e financeira.

Assim o fazendo, restou por ofender o direito adquirido dos servidores públicos estaduais, incidindo em manifesta inconstitucionalidade.

O Poder do Legislador não é absoluto. Ele está limitado à observância do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada (art. 5°, inciso XXXVI, da Constituição Federal).

A definição normativa do que seja direito adquirido é trazida pelo art. 6°, §2° da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro, que disciplina:

“§2º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem” (destaquei).

Na espécie, malgrado o direito aos reajustes conferidos pela Lei n° 18.493/2015 ainda não pudesse ser exercido por seus titulares no momento da promulgação da Lei n° 18.907/2016, estava ele (direito aos reajustes) sujeito a termo inicial pré-fixado (1° de janeiro de 2017 e 1° de maio de 2017).

E, nos exatos termos do art. 131 do Código Civil:

“Art. 131. O termo inicial suspende o exercício, mas não a aquisição do direito” (destaquei).

Dessa forma, com a entrada em vigor da Lei Estadual n° 18.493/2015 (estipulando reajustes com termo pré-fixo), passaram os servidores estatutários civis e militares do Executivo

Estadual a ter o direito adquirido a aludidos reajustes, de modo a revelar a inconstitucionalidade do art. 33, caput, da Lei Estadual n° 18.907/2016.

Não há que se confundir, aqui, vigência com efeitos financeiros. São situações distintas, vez que com a entrada em vigor da norma o reajuste previsto já passou a integrar a remuneração dos servidores, e, portanto, seu patrimônio jurídico, sendo que apenas seus efeitos financeiros tiveram o termo inicial postergado.

O aumento concedido e incorporado ao patrimônio jurídico dos servidores estaduais civis e militares do Poder Executivo passou a vigorar na data publicação da Lei 18.493/2015, qual seja: 25 de junho de 2015 e tinha como termo fixo para pagamento o mês de janeiro de 2017, caracterizando, portanto, um direito adquirido (art. 131, do Código Civil).

Em caso análogo, recentemente decidiu nossa Suprema Corte que “Vigentes as normas concessivas de aumentos de vencimento dos servidores públicos de Tocantins, nos novos valores passaram a compor o patrimônio de bens jurídicos tutelados, na forma legal diferida a ser observada. (…) O termo fixado, a que se refere o § 2° do art. 6° da Lei de Introdução ao Código Civil, caracteriza a aquisição do direito e a proteção jurídica que lhe concede a Constituição da República” (STF-ADI 4.013, Pleno, rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, DJe 19.04.2017).

Inconstitucional, assim, o disposto no art. 33, caput, da Lei Estadual n° 18.907/2016, devendo o Estado do Paraná implantar todos os reajustes previstos na Lei n° 18.493/2015, nas datas e formas ali previstas.

Por fim, não há falar em ofensa ao princípio da legalidade (Súmula Vinculante 37) ou da responsabilidade fiscal orçamentária, na medida em que o reajuste concedido decorre da própria lei, e aumentos derivados de decisão judicial se afiguram como exceções às regras de limitação orçamentária, (v. g. art. 22, § único, I da LC nº 101/2000).

Os valores vencidos deverão ser corrigidos monetariamente da data em que deveriam ser implantados, acrescidos de juros de mora contados da citação, com base nos índices oficiais aplicados às cadernetas de poupança.

Centrado em tais fundamentos e considerando o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial, para o fim de condenar o Estado do Paraná a: (i) realizar a implantação do reajuste na folha de pagamento da parte autora, no prazo de 30 dias após o trânsito em julgado; e (ii) pagar ao autor as diferenças decorrentes da ausência de reajuste pelo período de 01/01/2017 até a data de sua efetiva implantação, corrigidas monetariamente da data em que deveriam ter sido implantadas, acrescidos de juros de mora contados da citação, com base nos índices oficiais aplicados às cadernetas de poupança (art. 1º-F da Lei 9494/97).

Diante da redação da Súmula Vinculante 17 do STF os juros moratórios não incidirão durante o período de graça, compreendido entre a homologação dos valores devidos e a expedição do precatório ou requisição de pequeno valor.

Isentos do pagamento de custas e honorários advocatícios, nos termos do artigo 55 da Lei 9.099/95.

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

César Ghizoni
Juiz de Direito

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