Governo interino de Michel Temer reencarna a República Velha

michel_temerO colunista Bruno Meirinho afirma que ascensão do presidente interino, Michel Temer, significou uma marcha à ré (retrocesso) na História em quase 130 anos. “O governo Temer resgata a República Velha em toda a sua essência, a começar pela ausência de mulheres no ministério”, crava o analista, que vê o interino como a “reencarnação” daquele período da política do café com leite da política brasileira. Meirinho observa ainda que, antes de 1930, as mulheres não tinham direito ao voto nem de participar da política que era tarefa de “notáveis”. Abaixo, leia, opine e compartilhe a íntegra da coluna:

O governo Michel Temer: a reencarnação da República Velha

Bruno Meirinho*

Sejamos francos, a questão brasileira ainda está nos anos 1930. Mesmo que nossa memória recente remonte às polêmicas da ditadura militar, e a celebração da necessária democratização a partir dos anos 1980, persiste uma divisão política no Brasil que remonta à República Velha, período da nossa política que tem início na proclamação da República, em 1889 e vai até a Revolução do Estado Novo de 1930.

Ainda não deixamos de ser um país na encruzilhada de ser governado pelas oligarquias do café com leite, de um lado, e pelo populismo, de outro.

O governo Temer resgata a República Velha em toda a sua essência, a começar pela ausência de mulheres no ministério. O presidente interino atribui a falha às circunstâncias: “é o ministério ‘possível’”. A verdade é que se trata do ministério do atraso.

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Como se sabe, antes dos anos 1930, as mulheres não tinham direito nem mesmo ao voto, razão pela qual toda a elite política era formada por homens. Os “notáveis” celebrados por Temer. O ministério deste governo golpista inaugurado em 12 de maio de 2016 é a própria expressão do “toma lá, dá cá”, tão verbalizado pela mídia.

Mas é cômico ver os analistas convidados pelos grandes veículos de comunicação celebrando a “oportunidade” do novo governo, sob o comando de Temer, reconfigurar a política deixando de lado a prática do “toma lá, dá cá”. É justamente o oposto, o governo foi entregue nas mãos de um especialista em articulação política. A verdade é que os setores monopolistas da mídia exigem um governo do toma lá dá cá.

Na véspera do dia 13 de maio, quando o país celebraria 128 anos da abolição da escravidão, proclamada ainda sob o jugo da monarquia, o novo ministério não é ocupado por nenhum negro. Aliás, a pasta responsável pelas políticas de igualdade racial foi extinta.

Novamente, voltamos à República Velha, fundada pela aliança entre os militares e os fazendeiros insatisfeitos com a política de abolição da escravidão sem indenização aos proprietários. Seguimos aguardando uma política para a igualdade racial, mas o governo sinaliza que só vai ocorrer depois da satisfação dos fazendeiros.

A despeito da relativa diversidade regional no ministério de Temer, trata-se apenas de um governo loteado pelas cúpulas partidárias a partir do centro do poder. Uma reedição moderna da política dominada pelas oligarquias de Minas Gerais e São Paulo.

A saída melancólica de Dilma da posição máxima do país, no dia 12 de maio, anuncia o golpe consumado, quase irreversível diante da votação qualificada obtida pelos golpistas. Em uma noite, tal qual uma máquina do tempo, voltamos 100 anos atrás. Acordamos nos anos 1910, sem ministério da educação e sem constituição federal.

Estamos sob um governo eleito pelo voto censitário dos parlamentares, avesso ao voto direto popular.

Para não perder o humor, há um ministério não anunciado por Michel Temer, mas que vai existir durante o período em que o interino governar: o ministério do “papagaio de pirata”. O Deputado Federal Francisco Floriano, o famoso “carequinha” que ficou ao lado da tribuna de votação do impeachment na Câmara dos Deputados durante toda a sessão, garantindo sua presença no enquadramento da câmera que transmitia ao vivo todos os votos, estava também presente no evento de posse dos novos ministros. Parece que nem foi convidado para a cerimônia, mas, com talento, conseguiu um lugar logo atrás de Michel Temer, conquistando assim mais alguns minutos de fama. É a República Velha do século XXI.

*Bruno Meirinho é advogado, foi candidato a prefeito de Curitiba. É o coordenador local da Fundação Lauro Campos, instituição de formação política do PSOL. Ele escreve no Blog do Esmael às sextas-feiras sobre “Luta e Esperança”.

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