Enio Verri: A democracia brasileira está ameaçada pelos retrocessos de Temer

michel_temer_golpe_enio_verriO deputado Enio Verri (PT-PR), em sua coluna desta terça-feira (21), afirma que o interino Michel Temer (PMDB) põe em risco a democracia quando aprofunda a política de retrocessos, que consiste na retirada de direitos dos trabalhadores. “Esqueça a Dilma e o PT, o que estão em jogo são: a democracia, a Constituição Federal e uma série de direitos fragilmente conquistados em 30 anos”, frisa o colunista. Abaixo, leia, comente e compartilhe a íntegra do texto:

Enio Verri*

Esqueça a Dilma e o PT, o que estão em jogo são: a democracia, a Constituição Federal e uma série de direitos fragilmente conquistados em 30 anos. O espaço não permite descrever todos os crimes de lesa-pátria das medidas anunciadas e tomadas, nos últimos 30 dias, pelo provisório governo. Educação, saúde, moradia, trabalho, lazer, identidade de gênero, cultura, tudo está em desconstrução pelo consórcio golpista formado pelo Executivo e a maioria do Congresso Nacional.

Para ficar apenas no campo da Saúde Pública, os prejuízos da mais nova proposta do governo interino, contido na PEC 143/2015, são os mais prejudiciais a população e para o desenvolvimento do País. Limitar os investimentos públicos ao índice da inflação do ano anterior, por 20 anos, atinge fundamentalmente milhões de crianças que deixaram de entrar para as estatísticas da secular mortalidade infantil brasileira.

O Brasil foi um dos 62 países a alcançar a meta do milênio, estabelecido pela ONU, de reduzir em dois terços os índices de mortalidade infantil. Entre 1990 e 2015, saímos de 61 para 16 mortes registradas por mil nascimentos. Queda de 73%. Já entre os anos de 2002 e 2012, descemos de 25,3 para 12,9 mortes por mil nascidos vivos, ou 3,5% da população. É o ideal? Não, mas o progresso é inegável. Ainda segundo a ONU, entre 2002 e 2014, a fome no Brasil diminuiu em 82%.

Essas e outras vitórias da nação estão sob iminente risco e o Brasil pode retroceder em mais de 40 anos, a vingar as propostas do governo provisório Temer. Serão atingidos, independentemente da coloração ideológica, cerca de 80% da população brasileira, parcela assistida pelo Sistema Único de Saúde (SUS) que terá cortada mais da metade de sua capacidade de alcance de cobertura.

Economia

Entre os anos de 2003 a 2015, o governo federal investiu R$ 100 bilhões em Saúde e isso está longe de ser o necessário. Caso a proposta do interino Temer fosse aplicada, no mesmo período, os investimentos não teriam passado de R$ 55 bilhões. 48% menos.

O Brasil está caminhando a passos largos para a negação institucional de direitos fundamentais estabelecidos na CF de 1988. Entre 2002 e 2013, os investimentos em saúde pública partiram de R$ 28 bilhões para R$ 106 bilhões, 4,7% do PIB. O percentual ainda é pequeno se comparado a outros países com sistemas universais de saúde, como Canadá, 7,6%, Uruguai, 6,1%, ou a Argentina,4,9%.

Mesmo com o subfinanciamento, o SUS pode atender aos mais de 200 milhões de pessoas. Atualmente, realiza cerca de 1,4 bilhão de consultas médicas, 11,4 milhões de internações e 97% dos procedimentos mais complexos da medicina. Entre 2002 e 2005, aumentou em 33% o número de transplantes de órgãos e tecidos. Além de ser o maior sistema público de transplante do mundo, garante acesso a todas as vacinas recomendadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e a medicamentos de alto custo para diversos tratamentos.

Um dos primeiros anúncios do provisório ministro Ricardo Barros foi o de que reduziria a presença de médicos estrangeiros, no Programa Mais Médicos. Barros vai de encontro à MP 723, assinada pela presidenta Dilma Rousseff, antes de ser ilegal e injustamente afastada. A MP prorroga por três anos o programa criado em 2013. Atualmente, mais de 18 mil médicos atendem a 63 milhões de brasileiros, em mais de quatro mil municípios e em 34 distritos indígenas.

Segundo dados do Tribunal de Contas da União (TCU), em 1,8 mil municípios pesquisados, houve um aumento de 33% no número de consultas e 22% no de visitas domiciliares. Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) indica satisfação ou muita satisfação com o atendimento médico do Programa, em 95% dos usuários entrevistados. Dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e Sistema de Informação sobre Nascidos Vivos (SINASC) mortalidade, que são   sistemas de informações oficiais do Sistema Único de Saúde (SUS), revelam que 72 cidades do Piauí zeraram a mortalidade infantil, em 2015.

Os cortes e restrições se darão em todos os programas públicos de acesso à saúde para os mais necessitados, como o Farmácia Popular, presente em 4,4 mil municípios e que atende a cerca de 10 milhões de brasileiras e brasileiros. Os grupos políticos à frente do governo provisório não deixam dúvidas quanto a quem representam, nem mesmo quando refere-se ao programa Bolsa Família, premiado mundialmente como um bem-sucedido programa de transferência de renda.

Segundo relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), o Bolsa Família foi fundamental para a situação de extrema pobreza no Brasil ser reduzida de 25,5% para 3,5% da população, entre os anos de 1990 a 2012. Portanto, não há motivos para acreditar no discurso de salvação de um governo, quando suas atitudes são todas em sentido contrário ao dos interesses da população e do desenvolvimento soberano do Brasil.

O futuro de qualquer nação é construído por seu povo. Qual será o futuro do Brasil com o deliberado retrocesso em garantias constitucionais e a desconstrução de qualquer possibilidade de desenvolvimento da nação, com restrições de acesso à saúde, por exemplo? Isso para não falar de políticas públicas para a educação, ciência e tecnologia e cultura, que estão sendo igualmente destruídas.

*Enio Verri é deputado federal, presidente do PT do Paraná e professor licenciado do departamento de Economia da Universidade Estadual do Paraná. Escreve nas terças sobre poder e socialismo.

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