Vanhoni: “a administração do prefeito Rafael Greca não tem norte humano”

Angelo Vanhoni duela com o prefeito Rafael Greca acerca da concepção da cidade de Curitiba.
O presidente do PT municipal de Curitiba, Angelo Vanhoni, em seu segundo artigo, critica o prefeito de Curitiba Rafael Greca (DEM) e o iguala ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Para o dirigente petista, após o golpe de 2016 e da eleição de Bolsonaro, vivemos um contexto bastante diferente, com o fim da valorização do salário mínimo, a perda de direitos, a inacreditável e real volta da censura, o falso moralismo nos costumes, a perversão de um Estado que deveria ser social e é apenas policial.

“Em Curitiba, a administração do prefeito Rafael Greca não tem norte humano, sem perspectiva de desenvolvimento de amplas parcelas da população, nos mesmos bairros que não estão contemplados com os aspectos positivos da cidade, em estado de verdadeiro abandono”, escreve Vanhoni.

Segundo Vanhoni, como nas gestões municipais no período da ditadura, o prefeito atual se contenta em trabalhar o aspecto físico da cidade. “O asfalto, o embelezamento superficial, os mesmos parques de outrora assistem ao abandono das políticas para a primeira infância e o ensino fundamental, ao descalabro na saúde pública, ao preço extorsivo do ônibus.”

Rafael Greca ainda levou mais uma sabugada do presidente do PT curitibano acerca do “agravamento do autoritarismo na área da cultura, manifesto, sobretudo, pela tentativa de proibição das apresentações artísticas nas ruas de Curitiba, inaceitável tentativa de censurar centenas de artistas em nossa cidade.”

O petista afirma que o prefeito Rafael Greca, aliás, andou se assumindo em certas declarações, ao falar em “esquizofrenia sindical” ou considerar que o ditador fascista italiano Benito Mussolini só foi “autoritário nos último sete anos de seu governo”.

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Angelo Vanhoni lamenta que “a nossa cidade, que bem ou mal já apareceu com soluções de vanguarda para o resto do país, transmite agora uma imagem de conservadorismo e alienação, quando não de simples autoritarismo.”

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Leia a íntegra do artigo de Angelo Vanhoni:

Curitiba rebelde

Ângelo Vanhoni*

Ali entre o final da década de 1970 e o início da década de 1980, eu, morador de Curitiba, ainda era estudante e, como até hoje, vivia preocupado com as injustiças sociais, em nossa cidade, no país e no mundo.

Num certo dia, reunindo-me com artistas e outros estudantes, nos encontramos com o Paulo Leminski, que nos mostrou uma canção, que viria a ser gravada pelo Blindagem e pelo Paulinho Boca de Cantor, uma canção que dizia:

Dois namorados olhando o céu
chegam à mesma conclusão:
mesmo que a Terra não passe da próxima guerra,
mesmo assim valeu.
Valeu encharcar esse planeta de suor,
valeu esquecer as coisas que eu sei de cor,
valeu encarar essa vida que podia ser melhor.
Valeu, valeu, valeu.

Naquele contexto, esses versos representavam a sensação que envolvia a maioria de nós, jovens em Curitiba. Apesar dos problemas, havia certo entusiasmo com o país, a cidade, o mundo. Curitiba era muito frequentada por artistas, havia a propaganda de transformações urbanas, incentivada pelos governos do Lerner. Tínhamos nossa crítica, claro, válida até hoje, sobre o acesso ao transporte público, etc., sobre o direito a usufruir da cidade, que a prefeitura e suas gestões arquitetônicas não privilegiavam a vida humana, a troca entre as pessoas, isso sempre restrito a um pequeno público da cidade, nunca chegando aos bairros mais distantes, que, afinal, concentram a grande maioria da população.

Passaram-se anos, muitas mudanças, o Brasil se redemocratizou, tivemos conquistas sociais nos governos de Lula e Dilma, avanços importantes, na recuperação do poder aquisitivo do povo, programas de inclusão na educação, como o ProUni, que beneficiou mais de dois milhões de jovens de famílias de renda até três salários mínimos, inclusão através de cotas raciais e sociais.

Hoje, entretanto, após o golpe de 2016 e da eleição de Bolsonaro, vivemos um contexto bastante diferente, com o fim da valorização do salário mínimo, a perda de direitos, a inacreditável e real volta da censura, o falso moralismo nos costumes, a perversão de um Estado que deveria ser social e é apenas policial.

E diante desse quadro, um sentimento negativo prevalece nos círculos culturais e populares.

Em Curitiba, a administração do prefeito Rafael Greca não tem norte humano, sem perspectiva de desenvolvimento de amplas parcelas da população, nos mesmos bairros que não estão contemplados com os aspectos positivos da cidade, em estado de verdadeiro abandono. Como nas gestões municipais no período da ditadura, o prefeito atual se contenda em trabalhar o aspecto físico da cidade. O asfalto, o embelezamento superficial, os mesmos parques de outrora assistem ao abandono das políticas para a primeira infância e o ensino fundamental, ao descalabro na saúde pública, ao preço extorsivo do ônibus.

E, ainda mais, o agravamento do autoritarismo na área da cultura, manifesto, sobretudo, pela tentativa de proibição das apresentações artísticas nas ruas de Curitiba, inaceitável tentativa de censurar centenas de artistas em nossa cidade. O prefeito Rafael Greca, aliás, andou se assumindo em certas declarações, ao falar em “esquizofrenia sindical” ou considerar que o ditador fascista italiano Benito Mussolini só foi “autoritário nos último sete anos de seu governo”.

E o que é pior: a nossa cidade, que bem ou mal já apareceu com soluções de vanguarda para o resto do país, transmite agora uma imagem de conservadorismo e alienação, quando não de simples autoritarismo. É triste, mas hoje, quando viajamos e nos apresentamos como curitibanos/as, as pessoas progressistas, aquelas que valorizam a liberdade, a igualdade, nos olham e dizem (ou pensam): “puxa, você é da terra do Moro e do Dallagnol”. Da perspectiva do amor e do progresso futuro humano, acabamos vistos com esse olhar desconfiado.

Os giros deste mundo – esférico – nos trouxeram, em resumo, de volta a um ponto semelhante ao dos anos 1970, de resistência a um entorno autoritário, que parece forte e que almeja nos apequenar. Um contexto diante do qual nossa resposta deve ser igualmente semelhante, baseada na resistência e na confiança.

Afinal, mesmo diante do niilismo e da fragmentação cultural que a atual realidade e o governo retrógrado e nefasto do Bolsonaro que ataca os mais elementares direitos da vida democrática, a nós, a esquerda, os partidos e organizações sociais, resta transformar esse niilismo em resistência ativa.

A mesma resistência cultural que encheu de blocos e escolas de sambas as ruas do carnaval e do pré-carnaval de Curitiba.

Me contaram que o Paulo Leminiski ouvia sempre a conhecida canção My way, composição de Paul Anka, gravada por Frank Sinatra, mas regravada em punk rock pelo Sex Pistols. Na letra, o eu-lírico admite que sua vida teve muitas dificuldades, obstáculos, golpes, que cometeu erros e às vezes “mordeu mais do que podia mastigar”. Mas igualmente afirma que enfrentou tudo isso “e ficou de pé”, afirmando aquilo que de fato sentia e não se expressando com “as palavras de alguém que se ajoelha”.

Na voz de John Lydon, vocalista dos Sex Pistols, esses versos ecoam a pulsão de toda rebeldia própria da juventude: na vida você deve fazer tudo aquilo em que você acredita e lutar pelo sonho de construir um mundo mais livre e justo.

Esse é o nosso chamado para todos aqueles e aquelas que querem mudar a vida, melhorar a sociedade no sentido da liberdade e da igualdade.

Foi possível nos anos da ditadura, que tão difíceis eram. E será possível hoje. Para nós, valeu e ainda mais valerá!

*Angelo Vanhoni, ex-deputado federal, é presidente do Diretório Municipal do PT- Curitiba​