Mal biografado, Zé Dirceu se diz contra a censura

do Brasil 247

Ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu fala pela primeira vez sobre o livro "Dirceu", escrito pelo jornalista Otávio Cabral, de Veja. "Fui vítima !“ isso mesmo, vítima !“ de uma das piores biografias recentemente publicadas", diz ele. "Não foi autorizada, porém o mais grave não é o fato de ter sido produzida à  revelia, mas sim o de oferecer aos leitores um livro repleto de erros !“ graves e em dezenas !“, inverdades, impropriedades e com trechos de pura ficção". Apesar disso, ele afirma ser contrário à  proibição defendida por artistas, mas condena o que chama de "intolerância" da mídia ao debate, citando ainda uma capa recente de Veja que apontou Caetano, Chico, Gil e Roberto Carlos como censores.
Ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu fala pela primeira vez sobre o livro “Dirceu”, escrito pelo jornalista Otávio Cabral, de Veja. “Fui vítima !“ isso mesmo, vítima !“ de uma das piores biografias recentemente publicadas”, diz ele. “Não foi autorizada, porém o mais grave não é o fato de ter sido produzida à  revelia, mas sim o de oferecer aos leitores um livro repleto de erros !“ graves e em dezenas !“, inverdades, impropriedades e com trechos de pura ficção”. Apesar disso, ele afirma ser contrário à  proibição defendida por artistas, mas condena o que chama de “intolerância” da mídia ao debate, citando ainda uma capa recente de Veja que apontou Caetano, Chico, Gil e Roberto Carlos como censores.
Pela primeira vez, o ex-ministro José Dirceu falou sobre o livro “Dirceu”, escrito pelo jornalista Otávio Cabral, editor de Veja. Segundo ele, trata-se uma obra repleta “erros”, “impropriedades” e “inverdades”. Ou seja, uma obra de ficção, apresentada como biogafia não autorizada.

No entanto, apesar das supostas falhas do livro, Dirceu se coloca contra a restrição, defendida por alguns artistas, a biografias não autorizadas. “Em nenhum momento cogitei proibir sua publicação porque acredito e aposto na liberdade de expressão em regime democrático”, diz ele.

O que não significa que Dirceu se coloque contra o debate relacionado ao tema privacidade versus liberdade de expressão. Segundo ele, há uma intolerância dos meios de comunicação, que se mostram refratários a qualquer tipo de regulação.

Leia abaixo seu artigo publicado na Folha:

Entre tapas e beijos

A crítica feroz ao Procure Saber se traduz, na prática, como o medo atávico de nossa mídia a qualquer proposta que signifique regulação

Economia

Fiquei estarrecido –e sei que não deveria– com a agressividade da resposta de grande parte da mídia e mesmo de alguns biógrafos à s propostas apresentadas por artistas do Procure Saber no debate sobre as biografias sem autorização.

Embora me espante com o ataque, sou contra a bandeira levantada pelo grupo porque acredito que o direito à  liberdade de expressão e o veto a qualquer forma de censura de natureza política, ideológica ou artística, como diz claramente o artigo 220 da Constituição, é um bem maior que se sobrepõe à  interpretação de proteção à  privacidade do cidadão comum estabelecida pela reforma do Código Civil, em 2001.

Sabemos que artistas e políticos, ao assumirem tais papeis de destaque em sociedades democráticas, abdicam de seu direito à  privacidade absoluta.

A crítica à  causa do Procure Saber deve, portanto, ficar restrita à  saudável esfera do debate das ideias. O que se viu nos últimos dias foi uma reação de intolerância e, como se dizia antigamente, de muita patrulha ideológica, na imprensa e nas redes sociais.

Exemplo maior é a reportagem de capa da revista “Veja” sobre o tema na semana passada.

Fui vítima –isso mesmo, vítima– de uma das piores biografias recentemente publicadas. Mas nada me anima a ser favorável à  atual proibição inscrita no nosso Código Civil que exige autorização do retratado e da família.

A “biografia” escrita sobre mim é um bom exemplo para o debate em questão. Não foi autorizada, porém o mais grave não é o fato de ter sido produzida à  revelia, mas sim o de oferecer aos leitores um livro repleto de erros –graves e em dezenas–, inverdades, impropriedades e com trechos de pura ficção.

Do primeiro ao último capítulo, lê-se uma história que não condiz com a verdade. Jornalistas e críticos a debateram, alguns enaltecendo, outros criticando.

Em nenhum momento cogitei proibir sua publicação porque acredito e aposto na liberdade de expressão em regime democrático. Por ela lutei toda a minha vida e ainda luto. Acredito no debate de ideias e no contraditório. Acredito na lei e na justiça. Por ela luto e lutarei sempre.

Mas é preciso garantir tanto a liberdade de expressão quanto a reparação em caso de ofensa. Deve-se garantir plena isonomia entre o direito de publicar biografias e o direito de resposta e proteção à  honra –o que em boa hora a Câmara dos Deputados parece fazer no debate do projeto do deputado do meu partido Newton Lima (SP) que libera biografias sem autorização.

No Brasil, a Justiça não é nada cega em se tratando de mídia e é raro se observar a garantia ao direito de resposta. O receio do Judiciário de colocar uma empresa de comunicação no banco dos réus se torna ainda mais latente em tempos de exibição pela TV dos julgamentos da suprema corte. Os processos de reparação não andam e raramente um jornal ou uma revista é condenado, assegurando o direito de resposta a quem teve sua honra ameaçada em reportagens tendenciosas.

Mais uma vez cito o meu próprio caso, na invasão de meu apartamento residencial em um hotel de Brasília por um jornalista de “Veja”. Ele não foi acusado formalmente, apesar de réu confesso, sob o argumento de que a camareira impediu que o crime se consumasse. Imagine se fosse o contrário: eu tentando invadir o apartamento de um jornalista?

No caso das biografias não autorizadas, é preciso deixar a patrulha ideológica de lado e privilegiar o debate com o objetivo de assegurar o pleno cumprimento do Estado democrático de Direito.

O veto à s biografias é, antes da defesa da privacidade do biografado, uma censura velada à  liberdade de expressão, conquista que a sociedade brasileira alcançou depois de anos de regime militar.

Esse é o debate que deve ser feito. à‰ preciso entender que a crítica feroz ao Procure Saber se traduz, na prática, como o medo atávico de nossa mídia a qualquer proposta que signifique regulação, sob o argumento falso de que seria censura e controle da informação. Dessa forma, ela fica livre para atacar a honra alheia, sem direito de resposta e proteção da imagem, como manda a Constituição de 1988, no mesmo nível de proteção da liberdade de imprensa e de informação.

JOSà‰ DIRCEU DE OLIVEIRA, 67, é advogado. Foi ministro-chefe da Casa Civil (governo Lula) e presidente do PT. Teve seu mandato de deputado federal pelo PT-SP cassado em 2005

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