Femotiba vai à  Justiça contra superaposentadorias de ex-governadores e viúvas

O presidente da Federação das Associações de Moradores de Curitiba (Femotiba), Edson Feltrin, informou nesta segunda-feira (27) impetrará nas próximas horas um mandato de segurança contra o governo do estado questionando a manutenção de aposentadorias para alguns ex-governadores e viúvas.

Feltrin fez um pedido de informações ao Palácio das Araucárias sobre o cancelamento das aposentadorias de quatro ex-governadores oposicionistas (Mário Pereira, Jaime Lerner, Roberto Requião e Orlando Pessuti) e a continuidade do benefício para os amigos do governador Beto Richa (PSDB), incluindo a própria mãe — viúva do ex-governador José Richa.

“O governo do estado acabou bem rápido com as aposentadorias dos ex-governadores da oposição. Mas o requerimento da Femotiba que questiona as demais aposentadorias (a da mãe do Beto incluída) está parado desde o dia 11 de abril”, estranha Feltrin.

Há duas semanas, o deputado estadual Tadeu Veneri (PT) precisou recorrer à  Justiça para obter informações sobre a locação de aeronaves pelo governo, que, após liminar favorável ao parlamentar petista, suspendeu processo de contratação de aviões.

Veja o requerimento protocolado (11/04/2011) (Protocolo 1.100.307-2):

à€ SECRETARIA DE ESTADO DA ADMINISTRAà‡àƒO E PREVIDàŠNCIA

Economia

DO ESTADO DO PARANà.

c/c para o Governador do Estado, Procurador Geral do Estado e Procurador Roberto Altheim

REF. PROCESSO ADMINISTRATIVO N!º 10.925.595-5

Federação Democrática da Associação de Moradores, Clubes de Mães, Entidades Beneficientes e Sociais de Curitiba !“ FEMOTIBA (CNPJ n!º 07.331.387/0001-08, com sede na Rua Luiz Xavier, n!º 68, cj. 1815, Curitiba), vem, por seu presidente (estatuto e ata em anexo), respeitosamente perante Vossa Senhoria, apresentar manifestação e requerer o cancelamento de todas as aposentadorias e pensões de ex-governadores e viúvas, na forma que passa a expor.

1) DOS FATOS

O Governador Beto Richa anunciou o cancelamento da aposentadoria dos ex-governadores do Paraná. Abriu processo administrativo e deu direito de defesa a todos os atingidos: os ex-governadores que se aposentaram depois de 1988 (Jaime Lerner, Mário Pereira, Roberto Requião, Orlando Pessuti).

Não obstante, o Parecer da Procuradoria !“ que respaldou a decisão do Governador !“ excluiu do cancelamento, por critérios nitidamente políticos, viúvas e ex-governadores. Patrocinou-se um cancelamento seletivo, sem nenhum respaldo jurídico.

Esta manifestação é para provocar o Senhor Governador para que cancele TODAS AS APOSENTADORIAS E PENSà•ES. O Parecer da PGE diz que o Senhor Governador pode conhecer de ofício de ilegalidades, exercendo o poder de autotutela da administração (parecer da PGE, pág. 67 do processo administrativo). POIS ESTA MANIFESTAà‡àƒO à‰ QUE O SENHOR GOVERNADOR EXERà‡A ESTE PODER DE AUTOTUTELA NA àNTEGRA. Se não o fizer, dará ensejo à  propositura de ação popular e/ou provocação do Ministério Público para que entre com ação civil pública.

2) DO DIREITO

O Parecer que fundamenta a decisão do Governador simplesmente não é honesto. Não é honesto porque (para salvar a mãe do Governador) omite, manipula e distorce o precedente do Supremo Tribunal Federal sobre tema da constitucionalidade das aposentadorias! dos ex-governadores. Também não é honesto porque se vale de indefensável raciocínio jurídico para defender a legalidade das pensões concedidas à s viúvas. O parecer é desonesto.

O parecer tinha claramente um ponto de chegada encomendado: apartar hipóteses para salvar a pensão da mãe do ex-governador, D. Arlete Richa, e do ex-coordenador de campanha do ex-governador, João Elísio Ferraz de Campos. O corte jurídico artificial serviu para cancelar apenas as aposentadorias de adversários políticos. A questão é singela; singelíssima.

O parecer de cancelamento seletivo tem uma premissa: todas as aposentadorias concedidas depois da promulgação da Constituição Federal de 1988 são inválidas. Esta invalidade não atingiria as aposentadorias outorgadas à  luz da Constituição anterior. Com isso já fica ressalvado o direito do ex-coordenador de campanha (e demais em idêntica posição). A premissa do parecer é supostamente fundamentada na orientação do Supremo sobre o tema. O Parecer supôs que o STF teria adotado o princípio da simetria (art. 25 da CF) nos casos de aposentadorias de ex-governadores, reconhecendo a inconstitucionalidade de dispositivos estaduais que concedem o benefício na ausência de parâmetro federal (aposentadoria de ex-presidentes) na Constituição Federal (havia previsão do benefício na CF de 1967 para ex-presidentes, em dispositivo não repetido no texto de 1988). A suposição do parecer é falsa! Não foi isso que decidiu o Supremo.

Para salvar a pensão da mãe do Governador o malabarismo jurídico é ainda mais ousado. O Ilustre Procurador sustenta que a pensão da D. Arlete Richa, embora posterior à  Constituição Federal de 1988 (atingida pela simetria, portanto), seria ainda assim válida, pois decorreria de aposentadoria anterior. O caráter acrobático da interpretação que tenta salvar as pensões pós-88 será analisado mais adiante, mas a verdade é que esta análise sequer será necessária para revelar a conclusão errática do parecer. Isso porque o pressuposto jurídico primeiro do parecer (adoção do princípio da simetria pelo STF) é inequivocamente inventivo!

à‰ verdade que o Supremo, no julgamento contra a aposentadoria dos ex-governadores do Amapá (ADI n!º 1461, Rel. Mim. Maurício Corrêa), entendeu que a ausência de previsão de aposentadoria para ex-presidentes na CF de 88 impediria a criação de benefício, nas Constituições Estaduais, em favor de ex-governadores. Fez-se uma leitura ampliada do princípio da simetria (art. 25 da CF). De fato foi o que prevaleceu no caso Amapá (e prevaleceu como argumento único de procedência), citado no parecer. Fosse o caso do Amapá a última palavra do Supremo sobre o tema, o cancelamento seletivo promovido pelo ato anunciado pelo Governador seria juridicamente sustentável. O problema está justamente aí. O Supremo voltou ao tema e abandonou o argumento da simetria como condutor da inconstitucionalidade das aposentadorias especiais, ao contrário do que pressupõe o parecer.

Depois do Amapá (julgado em 1996), mais recentemente o Supremo julgou o caso do Mato Grosso do Sul (ADI n!º 3853, de 2007). E neste último julgamento o fundamento da simetria foi majoritariamente abandonado pelo STF. Para tal constatação, basta ler a íntegra do acórdão. Dos onze Ministros, dez declararam o dispositivo da Constituição do Mato Grosso (muito parecido com o paranaense) inconstitucional. Só o então Ministro Eros Grau julgava improcedente a ADI. Dos dez Ministros que deram pela inconstitucionalidade, apenas Ayres Brito e Cesar Pelusoaceitaram o princípio da simetria como fundamento único da inconstitucionalidade.

Neste ponto o parecer distorce o acórdão e omite pontos relevantes. Para o Ilustre Procurador os Ministros Carlos Brito, Carmen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Sepúlveda Pertence, Joaquim Barbosa, Cesar Peluso, Marco Aurélio e Ellen Gracie entenderam existir violação ao princípio da simetria! (à  fl. 61 dos autos). Esta informação do parecer é rigorosamente falsa. Definitivamente não foi esta a posição dos citados Ministros do Supremo. à€ análise do acórdão, voto por voto.

A Relatora do ADI do MS foi a Ministra Carmen Lúcia, para quem a procedência se impunha por inúmeros motivos, todos auto-suficientes entre si. O princípio da simetria era apenas um argumento a mais na plúrima fundamentação do voto da Ministra. Basta ler o voto para constar que a procedência se fundamentou: i) no princípio da moralidade; (ii) da igualdade; (iii) da impessoalidade; (iv) da moralidade pública; (v) da responsabilidade dos gastos públicos; (vi) impossibilidade de aposentadoria sem prévia contribuição; (vii) princípio da simetria (a Constituição Estadual não pode prever aposentadoria para ex-governadores em razão da ausência de norma similar para ex-presidentes na CF de 88). São fundamentos parecidos com os utilizados pela OAB na ADI em trâmite no STF (n!º 4545).

Estes fundamentos estão todos articulados no voto, mas basta !“ é óbvio !“ a adoção de um único para que a procedência se impusesse. Se a leitura do voto da Ministra Carmen Lúcia não bastasse para revelar o caráter plúrimo da fundamentação, uma passagem dos debates retira qualquer dúvida. Em determinado momento o então Ministro Sepúlveda Pertence observa à  Relatora:

No caso do Ministro Maurício Corrêa [a ADI do Amapá] a simetria era praticamente o único fundamento do seu voto além da vinculação, por isso fiquei só na vinculação. (!¦) No caso [a ADI do Mato Grosso do Sul] o que se alegou foi o princípio republicano, o princípio da impessoalidade, o princípio da moralidade, argumentos altamente respeitados!.

A partir desta observação, questiona o Ministro Sepúlveda: apenas fica aqui a minha nova declaração de antipatia pelo princípio da simetria quando vem sozinho. A Carta de 1969 concedia, a de 1988 deixou de conceder, logo está vedado aos Estados. Este argumento Vossa Excelência não usou, não é preciso dizer!. NàƒO, respondeu em seguida e de forma direta e objetiva a Ministra Relatora (textualmente, à  fl. 668 do acórdão da ADI n!º 3853).

Não, declarou enfaticamente a Ministra Relatora, o princípio da simetria não foi o fundamento condutor do voto.

Avançando na leitura do acórdão fica claro que os Ministros Ricardo Lewandowski e Joaquim Barbosa apenas acompanharam o voto da Ministra Relatora, sem agregar nenhum fundamento novo, mas também sem excluir qualquer dos fundamentos autônomos apresentados. Gilmar Mendes, depois de um pedido de vistas, abriu uma segunda divergência. Não para dar pela improcedência, mas para fundamentar a procedência apenas no argumento da reserva de iniciativa. à‰ que no caso do Mato Grosso do Sul a aposentadoria havia sido criada a partir de uma emenda do legislativo (vício inexistente no caso do Paraná). Além de apresentar argumento autônomo, Gilmar Mendes afastou expressamente o princípio da simetria, na linha do que já tinha dito o Ministro Sepúlveda Pertence. Neste raciocínio foi acompanhado por mais dois Ministros Celso de Mello e Ellen Gracie (é o que expressamente descrito à  fl. 733 da íntegra do acórdão do STF).

Não obstante, o parecer insiste em dizer que Ellen Gracie e Sepúlveda Pertence teriam aderido à  tese da simetria para dar pela procedência da ADI do MS. Também por isso o adjetivo desonesto, embora reconhecidamente pesado, parece apropriado para parecer. Não é honesto (a palavra é realmente esta) desvirtuar o sentido dos votos dos Ministros.

Sobram três Ministros. Ayres Brito e Cesar Peluso acompanharam o voto da Relatora, enfatizando o princípio da simetria. Com o objetivo de argumentar, considera-se (embora isso não esteja muito claro nos votos dos dois Ministros) que o princípio da simetria foi mesmo apresentado como fundamento autônomo por estes dois Ministros. Marco Aurélio preferiu apostar no princípio da moralidade como argumento condutor da sua posição em favor da procedência.

O princípio da simetria, portanto, foi apenas um argumento a mais para três Ministros (Carmen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Joaquim Barbosa). Para outros dois Ministros o princípio da simetria parece representar argumento autônomo (Ayres Brito e Cesar Peluso). Todos os demais, por razões diversas e de forma expressa, recusaram relevância ao princípio da simetria para o julgamento da ADI do Mato Grosso do Sul.

Tanto é assim que o princípio da simetria sequer é mencionado expressamente na ementa do acórdão. A procedência, é o que também se extrai da ementa, encontra outros fundamentos. E estes outros fundamentos não fazem a distinção entre as aposentadorias (e pensões) concedidas antes ou depois da Constituição Federal de 1988, desorientando completamente a conclusão do Parecer subscrito pelo Governador do Paraná. Todas são ilegais !“ e é isso que se requer aqui.

Para que o cancelamento seletivo do Parecer pudesse se sustentar no precedente do STF, como quis o Procurador, o princípio da simetria deveria ter sido apresentado como fundamento único e exclusivo da procedência. E definitivamente não é isso que se apanha da leitura do acórdão.

Como os Ministros majoritariamente aderiram a outros fundamentos autônomos (princípio da moralidade, sobretudo), não é possível dizer que só as aposentadorias consideradas inconstitucionais pelo princípio da simetria são inválidas. Isso é desconsiderar que a supressão do argumento da simetria manteria hígida a procedência da ADI do Mato Grosso do Sul. Depois do caso do Amapá, portanto, o STF abandonou o princípio da simetria como fundamento autônomo da inconstitucionalidade das leis e dispositivos das Constituições Estaduais que prevêem estes benefícios.

O princípio da moralidade (entre outros) é o principal argumento condutor, é necessário enfatizar. E é elementar reconhecer que o princípio da moralidade não foi introduzido no Brasil apenas pela Constituição Federal de 1988 (para um apanhado histórico, conferir, entre outros, GIACOMUZZI, José Guilherme. A moralidade administrativa e a boa fé da Administração Pública. São Paulo, Malheiros, 2002). O mesmo pode ser dito em relação à  maioria dos demais argumentos autônomos que conduzem à  procedência da ADI. E estes argumentos autônomos !“ que não nasceram com a Constituição de 1988 !“ gravam de invalidade todas as pensões e aposentadorias concedidas aos ex-governadores e suas viúvas. Todas indistintamente. Foi o que apontou o Mestre e Professor André Folloni, em artigo publicado na Gazeta do Povo, edição de 06 de abril, que pede para transcrever:

Não vale para um, não vale para todos

Publicado em 06/04/2011 | ANDRà‰ FOLLONI

Nenhum progresso para o Estado brasileiro resulta da manutenção de privilégios remanescentes do regime ditatorial, de triste memória

Foi bastante divulgada a decisão do governador Beto Richa, que acatou parecer normativo do procurador do estado Roberto Altheim, cancelando as aposentadorias que recebiam os ex-governadores do estado, eleitos já na vigência da Constituição de 1988.

A aposentadoria especial de governadores, realmente, não se justifica. Há um movimento, aparentemente geral, contra o benefício. O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil ajuizou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), no Supremo Tribunal Federal, contra o artigo 85, !§ 5.!º, da Constituição do estado do Paraná, seguindo movimento já feito em relação ao Mato Grosso do Sul, Sergipe e Rondônia. Assim, a OAB cumpre sua importante função pública de defesa da Constituição Federal, custeada, para tanto, por todos os advogados do Brasil.

O preceito atacado concede um subsídio! !“ como um salário de aposentadoria !“ a ex-governadores de estado. A ADI da OAB está fundamentada em parecer de José Afonso da Silva, um dois mais importantes estudiosos de direito constitucional da história do Brasil. Entre outros argumentos de caráter técnico-jurídico, a petição aponta que subsídios só podem ser pagos a quem está no exercício de determinadas funções públicas, não sendo, portanto, cabíveis a quem já não mais exerce aquelas funções.

Outro argumento, esse mais importante, diz respeito a uma questão de isonomia: não se pode conceder uma condição diferenciada a alguém, senão com fundamento em algum motivo juridicamente razoável. Se todos podem conseguir aposentadoria, em função pública, apenas após 35 anos de contribuição para os homens, e 30, para as mulheres; e apenas após atingir 65 anos de idade para os homens, e 60, para as mulheres; o que justificaria que o governador do estado, após trabalhar apenas quatro anos, ou menos, tivesse aposentadoria integral? Não há razão suficiente que justifique a diferença. Se todos, para obter aposentadoria, precisam contribuir com a previdência pública durante muitos e muitos anos, por que os governadores e seus dependentes teriam condição privilegiada? Não há razão suficiente que justifique o privilégio. Até aí, a decisão é acertada, e merece todos os aplausos.

O problema está em relação aos governadores empossados antes de 1988. Como a Constituição de 1967, feita durante o regime militar autoritário, tinha norma que aceitava essa regalia, sustenta-se que apenas se podem cancelar as aposentadorias dos governadores eleitos após a Constituição de 1988. Isso é um erro. Se a Constituição atual não aceita um privilégio dessa espécie, ela também não recepciona benefício semelhante concedido pela Carta anterior. Com a vigência da Constituição nova, perdem aplicabilidade todas as normas anteriores com ela incompatíveis. Essa é, claramente, uma delas, como tantas outras normas do regime ditatorial que ainda infestam nosso ordenamento jurídico supostamente democrático.

Por isso, cumpre ir mais adiante na extirpação das regalias dos ex-governadores e de seus dependentes: se é verdade que a aposentadoria não vale para os governadores eleitos após 1988, como efetivamente é, também é verdade que ela não vale para os anteriores. Nesse caso, se não vale para um, não vale para todos. Nenhum progresso para o Estado brasileiro resulta da manutenção de privilégios remanescentes do regime ditatorial, de triste memória. à‰ preciso, rapidamente, acabar com todos eles, instaurando, de vez, um Estado Democrático de Direito no Brasil.

O argumento do professor corrobora tudo que está dito aqui.

à‰ desnecessário atacar, portanto, os fragilíssimos fundamentos do Parecer que tentam salvar a pensão da mãe do Governador, concedida depois da Constituição de 1988. Isso porque os argumentos que respaldam a validade desta pensão subordinam-se à  validade do primeiro argumento (cancelamento seletivo a partir do princípio da simetria). Como o argumento primeiro em que se sustenta a validade da pensão é falso, nem seria necessário avançar. Não obstante, refutar-se-á a tese! que tenta amparar as pensões da viúvas concedidas no pós-88 (mãe do Governador incluída) apenas para reafirmar a fragilidade do raciocínio jurídico do malfadado Parecer da PGE.

Em um primeiro momento o Procurador reconhece que pelo pelo princípio da simetria, já referido no tópico anterior, não pode o Estado do Paraná conceder pensões a viúvas de ex-governadores a partir de 1988!. E segue o Procurador: Isto porque tal benefício, por tratar-se de “pensão por morte”, é decorrente e dependente do direito do de cujus! (à  fl. 65 dos autos). O problema é que esta argumentação obrigaria o Governador a cancelar a pensão da própria mãe, Dona Arlete Richa (beneficiada a partir de janeiro de 2004). Foi aí que o Procurador criou uma tese que constrange pela ousadia da hermenêutica acrobática que revela:

Sendo assim, da mesma maneira que é constitucional o pagamento de “representação” para ex-governadores que exerceram em caráter permanente o cargo antes de 08 de outubro de 1988, é também constitucional o pagamento de “pensão” a viúvas de ex-governadores daquele período, conforme o estabelecido pela Lei Estadual 7.568/82 (com as alterações das Leis Estaduais 9182/90 e 10.369/93)! (pág. 65).

A curiosa conclusão é apresentada apenas neste parágrafo, sem qualquer fundamentação posterior. à‰ exatamente o último parágrafo do parecer (depois são apresentadas apenas considerações sobre o necessário encaminhamento da questão).

Ao contrário do que registra o Parecer, as viúvas têm direito a pensão a partir de um título próprio. Tanto é assim que passaram a ter direito apenas em 1982 (os ex-governadores recebem desde 1967, como reconheceu o parecer). Alguns Estados prevêem aposentadorias aos ex-governadores, mas não à s viúvas. Pelo raciocínio do próprio Ilustre Procurador, as Lei Estaduais que disciplinam as pensões de viúvas não foram recepcionadas pela Constituição Federal de 1988, como decorrência (também aqui) do princípio da simetria. Aliás, a ADI do Mato Grosso Sul também declarou inconstitucional as pensões de viúvas, previstas, naquele caso, no mesmo dispositivo da Constituição Estadual.

Como está no voto da Ministra Relatora: a benesse instituída pela Assembléia sul-matogrossense em favor de ex-governador daquele Estado e como pensão devida ao cônjuge supérstite desiguala não apenas os cidadãos, que se submetem ao regime geral da presidência, mas também (!¦)!. Mas aqui no Parecer da PGE a aposentadoria dos ex-governadores fere o princípio da simetria; as pensões não! Fez-se uma distinção que o Supremo rejeitou.

Tanto isso é verdade que a OAB, autora da ADI no caso do Paraná (inicialmente proposta apenas em face do art. 85, !§ 5!º da CE !“ que trata das aposentadorias dos ex-governadores), emendou a inicial para incluir no pedido a declaração de inconstitucionalidade das Leis Estaduais que disciplinam as pensões concedidas à s viúvas. A emenda da OAB na ADI n!º 4545, de 04 de fevereiro, foi assim fundamentada:

De fato, mencionadas leis estaduais instituem em favor das viúvas dos ex-Governadores do Estado que tenham exercido mandato em caráter permanente, desde que não tenha sofrido suspensão dos direitos políticos, uma pensão vitalícia mensal correspondente à quela definida no art. 85, !§ 5!º, da Constituição Estadual.

Evidente, assim, que as Leis Estaduais ora questionadas incorrem nos mesmos vícios de inconstitucionalidade, eis que, na prática, tais atos normativos concederam à s viúvas dos ex-Governadores o direito a pensão mensal e vitalícia, ou seja, instituíram benefício de caráter assistencial que não tem por fundamento estado de necessidade dos beneficiários!.

A emenda à  inicial da OAB demonstra claramente o desacerto do Parecer. Não só a emenda, mas o próprio despacho que a admitiu, da Relatora da ADI n!º 4545, Ministra Ellen Gracie: De fato, percebe-se uma estreita correlação entre o art. 85, !§ 5!º, da Constituição do Estado do Paraná, o art. 1!º da Lei Estadual 16.656/2010 e o art. 1!º da Lei Estadual 13.426/2002, revelando-se o primeiro preceito, à  primeira vista, suporte para a existência dos dois últimos! (despacho de 11 de fevereiro na ADI n!º 4545).

Nem é necessário avançar. O fato de o Ilustre Procurador não ter apresentado qualquer fundamentação para o resguardo! das pensões concedidas no pós-88 (mãe do Governador incluída, é necessário sempre lembrar) prova demais.

Para resumir tudo em uma única expressão: todas as aposentadorias e pensões são inválidas. A lógica do cancelamento seletivo existe apenas no parecer da PGE. E pelas razões já anunciadas, embora compreensivelmente não confessadas. Juridicamente a construção do parecer não resiste a qualquer olhar mais atento. Mas não se deve culpar o Ilustre Procurador; a encomenda que lhe deram era excessivamente árdua.

E qual a consequência direta desta indistinção jurídica? Tudo deve ser cancelado; é o que se espera do Governador.

à‰ preciso advertir que o cancelamento de ofício (que se requer aqui, tal qual patrocinada no cancelamento seletivo) não é a única maneira de se cancelar as aposentadorias e pensões que restam. Há também os instrumentos da ação popular e da ação civil pública. Foi o que aconteceu em Santa Catarina e no Mato Grosso. à‰ o que pretende provocar este signatário se houver o indeferimento administrativo.

Se a opção do STF for pela procedência (no caso do Paraná ou qualquer outro), com os argumentos jurídicos que (como no caso do MS) transcendem a mera aplicação do princípio da simetria, todas as leis serão declaradas inconstitucionais (instituidoras de pensões e aposentadorias; antes e depois da CF de 1988, indistintamente). Como disse o Professor do Paraná no transcrito artigo da Gazeta do Povo, pela lógica predominante do Supremo, as Lei e dispositivos constitucionais que instituíram as pensões e aposentadorias não foram recepcionados pela CF de 88 (por ofensa a vários dispositivos; moralidade, sobretudo). Com ou sem a declaração formal, a mera decisão do STF noutro caso reconhecerá a invalidade de todas as pensões e aposentadorias. à€ administração Pública caberá reconhecer de ofício esta invalidade, instaurando processo administrativo (nos termos das súmulas 473 e 346 do STF). Foi o que reconheceu o próprio Ilustre Procurador (neste ponto com razão): o poder de autotutela é, na verdade, um dever! (à  fl. 67 dos autos). à‰ o que se requer aqui.

Mas se o Governador não tiver a mesma disposição em relação à  mãe que demonstrou ter no cancelamento seletivo que patrocinou contra Requião, Pessuti e Mário Pereira, bastará, como foi mencionado, que qualquer cidadão proponha uma ação popular (como em Santa Catarina, por exemplo) ou provoque o MP para que promova uma ação civil pública (como no Mato Grosso, noutro exemplo). Nestes dois casos não se fez qualquer diferença entre aposentadorias e pensões concedidas antes ou depois de 1988; todas foram reputadas inválidas por ofensa ao princípio da moralidade, entre outros. à‰ necessário reconhecer a originalidade da tese: a distinção que sustenta o cancelamento seletivo é de autoria exclusiva do Ilustre Procurador, cabe reconhecer.

Por tudo isso, se requer que a Administração, também de ofício e em face dos fundamentos apresentados nesta manifestação, promova a análise de validades de todas as pensões e aposentadorias, sem a seleção adredemente preparada pelo Ilustre Procurador.

5) DA CONCLUSàƒO

Diante do exposto, conclui-se que o subsídio mensal e vitalício é inconstitucional e que não existe nenhum tipo de legalidade em sua percepção. Como já reconheceu o STF no caso do MS, os benefícios ofendem os princípios da impessoalidade, igualdade e moralidade.

Caso não seja este o posicionamento, serão tomadas as medidas judiciais cabíveis.

Curitiba, 07 de abril de 2011.

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EDSON FELTRIN/ OAB-PR 8512
Presidente