EUA estatizam presídios enquanto Brasil pensa em privatizar para encarcerar mais

privatizacao_presidiosOs Estados Unidos fulminaram essa semana a tese do liberalismo ao anunciar o fim dos presídios privados. A estatização norte-americana é uma ducha de água fria nas pretensões do interino Michel Temer (PMDB), que planeja privatizar as penitenciárias brasileiras.

A proposta “faísca atrasada” de privatização dos presídios brasileiros está prevista na “Agenda Brasil” do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), cuja materialização se dá pelo projeto 513/2011, de autoria do senador Vicentinho Alves (PR-TO).

No início de março, em audiência na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado (CDH), especialistas e representantes de movimentos sociais, dos agentes penitenciários e da sociedade civil rejeitaram o referido projeto privatista.

O diretor-geral do Departamento Penitenciário Nacional, Renato Campos Pinto De Vitto, afirma que o Brasil ocupa o quarto lugar no ranking dos países com maior população carcerária do mundo. São cerca de 600 mil pessoas presas atualmente. Em 20 anos (1992-2012), essa população aumentou em 380%. O temor é de que, com a privatização, a taxa de crescimento aumente ainda mais.

Para o presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e penitenciária, Alamiro Velludo Salvador Netto, a crise do sistema prisional é resultado da política criminal brasileira de encarceramento em massa.

“Privatiza-se para que o poder privado consiga aumentar os seus lucros. Portanto, privatizar o sistema prisional significa buscar mais vagas; e buscar mais vagas significa buscar mais presos. E, nesse sentido, a privatização inexoravelmente vem com um projeto de aumento do número ou aumento do número de pessoas que compõem a população prisional”, apontou.

Economia

A Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB) também avalia que a ineficiência do sistema prisional não pode levar à privatização.

“O ser humano jamais pode ter sua dignidade aviltada, pois lucro e pena não combinam. Um sistema carcerário privatizado abre possibilidades para mais e maiores penas”, salientou Carlos Alves Moura, ao ler nota da CNBB sobre o tema.

Abaixo, leia matéria sobre o fechamento de presídios privados nos EUA:

Governo dos EUA decide fechar presídios privados federais

Por João Ozorio de Melo, do Consultor Jurídico

A degola dos presídios privados sob tutela federal foi finalmente anunciada nos EUA. Nesta quinta-feira (18/8), o governo dos EUA admitiu o que a comunidade jurídica já sabia há tempos: o sistema de presídios privados do país é pior do que o público. E custa mais caro. Portanto, não há razão para mantê-lo.

Em memorando que enviou ao diretor do Birô de Prisões dos EUA, que tornou público, a vice-procuradora geral do Departamento de Justiça, Sally Yates, escreveu, diplomaticamente, que “os presídios privados não oferecem o mesmo nível de serviços dos presídios operados pelo governo federal”.

As críticas sempre foram mais ácidas. Dizem que as operadoras de presídios privados só se preocupam com os lucros, enquanto as condições de encarceramento são as piores do país. Diversos relatórios mostram muitas situações de abuso e negligência com os presos. Telefones celulares são oito vezes mais confiscados e as taxas de assaltos por prisioneiros a outros prisioneiros e carcereiros são muito mais altas.

Sally Yates descreveu a situação com palavras mais amenas: “Elas simplesmente não fornecem os serviços correcionais, os programas e os recursos fornecidos pelos presídios púbicos, e não garantem nenhuma economia de custos para o país. E, como observado em um relatório recente do inspetor-geral do Departamento, não oferecem o mesmo nível de proteção e segurança”, ela escreveu.

“Os serviços de reabilitação de presos, tais como programas educacionais e treinamento profissional que os presídios públicos oferecem são ignorados pelos presídios privados. E esses serviços são essenciais para reduzir a reincidência no crime e melhorar a segurança a pública”, ela acrescentou.

Primeiro passo

Em seu memorando, a vice-procuradora geral instruiu o diretor do Birô de Prisões a não renovar os contratos com as operadoras de presídios privados, conforme vencerem, ou pelo menos reduzir substancialmente suas participações, de uma maneira consistente com a lei e com o declínio geral da população encarcerada. “Esse é o primeiro passo no processo de reduzir – e finalmente eliminar – o uso de presídios operados privadamente”, ela escreveu.

Esse é o primeiro passo para chegar, dentro de algum tempo, ao fim dos presídios privados sob tutela do governo federal. Mas não dos presídios privados sob tutela dos governos estaduais. Alguns estados poderão seguir o exemplo do governo federal, mas nem todos, segundo o The Washington Post e outras publicações.

No estado do Arizona, por exemplo, os presídios privados vão de vento em popa, diz a publicação local AZ Central. “Nossos líderes mantêm o romance com as operadoras de presídio privado. Eles gastaram cerca de US$ 200 milhões apenas nos últimos dois anos, para construir outro presídio privado. O governador Doug Ducy concedeu, recentemente, um subsídio de US$ 2,5 milhões ao GEO Group, que opera um presídio privado perto de Kingman – um grupo que, coincidentemente, é um doador para a campanha eleitoral do governador”, diz a publicação.

“Os presídios privados têm sido, há muito tempo, a vaca-sagrada da Assembleia Legislativa do estado. Lobistas bem conectados distribuem dinheiro para campanhas eleitorais para assegurar que seus interesses sejam defendidos. Um interesse, por exemplo, é que seus presídios estejam sempre lotados [para render mais dinheiro]. E que, se não estiverem lotados, sejam pagos como se estivessem, do mesmo jeito”, afirma a publicação.

Estudos do Departamento de Correições do estado mostraram que os custos de encarceramento de réus condenados nos presídios privados, de segurança média, são mais altos do que os dos presídios públicos, da mesma categoria. A resposta parlamentar foi a proibição de divulgar futuros estudos comparativos de custos, com o argumento de que eles são “falsificados”.

População carcerária

Dos 2,3 milhões de prisioneiros dos EUA, 193.461 estão em presídios federais e, desses, 22.164 em presídios privados. O restante paga suas penas em presídios estaduais, incluindo os privados, e em cadeias públicas.

Os presídios privados foram criados há cerca de uma década, porque a população carcerária cresceu desmedidamente à época. Dados oficiais mostram que, de 1980, mais ou menos na época da “guerra às drogas”, a 2013, a população carcerária explodiu em cerca de 800% nos presídios federais. Mas, desde 2013, com a revisão das políticas de sentenças e das diretrizes de sentenças para crimes relacionados a drogas, a população carcerária vem declinando de forma progressiva e constante.

As prisões federais abrigam réus que violaram leis federais e a Constituição, relacionadas, por exemplo, a tráfico de drogas, falência, direitos autorais, patentes, roubos de bancos, casos em que os Estados Unidos é uma das partes etc. As prisões estaduais abrigam réus que violaram leis estaduais, relacionadas, por exemplo, a homicídios, assaltos, roubos, furtos, estupros, quebra de contratos, disputas familiares, etc.

Com informações da Agência Senado

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