Um dia normal em Curitiba

Enquanto a Capital Federal vive dias atribulados em função do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff, Curitiba segue sua vida normal no descaso e na paralisia da administração do prefeito Gustavo Fruet (PDT). Essa é a análise de Rafael Greca (PMN), em sua coluna semanal. Greca descreve um dia comum em uma Curitiba abandonada, carente de cuidados. Leia e ouça a seguir. 

Um dia em Curitiba, enquanto Brasília arde

Rafael Greca*

Pela manhã, solidário com Margarita, vou fazer as compras da casa, no Mercado Municipal. Na saída deparo com acampamento de moradores de rua, vários “iglus” automontáveis, ocupando a larga calçada diante do café da rua General Carneiro.

Passo sob o viaduto do Capanema, vejo a “solução” dada por Fruet ao antigo espaço do nosso Restaurante Refeições Curitibanas – o primeiro de R$1 do Brasil, inaugurado em 1994. Servíamos 3000 refeições no almoço. E mil pratos de sopa no jantar.

Mal cheirosa muralha de tubos de concreto que alguém, vizinho, gritando da janela do apartamento, chama de “cagômetro”.

Economia

Os horrores do dia não tinham terminado ainda. Vou ao Solar do Rosário discutir detalhes da edição do meu livro “Luz dos Pinhais – História e Estórias de Curitiba”. Na saída,ao se abrir o portão para a Duque de Caxias, deparo com cena dantesca. Vários homens, chapados de crack, jazem na calçada, nas vizinhanças da antiga Igreja dos Escravos.

Terá havido Abolição? Ou mudaram apenas os métodos de humilhar e dominar Zumbi?

Fomos depois para o extremo sul de Curitiba. Isabel Maria Getrudes, curitibana do Tatuquara, moradora da Gleba da Ordem, reuniu seus conhecidos a pedido do PMN,na semana que terminou. Apesar da doçura da recepção popular fiquei com gosto amargo na boca. Sensação de impotência e tristeza.

Ali conheci Sebastião e Diolinda, ele jardineiro, ela cozinheira. Tiveram a casa assaltada. Foram buscar auxílio no módulo policial implantado no bairro Jardim Santa Rita, o container que o governador Beto Richa chamou UPS — Unidade Paraná Seguro, coisa das vésperas da última eleição.

Ao chegarem no local, o único policial de plantão pediu desculpas mas disse que não podia ajudá-los porque não podia deixar a UPS sozinha, estava só para fazer a ocorrência, e voltou a jogar no celular. Paradoxo e impossibilidade do “poder”. O PM não cuida do bairro, porque precisa montar guarda no módulo do bairro.

Antes do chá, sou informado por moradores dos bairros Santa Cecilia, Jardim Santa Rita e da rua Pero Vaz de Caminha, que tiveram suas casas alagadas, em terras até então tidas como secas e saneadas.

Deduzo que os riachos afluentes do baixo Barigui, perto de sua foz no caudaloso Iguaçu, em onda de cheia, passaram a inundar as regiões próximas daquilo que Fruet chamou “Parque do Bugio”, porque o vale foi aterrado pela crescente ocupação irregular da Curitiba sobre palafitas, precedida de descarga de caliça, lixo e monturos, transportados por caçambas clandestinas. Isso nunca havia acontecido. É um lançamento provocado pela omissão de Fruet e seus asseclas comissionados.

Um grupo de mulheres, de feições sofridas, queixa-se: a ordem agora é acelerar as visitas dos agentes de saúde às famílias do Tatuquara.

Antes, um agente de saúde atendia em média 150 famílias; com conversas detalhadas, que incluíam análise do perfil sócio econômico da família, registro de crianças ou idosos em situação de risco, até o estado de saúde de todos os moradores da casa.

A gestão Fruet tem pressa. Em busca do tempo perdido. Agora os agentes devem atender em média 800 famílias, num encontro rápido que prevê a entrega do formulário e nada mais.

Há denúncias também de que muitos agentes de saúde eram parte de uma empresa terceirizada, com prestação de serviços há cerca de 15 anos.

A Prefeitura de Curitiba abriu concurso público para que esses agentes tivessem oportunidade de fazer parte do quadro de servidores municipais, o que acabou não acontecendo. Isso gerou um desconforto e sofrimento.

Ouço a unanimidade dos presentes dizer que todos os postos de saúde da região estão com dificuldades para atender suas demandas.

Para conseguir atendimento é necessário que o paciente chegue ao posto por volta das 4 horas da madrugada para aguardar a abertura do posto, o que acontece por volta das 7 horas, ocasião da distribuição da esperada senha.

Ao conseguir o atendimento, o paciente encontra dificuldade em receber o medicamento porque há falta, em especial dos medicamentos que compõem a chamada farmácia popular.

Falta Atenolol, Prednisona, Sinvastatina, Eritromicina e Metcloroformida, remédios para hipertensão, alergia, colesteroal e diabetes, mostram-me uma foto “roubada” do quadro de editais. Falta tudo na Saúde de Curitiba que Fruet entregou ao PT, refém de suas escolhas.

Os moradores do Tatuquara dizem ainda que a sujeira prolifera, e que baratas cascudas preenchem paredes e prateleiras vazias. E eu acredito, porque infelizmente sei o que fizeram da nossa, antes exemplar, Prefeitura.

Triste Curitiba, cidade da beleza e do caos. Amada Curitiba, que precisa recuperar humanidade e eficiência em sua Prefeitura.

*Rafael Greca, ex-prefeito de Curitiba, é engenheiro. Escreve às quartas-feiras no Blog do Esmael sobre “Inteligência Urbana”.

Comments are closed.