Mídia e oposição viram a redução dos juros como um crime do BC

Política e política econômica

por Marcos Coimbra*, via Correio Braziliense

Sociólogo Marcos Coimbra.
Foi com surpresa que o mercado reagiu à  decisão do Banco Central de reduzir a taxa básica de juros em 0,5%, na reunião do Comitê de Política Monetária realizada na quarta-feira. Na grande imprensa, mais que surpresa, houve estupefação. Parece que todos tinham absoluta certeza de que a taxa seria mantida em 12,5% até, pelo menos, a reunião marcada para setembro.

Não foi a primeira vez e, certamente, não será a última que o mercado aposta em uma coisa e acontece outra. Faz parte de sua natureza tentar antecipar eventos futuros, para obter o melhor resultado possível. Por mais competentes que sejam seus analistas, no entanto, isso não funciona em 100% dos casos. Iria longe quem procurasse contabilizar as situações em que foram incapazes de adivinhar o que ia ocorrer.

Aliás, nos bancos e consultorias, ninguém deve ter sido demitido por não ter conseguido imaginar que o BC traria a taxa de 12,5% para 12%. Ou que o fizesse agora e não daqui a um mês. Se a decisão representasse uma mudança extraordinária, não detectada pelos profissionais, talvez rolassem cabeças. Do jeito que foi, nenhum incompetente precisou ser mandado embora.

Na imprensa, a decisão foi tratada quase como se o BC tivesse cometido um crime. Ao noticiá-la, os jornais paulistas e cariocas usaram expressões normalmente reservadas à s páginas policiais: “BC alega crise …”, “Por mais que tente se explicar….”, “BC tenta justificar…”. Não é assim que se fala de alguém flagrado em atitude suspeita?

Economia

O curioso nas reações da mídia é que elas parecem dizer que só existe uma maneira de fazer política econômica. Que ela a conhece e o governo não. Que, em Brasília, todos são cegos.

à‰ no primeiro ano de escola que se aprende não existirem certezas na política econômica.

O bê-á-bá da economia ensina que ela, como todas as políticas públicas, é um exercício de escolhas. Ninguém consegue dizer, com segurança, o que é melhor, a cada momento, para um país. Não existe uma só resposta, pois não há um diagnóstico consensual sobre o que atrapalha e o que auxilia uma economia da complexidade da brasileira a crescer e se manter próspera.

Depois de ter passado os últimos anos se queixando da política de juros altos praticada pelo BC, nossos comentaristas não hesitaram em criticar a redução, usando o argumento de que a hora é inadequada.

Lembram os que, na época do “milagre econômico”, diziam concordar com a distribuição de renda, mas só “depois de o bolo crescer”. Enquanto isso, os pobres que esperassem. Seria como os juros: devem cair, mas só depois de a inflação ser controlada.

O problema nesse raciocínio é que, talvez, o único caminho para chegar à  efetiva redução seja fazer a redução (à  semelhança do crescimento, que só veio depois de começar a distribuição de renda). Não são poucos os economistas que pensam dessa maneira.

Salvo alguns “profissionais do mercado”, o país reagiu bem à  decisão. O Brasil real não entrou em estado de choque após o anúncio.

Os principais políticos da oposição preferiram não se manifestar. Seria estranho vê-los defendendo a manutenção dos juros nos patamares atuais, tendo-os chamado (com razão) de estratosféricos. Por isso, apenas escalaram o líder do PSDB na Câmara para uma declaração ex officio.

Empresários e sindicalistas, quase unanimemente, mostram-se a favor. Os consumidores vão agradecer. Os investidores na bolsa gostaram.

O que foi resolvido poderia ter sido adotado se Armínio Fraga, ex-presidente do BC no governo FHC, ainda estivesse lá. Semana passada, ele havia elogiado o que chamou “melhora no mix da política macroeconômica” do governo Dilma: abrir espaço para fazer os juros caírem por meio do controle de despesas públicas, sem se limitar à  ortodoxia anti-inflacionária.

Não parece haver motivo para descrer da autonomia do BC quando ele tomou a decisão, embora seja óbvio que a redução era um desejo (há muito anunciado) da presidente. Ou a única forma de ser livre era manter os juros onde estavam?

Não autônomo ele seria se continuasse preso a uma receita de política econômica que só “o mercado” (com seus porta-vozes) recomenda para o país.

* Marcos Coimbra é sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi.

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