por Celso Nascimento, via Gazeta do Povo
Quem ingressa como soldado da Polícia Militar é obrigado a passar por um processo de formação na Academia Militar da Corporação. Nos primeiros 40 dias !“ que na caserna todos denominam de quarentena! com certo misto de ironia na fala !“, os recrutas desaprendem tudo que aprenderam na vida e aprendem uma só lição: dizer alto sim, senhor!!.
A quarentena é, pois, o período em que rapazes de 18,19 ficam sabendo o que significa a tal disciplina militar com todos os seus horrores. Somente depois disso, quem conseguir sobreviver é que passa por um curso de alguns poucos meses no qual são ministradas noções de Direito, psicologia, contenção, armas, tiro, muito tiro… E, logicamente, a continuar dizendo o indispensável sim, senhor!!
Um jovem de 22,23 anos, saído da universidade com um canudo de engenheiro ou bacharel em direito, certamente teria mais dificuldades de se submeter à absurda dureza da quarentena em comparação com outros rapazes que, sem estudos suficientes, precisam se agarrar à vida militar porque lhes são mais estreitas as opções de progredir na competitiva vida civil.
Teria sido a suposta dificuldade de domar! recrutas universitários que teria levado o governador Beto Richa a se convencer de que a Polícia Militar e a população estariam melhor servidas com soldados que, no máximo, concluíram o ensino médio? E que basta a tal quarentena e umas poucas e precárias noções jurídicas e psicológicas para assumir as ruas e enfrentar a violência e os conflitos sociais, agindo, perante tais situações, como seus primeiros juízes!?
Esta pode ser uma das razões que levaram Richa a convencer obedientes deputados a votar pela derrubada da norma constitucional !“ que eles mesmos aprovaram há dois anos !“ de exigir curso superior para ingresso na PM. Mas outra razão teria sido mais urgente: o governo queria incorporar logo os 2 mil concursados de 2010 que ainda não haviam sido chamados. O concurso, além de já ter caducado!, é questionado na Justiça também por já não atender à exigência do curso superior. Há um mandado de segurança proposto pela Amai (associação que congrega os milicianos) em trâmite no Judiciário, ainda não julgado.
Sob o risco de a Justiça reconhecer a irregularidade do aproveitamento desses concursados remanescentes e não tendo aberto até agora um novo concurso, Beto preferiu o caminho mais curto e do fato consumado: revogar a exigência constitucional do curso superior. Com isso, a PM acolhe imediatamente 2 mil novos recrutas que ainda passarão pelo teste do sim, senhor!!. Aumentou seu efetivo? Não, senhor! !“ nem um pouco, pois nesses dois anos que o governo levou para chamar os aprovados, deu baixa da corporação quase o mesmo efetivo, por aposentadoria, vontade própria ou morte.
Portanto, mera reposição que sequer serve para melhorar o padrão educacional e civilizatório da Polícia Militar. Enquanto isso, numa aparente tentativa de compensação, o governo decretou no último dia 9 a criação na Academia do Guatupê de um curso de graduação de quatro anos em segurança pública !“ pelo qual receberão canudos como tecnólogos apenas os que, bem antes, aprenderam a dizer sim, senhor!!.
Jornalista e Advogado. Desde 2009 é autor do Blog do Esmael.