Coluna do Rafael Greca: Omissão, tragédia e os moradores de rua

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Em sua coluna semanal, Rafael Greca (PMN) comenta o problema dos moradores de rua de Curitiba e questiona porque a prefeitura tem tanta dificuldade em solucionar ou pelo menos diminuir esse flagelo. Greca afirma inclusive que tem lido o Diário Oficial do Município, segundo ele, o principal jornal de oposição na Capital, em busca de informações que expliquem os motivos do imobilismo da prefeitura no setor. O ex-prefeito comenta que o número de abrigos da FAS teria aumentado segundo a prefeitura, mas ao mesmo tempo, teriam fechado o principal deles, na Rua Conselheiro Laurindo. Greca conclui dizendo que essa questão não pode ser tratada com viés ideológico, é preciso agir. Leia, ouça, comente e compartilhe.

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Rafael Greca*

É fato estranho, muito estranho que a prefeitura fique contra a sociedade na questão do morador de rua. Muito estranho. Haverá algum interesse particular contra a vontade geral da sociedade?

Estará a prefeitura contra a vontade geral da sociedade curitibana para atender algum interesse particular?

O prefeito deve decidir a favor da vontade geral, da vontade social; ou deve decidir a favor vontade particular ou do interesse egoista?

Economia

Estou lendo inclusive o Diário Oficial do Município — o maior jornal de oposição a atual administração oficial — para saber mais sobre os convênios celebrados onde os moradores de rua, enquanto pessoas humanas descartadas, são objetos de contratos, de acordos, de parcerias ou outros acertos.

É fato estranho a contradição do discurso da prefeitura. Que gasta dinheiro público para anunciar o aumento de abrigos, sem explicar o fechamento da FAS SOS na rua Conselheiro Laurindo; que gasta dinheiro público para anunciar que aumentou o valor de passagens para o retorno dos moradores de rua; e que mesmo assim (com tanto dinheiro gasto) sustenta que o número de moradores de rua só cresceu, seriam 5 mil, nunca diminuiu.

Tem alguma coisa muito errada aí. E essa coisa muito errada há de aparecer.

O prefeito — récem-citado no listão da Odebrecht — recentemente disse que queria uma lava-jato na prefeitura. Pois terá.

Rua não é moradia. É inconstitucional essa visão inclusive, em nosso entendimento.

Pense comigo. Raciocine junto. As ruas foram e são construídas para garantir o direito de ir e vir. As ruas não foram ou são construídas para residir, porque tal residência, tal fixação implica no assenhoramento do espaço público, pois tal ocorrência retira das demais pessoas o direito de ir e vir no espaço público, local que deve ser — por obrigação da prefeitura — saneado, também mantido limpo e ainda seguro.

Na vida social, para a boa convivência social, o público não pode ser submetido ao privado. Sabemos disso.

Outrossim, a questão do morador de rua é de saúde pública, de respeito à vida humana, bem que não pode ser descartado, ponto já pacificado na decisão do Superior Tribunal de Justiça, STJ, já tem entendimento nesse sentido, verbis: “É obrigação do Estado assegurar às pessoas desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação ou congênere necessário à cura, controle ou abrandamento de suas enfermidades, sobretudo, as mais graves.

O STJ já proclamou o “direito de todos e dever dos entes públicos promover os atos indispensáveis à concretização do direito à saúde, tais como fornecimento de medicamentos, equipamentos médicos, realização de exames, acompanhamento médico e cirúrgico, quando não possuir o cidadão meios próprios de adquiri-los”

Nossa Constituição da República já entronizou a saúde como um direito de todos e dever do Estado (no Art. 196), advindo daí a conclusão que é obrigação do Estado assegurar às pessoas carentes de recursos financeiros o acesso à medicação e tratamentos necessários para a cura de suas enfermidades. É obrigação do Estado e do Município não se omitir lançando os desvalidos à sua própria (falta de) sorte.

Assim, também, os julgados desta Corte, no sentido da solidariedade entre Estado e Municípios em demandas de internações compulsórias e atendimentos na área de saúde mental e drogadição.

Quando se trata de pessoa que apresenta distúrbios mentais, vulnerável em situação de risco, é cabível pedir aos Entes Públicos a sua internação compulsória e o fornecimento do tratamento de que necessita, a fim de assegurar-lhe o direito à saúde e à vida.

Os entes públicos têm o dever de fornecer gratuitamente o tratamento de pessoa que não tem condições de custear.

A responsabilidade dos entes públicos é solidária e há exigência de atuação integrada do poder público como um todo, isto é, União, Estados e Municípios para garantir o direito à saúde.

Portanto, é responsabilidade dos entes públicos ser SOLIDÁRIO, e nosso entendimento de SOLIDARIEDADE é objetivo, não ideológico, realista e não idealizador dos fatores que causam a desgraça e a miséria da vida.

Cruzar os braços não é solução. É necessário agir para sanear.

A autoridade deve ser exercida. A responsabilidade deve ser assumida. E a eficiência deve ser aferida. Ninguém em Curitiba, nem mesmo os moradores de rua, concordam com os moradores de rua. Só a prefeitura por razões que a própria Razão ainda desconhece.

Até quando?

— Usei estes argumentos na conversa que tive , na noite da última segunda feira, com a diretoria da venerável Associação Comercial do Paraná, em presença de Antonio Espolador, Gláucio de Mio Geara, Camilo Turmina, Odone Fortes Martins. Com o respeito que de mim merece esta entidade que teve o Barão do Sêrro Azul (1849-1894) como seu fundador e primeiro presidente, e meu bisavô, Comendador Macedo(1840-1917), como fundador e segundo presidente, prometo dar o melhor de mim, empenhar minha equipe, com auxilio dos quadros da F.A.S. e da Saúde Pública, para eliminar o atual conflito doloroso, que infelicita as ruas de Curitiba, levando-o para o âmbito da discussão humanista, iluminada pela luz da inclusão social e do respeito humanitário que todos merecem.

*Rafael Greca, ex-prefeito de Curitiba, é engenheiro. Escreve às quartas-feiras no Blog do Esmael sobre “Inteligência Urbana”.

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