Reforma da previdência e o retorno da “Lei da Gargalhada”

O deputado Requião Filho (PMDB) faz uma analogia entre a reforma da previdência de Michel Temer e a “Lei da Gargalhada”, de 1885, que fingia abolir os trabalhadores escravos. “Da mesma forma que a “Lei do Sexagenário” era inócua, pois não havia a quem ainda vivo beneficiar, o alargamento da idade mínima para se aposentar e a fixação de 49 anos de contribuição para usufruir do benefício, também ultrapassam a expectativa média de vida de milhões de brasileiros”, compara o colunista.

Requião Filho também convoca audiência pública sobre o tema no dia 31 de março, às 9h, na Assembleia Legislativa, com a presença dos três senadores paranaenses — Alvaro Dias (PV), Gleisi Hoffmann (PT) e Roberto Requião (PMDB).

Reforma da previdência e o retorno da Lei da Gargalhada

Requião Filho*

A capacidade das classes dirigentes de, ao longo da história, reprisar o grotesco sempre com um misto de sadismo e crueldade, é inesgotável. Em 1885, quando a pressão para que os escravos negros fossem finalmente libertados, já que éramos o último país dito “civilizado” que ainda escorava sua economia na senzala, os escravocratas fizeram uma concessão: alforriar os negros com mais de 60 anos. A tal da “Lei do Sexagenário” foi imediatamente apelidada de “Lei da Gargalhada”, porque foi com uma amarga gargalhada que os abolicionistas e os brasileiros de “boa índole” receberam a novidade.

Por que a amargura e a decepção?

Economia

Porque a idade média vivida pelos escravos brasileiros era de 30 anos; e em raros, raríssimos casos, atingiriam os 60 anos e a tão sonhada “liberdade”. Pior: seriam imediatamente libertos apenas os escravos com 65 ou mais; os com 60 anos, teriam que trabalhar mais três anos, para indenizar os seus proprietários. Daí a gargalhada que lei provocou.

Pois bem, 132 anos depois, estamos diante de uma nova “Lei da Gargalhada”, a Reforma da Previdência. Da mesma forma que a “Lei do Sexagenário” era inócua, pois não havia a quem ainda vivo beneficiar, o alargamento da idade mínima para se aposentar e a fixação de 49 anos de contribuição para usufruir do benefício, também ultrapassam a expectativa média de vida de milhões de brasileiros.

Não se fala aqui da expectativa de vida de habitantes do Norte e do Nordeste, sabidamente menor que a média nacional. Fala-se do tempo médio de vida nos distritos de São Paulo, nos bairros de Curitiba, nas favelas e nos subúrbios do Rio de Janeiro.

Vejam! O “Mapa da Desigualdade” de São Paulo, com base em dados do IBGE/2016, aponta que, em alguns distritos paulistanos, a expectativa de vida fica entre 50 e 55 anos. Em áreas populosas, tais como Cidade Tiradentes, Anhanguera, Jardim Ângela, Grajaú, Iguatemi, o tempo médio de vida não alcança os 60 anos. E em Cidade Tiradentes, por exemplo, na zona leste da Capital paulista, os moradores têm a possibilidade de viver pouco mais de 53 anos.

Em 38% dos distritos paulistanos, o tempo médio de vida não chega aos 65 anos propostos pela Reforma da Previdência. Quer dizer, só na cidade de São Paulo, alguns milhões de brasileiros vão morrer antes de se aposentar.

A Reforma da Previdência é a nova versão da Lei dos Sexagenários, a Lei da Gargalhada. O relator de hoje não se diferencia em espírito e na concepção de sociedade dos deputados e senadores, especialmente fluminenses, que produziram a lei de 1885.

Enquanto um Almeida Pereira, um Nébias, ou um Almeida Reis, anunciava o mergulho do Brasil no caos, na falência, no colapso das finanças públicas e privadas naquela época, caso o Brasil libertasse os escravos, o relator dos tempos atuais despreza os trabalhadores ao dizer que a “aposentadoria é subsistência. Quem quiser ter uma vida melhor que faça outro tipo de pensão”.

Escapa aos neo-escravocratas que a Previdência é o maior programa social do Brasil e que esse programa custa ao país infinitamente menos que o rentismo, que o pagamento de juros, que a usura do capital financeiro.

Quando até mesmo o FMI e o Banco Mundial recomendam o abandono do radicalismo neoliberal e a preservação das políticas sociais, o atual governo brasileiro escolhe o caminho que, mais uma vez, atende o interesse das classes endinheiradas, dos financistas, dos rentistas, dos especuladores, dos sonegadores, dos que mantêm trilhões de dólares de dinheiro mal havido em paraísos fiscais.

Ao invés de sacrificar mais uma vez os menos favorecidos, poderia o governo optar por cortar os juros da dívida, reduzir o superávit primário, controlar a especulação financeira, controlar o câmbio, combater a sonegação, tornar o sistema de imposto mais progressivo que regressivo…

Enfim, a Reforma da Previdência é ou não é um a nova “Lei da Gargalhada”?

Aproveito a oportunidade para convidar a todos, para que participem no próximo dia 31 de Março, às 9h, de uma Audiência Pública sobre o assunto. Faremos um amplo debate sobre a Reforma da Previdência, no Plenário da Assembleia Legislativa do Paraná, com a presença do Ex-Ministro da Previdência Social, Carlos Eduardo Gabas, e dos Senadores Roberto Requião, Álvaro Dias e Gleisi Hoffmann e Paulo Paim.

O Futuro do Brasil é um compromisso de todos!

*Requião Filho é deputado estadual pelo PMDB do Paraná.